Parte 1 - Dança do Ventre X Estilo Pré Tribal e as influências “folclóricas”

por Nadja El Balady

A Influência do Folclore Árabe na Formação do Estilo Tribal

Parte 1 - Dança do Ventre X Estilo Pré-Tribal e as influências “folclóricas”

Ao abordar este tema precisamos mergulhar na história da Dança do Ventre e sua evolução tanto no Egito quanto nos Estados Unidos. É preciso viajar no tempo. É preciso retornar à década de 70 e tentar, através dos escritos e de imagens, compreender o processo criativo de Jamila Salimpour e Macha Archer, duas grandes referências do período que vamos considerar “Pré-Tribal”. É preciso considerar a mentalidade das dançarinas da época e a cultura vigente na Califórnia da década de 70.

Samia Gamal - Golden Age Era
Perceber a diferença entre a Dança do Ventre popular/folclórica, advinda do deserto e a Dança do Ventre que evoluiu para o glamour urbano da tela do cinema e do show business é fundamental para entender a diferença entre os estilos da Dança do Ventre do século XXI.

A evolução da dança do ventre no Egito, desde o final do século XIX até hoje em dia, traz a transição da dança popular egípcia (tipicamente ghawazee e beduína) em uma dança cênica, fusionada e glamorosa. Uma dança totalmente voltada para entreter a sociedade urbana, consumidora de cinema, frequentadora da vida noturna, com gostos cada vez mais refinados e europeizados. Encontramos nos filmes antigos algumas referências à cultura rural no Egito, incluindo suas danças e músicas, mas geralmente estas já eram apresentadas de forma estilizada tanto em concepção musical, como em coreografia. Esta dança, que evoluiu para o estilo egípcio moderno, que possui grande mercado de show business e se espalhou mundo a fora no final do século XX, é a inspiradora do estilo cabaré americano, estre outros.

Ouled Nail
A Dança do Ventre base, de raiz é aquela ligada às danças populares e folclóricas de países do Norte da África e oriente Médio e são conectadas aos hábitos dos povos do deserto e têm origem milenar. Falamos dos povos nômades, de beduínos, berberes e ciganos. As ciganas ghawazee egípcias, mesmo tendo já há muitos séculos se estabelecido em cidades, têm no DNA da sua arte a estética desenvolvida ao longo das migrações pelo deserto e intercâmbio com estes outros povos. As movimentações femininas de povos da região do Magreb, como a dança das Ouled Nail[1], danças populares tunisianas e apresentações nos mercados populares são inspirações estéticas para o que vamos chamar de “dança do deserto”. Uma dança não “refinada” no sentido urbano da palavra, que usa elementos de seus povos, de suas vilas, de suas tradições mais antigas.


Jamila Salimpour era dançarina de dança do ventre do estilo chamado “Cabaré americano”. Vamos tentar entender o que é isso em poucas palavras.... As primeiras apresentações de dança do ventre, nos Estados Unidos, aconteceram no início do século XX. Em um ambiente estrangeiro, dificilmente a arte se mantém pura, especialmente se a ela for agregada o talento natural que os americanos têm para show business e comércio. A dança do ventre coube naturalmente nos espetáculos de cabaré e não demorou para que as americanas aprendessem a dançar e o show encontrasse um formato adequado para o gosto público local. Temos que o estilo “Cabaré Americano” evoluiu ao longo do século XX em um ambiente multiétnico (devido a inúmeras imigrações de povos do oriente), com mentalidade artística inovadora e voltada para o comércio com o público americano.

Nas décadas de 60 e 70, somamos a este cenário o ideal hippie, a mentalidade da era de aquário, através da qual uma parcela da população americana busca uma espiritualidade conectada à liberdade do corpo e de movimento. A transcendência através da meditação, da música e das artes. A revolução sexual feminina. Isto tudo se encaixa perfeitamente ao que a dança do ventre pode oferecer à mulher californiana.

Mediante a este contexto, retornamos à Jamila. Entre as décadas de 50 e 60 manteve contato com diversas dançarinas egípcias, turcas e armênias. Com elas aprendeu muito de seu vocabulário de movimentos. Ao se casar com Ardeshir Salimpour, pai de Suhaila, foi proibida por ele de se apresentar publicamente e foi quando começou a dar aulas. Sendo uma das primeiras professoras de dança do ventre nos Estados Unidos, Jamila compilou todo o seu conhecimento dos movimentos de diversas culturas e criou um mecanismo onde as americanas pudessem acessar a técnica da dança de forma racional, para que pudessem compreender e transformar em movimentos. Adaptou movimentos, estabeleceu padrões para os toques de snujs e criou terminologias, deu nome para os passos, muitos deles conhecidos por nós ainda hoje em dia como “oito maia” ou “hip drop”. Ela organizou os movimentos de acordo com as etnias de origem e é neste ponto em que finalmente chegamos ao objeto de observação deste artigo.



Segundo Shareen El Safy, no artigo “Shaping a Legacy: A New Generation in the Old Tradition”, as famílias de classificação de movimentos cridas por Jamila os dividia em “Tunisian,” “Algerian,” Moroccan” “Egyptian,” e “Arabic.”  Significa que a movimentação de quadril ensinada por Jamila possuía características étnicas baseadas em danças populares regionais, não só nas apresentações de espetáculo ou nas dançarinas do cinema da chamada “Golden Age of Egyptian BellyDance.”


Bal Anat
Esta influência se torna cada vez mais evidente à medida em que ela estrutura as apresentações do grupo “Bal Anat” na “The Renaissance Pleasure Faire”. Criado em 1968, o grupo Bal Anat combinava apresentações inspiradas no folclore tunisiano e magrebino com performances típicas de cabaré americano, com uso de acessórios como véu e espadas. A própria Jamila se encaixava nos shows sempre com lindos trajes folclóricos e maquiagens típicas das Ghawazee ou Ouled Nail. As bijuterias, os turbantes, os vestidos, toda uma estética de figurino e movimentação baseadas em etnias do norte da África, na região do Saara. A própria concepção cênica lembra as apresentações nos mercados populares de Marrakesh: Músicos em trajes folclóricos tocando ao vivo, dançarinas no palco formando um cenário vivo, o uso de acessórios folclóricos como cestas, jarros e mesmo serpentes. Estes elementos traziam às apresentações do grupo um aspecto exótico, muito valorizado na época. Com certeza, um grande diferencial no mercado de dança do ventre da época.


Bal Anat – Influências Tribais X Cabaré Americano



No grupo Bal Anat, analisando com cuidado, é possível perceber as duas influências, sendo, porém, tudo considerado “Belly dance”. Para nós é importante compreender que nenhuma delas, Jamila Salimpour, Macha Archer ou Carolena Nericcio, precursoras, ou mesmo criadoras, do que veio a se chamar Estilo Tribal, nenhuma delas deixou de considerar o próprio trabalho como Dança do Ventre. Dança do Ventre, para todos os efeitos, é de onde veio, e o que define a linha estética da formação do Estilo Tribal, mas esta dança do ventre tribal, a mãe de todas as outras “danças do ventre” as danças populares dos povos do deserto.



Danseuse des Ouled Nail (Algérie 1901)



Ainda sobre o Bal Anat e o trabalho de Jamila, vamos encontrar ali diversos elementos como vocabulário de movimentos, toques de snujs e padrões ainda utilizados como a base do Tribal. A maioria baseados em danças Ghawazee e Ouled Nail. Vale considerar que Ciganos, Beduínos e Berberes são povos divididos em diversas etnias, tribos e clãs, e que têm costumes e idiomas próprios. Embora, hoje em dia, sejam de maioria muçulmana, as tribos mantêm suas tradições da melhor maneira possível, apesar das inúmeras dificuldades de sobrevivência apresentadas nos dias de hoje. São considerados verdadeiramente tribais assim como seus costumes, suas músicas e danças.


Banat Mazin - Ghawazee



Segundo consta em diversos textos sobre a história do Tribal, Masha Archer foi aluna de Jamila Salimpour e criou o seu próprio grupo, que dirigiu por 15 anos: A San Francisco Classic Dance Troupe. Em sua trupe, Masha pôs em prática muito da estética Bal Anat para figurino e dança, trazendo, porém, alguns diferenciais. A percepção é a de que Masha derruba de vez algumas fronteiras culturais dentro da dança oriental e busca novos elementos em que se inspirar, como o Flamenco, agregando flores e xales, bem como uma postura bastante altiva para a dança. É dito pela própria Carolena que no trabalho da San Francisco Classic Dance Troupe já existiam conceitos como o de formação, de coro e feature” e que esta linha de trabalho foi levada por ela como base para as criações do grupo Fat Chance BellyDance® e que foi largamente ampliada e aprimorada ao longo do tempo de experimentações e que resultou na linguagem estética que hoje chamamos de American Tribal Style®.


Macha Archer e San Francisco Classic Dance Troupe



O Estilo Tribal de Dança do Ventre, por tanto, captura a estética de vestimenta e movimentação das danças do deserto e produz um estilo novo e adaptado ao gosto ocidental com referências étnicas diversas que se combinam de maneira inusitada com apelo exótico e artístico. Com raízes tanto em danças tribais ancestrais como no pensamento libertário da das décadas de 60 e 70, o Tribal traduz um desejo de retorno à uma comunidade imaginária, feminina, livre, feliz e que encontra na dança sua maior celebração e união. Isto tudo muito bem elaborado, estruturado, organizado e divulgado por Carolena Nericcio e suas seguidoras que souberam bem comercializar e difundir pelo mundo este trabalho que se desdobrou no Tribal Fusion e o mar de possibilidades estéticas contemporâneas que surgiram a partir de então.

 Fat Chance BellyDance®



[1] Ouled Nail é uma tribo Berbere da região do Magreb, nas montanhas do Atlas na Argélia. Sua tradição ainda é matriarcal e têm na dança sua maior fonte de renda.



[Retalhos de uma História] Souheir Zaki

por Ju Najlah



"Ouça a música com o coração e traduza seus sentimentos com o corpo.”


Souheir Zaki nasceu em Mansoura, onde viveu com sua família até os nove anos de idade, depois mudaram-se para a cidade mediterrânea de Alexandria. Souheir apaixonou-se pela música e pela dança desde bem cedo. Com 11 anos já chamava a atenção dançando nas festas de aniversário e casamentos de amigos e familiares.

Uma das mais famosas dançarinas dos anos 60 e 70, Souheir Zaki começou a aparecer em gravações dançando algumas músicas de baixa qualidade. Contrária a qualidade das músicas gravadas, sua meticulosa forma de ouvi-las e expressa-las tornou-se famosa e ela ganhou o respeito de todos os membros da orquestra que a acompanhava.

Em determinada ocasião Anwar Sadat, presidente do Egito, a nomeou “a Om Kolthoum da dança”, e disse a ela “assim como ela canta com a própria voz, você canta com seu corpo.” Nos anos 60 Souheir recebeu o reconhecimento com honrarias e medalhas do xá do Irã, do presidente da Tunísia e de Gamal Abdel Nasser. Assim como Tahia Carioca e Samia Gamal – suas maiores fontes de inspiração – ela se tornou uma bailarina legendária em seu próprio meio. Quando criança, diz Souheir, “eu costumava ir direto da escola para o cinema, para assistir Tahia Carioca e Sâmia Gamal na grande tela. Eu até mesmo cortei meu cabelo e arrumei para ficar parecida com Fairuz", ela diz, referindo-se a uma estrela mirim do cinema egípcio. 



O desejo de Souheir Zaki para dançar em público superou a desaprovação do seu pai. No entanto parece que era parte do seu destino; seu pai morreu quando ela ainda era muito jovem e sua mãe se casou novamente. Foi seu padrasto quem realmente lançou e gerenciou sua carreira, arranjando sua orquestra e tornando-se, mais tarde, seu empresário.

Souheir começou dançando nos nightclubs gregos de Alexandria. Depois mudou-se para o Cairo, onde se manteve, circulando entre casamentos e apresentações em nightclubs, que começavam a noite e se estendiam pela madrugada.

"Minha maior rival era a Nagwa Fouad. Nós tivemos uma competição feroz. Se as duas estivessem contratadas para uma mesma festa numa noite, nós corríamos para mandar nossas orquestras e roupas na frente, vendo quem chegava antes ao local". Enquanto Nagwa Fouad, adorava flashes e grandes montagens para sua performance, num estilo bem ocidental, Souheir era exatamente o oposto. Raqia Hassan, reconhecida mundialmente como uma grande coreógrafa e mestra da dança, se manifesta a respeito de Souheir: "Souheir Zaki resume a dança natural. Seu apelo está em sua simplicidade: ela traduziu a música de forma precisa e natural, sem excessos ou exibicionismo. Seus passos têm resistido aos anos, e são ensinados até hoje. Ela sempre foi autêntica apresentando-se e fingir nunca fez parte do seu estilo. Do mesmo jeito que a vê hoje, ao vivo, calma, tranquila para conversar e educada, ela sempre foi assim em cena".

A imagem clichê da dançarina oriental, quente e sedutora, muda um pouco de figura com ela. Isso talvez porque ela emergiu deste mundo controverso da dança com sua reputação mais ou menos intacta. Ela se orgulha em dizer que dançou nos casamentos de cada uma das filhas de ambos Anwar el Sadat e Gamal Abdel Nasser: que ela era constantemente escolhida para entreter as autoridades em visita ao país, desde o ministro de defesa da Rússia até o presidente Nixon e Henry Kissinger, e que, quando ela se tornou a primeira bailarina que ousou interpretar as reverenciadas canções de Oum Khalthoum num placo de nightclub, ela teve uma benção para o fato.



No final dos anos 80 o cenário da dança começou a mudar, e Zaki, vendo as coisas como iam se desenrolando, começou a pensar em se retirar elegantemente. Naquele tempo profundas mudanças tomavam forma dentro da visão que a sociedade tinha sobre a dança.

Em 2001, Raqia Hassan, quando a convidou para dançar e dar aulas depois de anos no Festival de Dança Oriental no Cairo, pessoalmente ficou impressionada pelo impacto que a presença de Souheir Zaki causou nas reservas das aulas. "Até que os formulários chegassem em grande número, eu não tinha idéia do quanto Souhair Zaki era amada por pessoas de diversos lugares do mundo. Quase todas as alunas inscritas para o festival se inscreveram para a aula a ser dada por ela".

Nada retira sua aura de glamour. Souheir Zaki traduz o verdadeiro espírito da dança oriental egípcia, sintetiza a natural dança baladi. É uma bailarina doce e elegante. Apresenta perfeito equilíbrio entre técnica e expressão. Sua musicalidade e precisão impressionam, traduzindo a música com perfeição.

"Aqueles dias nunca mais voltarão atrás. A atmosfera, os clientes, os convidados. Onde estão eles agora? A dança Oriental foi minha vida. Eu tenho meu filho e meu marido. Mas as melhores memórias de minha vida são todas da dança". Souheir Zaki.


Fontes:

Soheir Zaki, disponível em http://www.belly-dance.org/sohair-zaki.html


Soheir Zaki, one of the egypts' dance icons of the 1980's, disponível em http://www.belly-dance.org/soheir-zaki.html

MAHAILA, Brysa. Souhar Zaki. Revista Shimmie, ano 2, nº 10, página 18.


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Folclore em Foco por Nadja El Balady


 Folclore em Foco

Nadja El Balady, Rio de Janeiro - RJ Brasil

Sobre a Coluna:

Nesta coluna abordaremos a respeito do folclore raíz e povos locais.


Sobre a Autora:


Nadja é professora licenciada em Dança e se dedica desde 1998 a estudar danças orientais. Professora de Dança do Ventre tradicional e estilo tribal (American Tribal Style® e Tribal Fusion), ministrou workshops e participou de shows na Europa e em todo o Brasil. Estuda o Estilo Tribal desde 2005 e é uma das pioneiras da Fusão Tribal Brasileira.

Nadja é credenciada pelo grupo FatChance BellyDance® como Sister Studio, tendo feito a formação de ATS® em São Francisco, Califórnia em 2012.

Organizou por 4 anos, no Rio de Janeiro, o primeiro festival exclusivo de Dança Tribal do Brasil: “Tribes Brasil”.

Professora do Congresso Sul Americano de Tribal, Convenção Carioca de Dança Tribal e Fusões e é diretora do grupo Loko Kamel Tribal Dance e do Oriental Studio de Dança no Rio de Janeiro.

Em sua formação, vale destacar a experiência de 20 anos em danças populares brasileiras, dança contemporânea, e especializações no estilo tribal como a imersão completa com Rachel Brice no Shaman’s Fest em 2014, bem como outros grandes nomes do Tribal Fusion como Ariellah, Lady Fred, Zoe Jakes e Sharon Kihara.








Entrevista

Clique na imagem acima para acessar a entrevista.


Artigos
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[Estilo Tribal de Ser] Estilo Boho

por Annamaria Marques



Saudações pessoal!

Hoje trago um pouco sobre o estilo Bohemian, também conhecido como Boho, Boho Chique, Hippie chique.

Conforto e atitude é o que define esse estilo. 

Segundo a blogueira Isabella Marimon, o estilo surgiu lá em 2003 na Inglaterra, principalmente por causa de festivais como o Glastonbury. No seu auge em 2004-5, foi associado particularmente com a atriz Sienna Miller e a top Kate Moss, no Reino Unido, e as atrizes Mary-Kate e Ashley Olsen, nos Estados Unidos. Esta foi uma tendência que parecia estar em declínio no início de 2009, mas ressurge constantemente em festivais de música, como o Coachella e Lollapalooza, nos Estados Unidos.


Ele consiste na mistura eclética, livre, com ar de hippie, étnico, boêmio, folk, punk, vintage. O look é sempre único e personalizado, sua característica essencial é ser despojado propositalmente.

O estilo boêmio surgiu nos anos de 1920, mas só na década de 1970 que teve seu auge e tomou o formato que conhecemos hoje. Inicialmente era inspirado em peças de vestuário orientais, ciganas e indianas.

Escolhi trazer um pouco sobre o estilo para vocês por ter visto nele uma forma bonita de aproveitarmos nossos acessórios tribais no dia-a-dia!

Seguem algumas imagens de looks com destaque para joalheria sendo usada para compor acessórios e detalhes dos visuais!

Quem gostar e quiser ver mais, entra para o grupo Daily Tribal no facebook. Venho montando um acervo de tudo o que vejo que poderia ser usado no quotidiano, na dança e várias inspirações!




Fontes:


[Ritmos do Coração] Ritmos Árabes - Repertório Lento do ATS®

por Fairuza


Olá, tribo. 

Na minha última postagem, falei sobre alguns dos principais ritmos árabes utilizados no repertório rápido do ATS® ou tribal fusion. Nesta, falarei sobre os lentos.


 Ritmos Árabes - Repertório Lento do ATS®:
. Hatcha | .Samai | .Shaftatele | .Whada Wo Noz | .Entre outros


Em uma interpretação "dança do ventre" cada um tem sua aplicação específica. Por exemplo, samai é um ritmo utilizado para dançar "Mowashahat", uma dança idealizada   por Mahmoud Reda, na década de 70, que faz uma mescla de dança oriental com balet.


Samai




Shaftatele



Hatcha


Whada Wo Noz




Aliás, ele é uma das principais fontes de estudo, ainda vivo, e responsável por levar o folclore e  rotina árabe para os palcos.

Já no ATS® , estes são ritmos perfeitos para dançar o repertório lento / lento dramático. São ritmos chamados de "hipnóticos", que permitem uma fluidez do lento.

No Tribal Fusion, estes mesmos ritmos ficam perfeitos para uma dança mais "serpenteada"  e com uma possibilidade de isolamentos e breaks.

Vale acrescentar que também são utilizados para o trabalho de Floor Work e Sword (Espada).


É isso aí tribo. Beijos e até a próxima.


[Venenum Saltationes] Mater Tenebrarum – In Pueritia Vertigo

por Hölle Carogne



“Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança, pensava como criança; quando cheguei a ser adulta, desisti das coisas próprias de criança. (?) Porque, agora, vemos como em espelho, obscuramente; então, veremos face a face. Agora, conheço em parte; então, conhecerei como também sou conhecida...” 
Adaptação de Coríntios 13


Símbolo: A boneca; o chocalho da criança.
Significado do título: Mater Tenebrarum – In Puritia Vertigo (Nossa Senhora das Trevas – Em Vertigens da Infância).
Abordagem da coreografia: Síndrome de Peter Pan.


Pintura de Yuri Seima

Mater Tenebrarum  é uma representação arquetípica. A vi uma vez, presa no espelho. Era uma mulher muito velha e albina. Cabelos brancos, pele branca, olhos brancos, cílios brancos, sobrancelhas e vestes brancas. Ela tinha feridas de osso nos braços e cutículas podres. As feridas não sangravam mais, como se ela não tivesse sangue... Através dos buracos existentes na carne, estavam os ossos, como se a emergir do próprio corpo...

Alguém com muito conhecimento, mas ao mesmo tempo, muita confusão e falta de controle emocional. Ela representa em mim a insânia, a loucura, o vazio do inconsciente.

Alguém que não soube usar todo o seu conhecimento e enlouqueceu. Ela trabalha em mim todas essas questões mais psicológicas ligadas à transtornos e distúrbios.

Mater Tenebrarum foi como a chamei, pois uma vez estava lendo o livro “Paraísos Artificiais” do Charles Baudelaire e tinha uma parte onde ele falava de 3 musas, sendo uma delas a Mater Tenebrarum... A descrição dele sobre a Mater Tenebrarum lembrou muito as características do meu arquétipo... Então decidi que este seria o seu nome.


Aqui o trecho do livro: "Mas a terceira irmã, que é também a mais jovem!... Psiu! Falemos dela bem baixinho. Seu domínio não é grande: se o fosse, nenhum ser sobreviveria; mas sobre seu reino o poder que exerce é absoluto... Apesar do triplo véu de crepe que envolve sua cabeça, por mais erguida que a traga, pode-se ver debaixo a luz selvagem que escapa de seus olhos, luz de desespero sempre flamejante. Nas manhãs e nas noites, ao meio-dia como à meia-noite, à hora do fluxo como à hora do refluxo. Ela desafia Deus. É também a mãe das demências e a conselheira dos suicídios... A Madona caminha com um passo irregular, rápido ou lento, mas sempre com uma graça trágica. Nossa Senhora dos Suspiros desliza timidamente e com precaução. Mas a mais jovem das irmãs move-se com movimentos imprevistos: salta; tem os pulos do tigre. Não carrega consigo uma chave, pois, embora visite raramente os homens, quando lhe é permitido aproximar-se de uma porta, toma-a de assalto e a arromba. E o seu nome é Mater Tenebrarum. Nossa Senhora das Trevas."

Anos depois, certamente influenciada pelas palavras cortantes do Baudelaire, eu escrevi “Das Três Madonas”, onde falo um pouco sobre 3 das minhas principais sombras (Hölle Carogne, a bruxa tecelã; Babalon, a prostituta sagrada e Mater Tenebrarum, a louca).

 Sobre a Mater, escrevi:

“A terceira irmã, com cabelos negros e vestes em frangalhos, é a mais misteriosa. Traz a cabeça sempre baixa, em direção ao chão. A estatura e a aparência do corpo denunciam a fragilidade e a pouca idade da menina. – Vejam só: É apenas uma criança! No lugar dos olhos, uma luz flamejante e desesperadora revela ares de solidão, de esquecimento, de demência encarnada. Você não ousaria fitá-la nos olhos. Ela jamais permitiria. Se ela resolvesse erguer um pouco a cabeça em sua direção, você não suportaria tamanha tortura. Suas feições são inconstantes e intensas, como a própria loucura personificada. Por vezes, chora ou pronuncia palavras incompreensíveis; por outras, grita e geme. Murmura, cheia de agonia. Seus passos são irregulares: às vezes anda rápido, às vezes engatinha. Em alguns momentos pula e até mesmo anda em círculos. Vive a contorcer-se de dor. Não enxerga nada através do vazio que se apodera dos seus olhos. Guia-se apenas pela audição ou pelo faro. Está sempre perdida, à procura das irmãs. Vive à espreita. É ela quem assume as glândulas e as garras; e apenas rouba, suga, escraviza. Ela não tem nada para emprestar. Não possui dom algum. Quando ela reina, transforma tudo em ruínas, deixa carcaças pelo chão e um cheiro ácido de sangue pelo ar. Ela é o vazio; a insânia.” 

Sobre reflexo


“No espelho 

da natureza

todos tem 

o espanto 

do que eles 
próprios são

Por isso é que 
os fantasmas 

- por mais que 
eles assombrem 
crianças e adultos

Tem sempre 
os olhos claros...”

(Cris de Souza)



A coreografia “In Pueritia Vertigo” foi a segunda a ser idealizada, mas a primeira a ser concretizada. Ela fala sobre o fator psicológico da Síndrome de Peter Pan... A dificuldade de aceitar a vida adulta... A ligação imensa com a infância!

“Quando eu era criança, eu não gostava de outras crianças. Comecei a frequentar a escola, e tinha crises quando dava o barulho da sineta do recreio. Eu via pela janela todas aquelas crianças saindo muito rápido e correndo. Me dava um pavor tão grande, que eu começava a chorar.

Quando eu era criança, eu colecionava bichos mortos. Insetos, na maioria das vezes. Uma vez achei um fóssil de lagartixa e guardei em um pote de filme fotográfico. Eu olhava para ela todos os dias e eu vi ela se esfarelar e sumir por completo. 

Quando eu era criança, eu era gaga. Mas isso melhorou com o tempo, e quando estava na terceira série ganhei 3º lugar em um concurso de oratória. Meu assunto: Borboletas Caligo (Aquelas semelhantes às corujas).

Quando eu era criança, meu sonho era ter um dicionário. 

Quando eu era criança, eu tinha crises de choro, do nada. Eu não lembro das crises. Mas conta minha mãe que ao perguntar o motivo, eu dizia que não queria crescer. 

Não havia nada de bom na minha infância. Eu fui uma criança solitária e cheia de problemas. Mas eu realmente não queria ter crescido. Eu tenho saudades de algo desta época, e eu não sei o que é.

Quando cresci, sempre tive a sensação de não estar preparada, de não saber tomar certas decisões... Eu ainda me sinto infantil em muitas coisas. E isso me prejudica. Às vezes eu finjo ser criança, ou fico imaginando...


Durante a coreografia, eu tentei acessar várias das minhas memórias corporais de criança, como a contração do intestino e a contração dos dedos dos pés... A minha fixação pelas minhas mãos... E pela minha boca...

A boneca entra na coreografia como o símbolo da infância, o chocalho da criança...

No final, eu canto uma parte da música que significa “uma última vez”, junto o espírito da boneca (ou esse apego à infância) e deixo ir... No vídeo não dá para ver muito bem, mas eu jogo para o ar, fazendo movimentos de pássaro com as mãos...

Escolhi a música "Vermisster Traum" do Goethes Erben antes de saber o que ela significava, até que um dia, a banda postou um vídeo desta música, onde o vocalista segurava uma boneca. Fui ler a tradução da letra e: “Ela pega a boneca - chocalho da criança... Um grito está faltando - olhos cegos!”

Neste trabalho não existe exatamente um enredo, uma história. Existe todo o conceito, que infelizmente poucas pessoas irão compreender, e que é difícil de “desenhar”. Trata-se de algo muito pessoal. De uma vivência. De um sentimento e de uma dor que somente eu conheço.








[Em Movimento] Para refletir...

por Melinda James


Quem faz aula de dança deveria refletir sobre este assunto. Não sou a primeira nem a última abordar, mas quem sabe juntos podemos iniciar um saudável debate. 

Para refletir...

Nestes últimos 2 anos fecharam umas 6 escolas conhecidas no Rio de Janeiro, digo somente sobre as de Dança do Ventre, o que nos mata de dor no coração e preocupação, pois o fechamento das escolas significa que o meio está minguando. É ruim pra quem fecha, é ruim pra quem fica, é ruim pra quem faz evento, para quem vende produtos relacionados, mas é ruim, principalmente, para os alunos.

O aluno precisa saber e entender que fazendo aula ou não a escola abre e paga as contas normalmente.

O aluno pode pensar que o problema não é dele, mas também é, pois no momento que as escolas especializadas em dança fecham, ele só poderá dançar em academias, onde o ritmo é muito diferente e o pensamento é totalmente comercial, geralmente voltado para o público leigo e iniciante.

Se torna difícil o crescimento artístico em locais com ritmo de academia, pois, no momento que os níveis começam a se separar, as turmas diminuem, o que não torna a atividade rentável para uma academia e o aluno terá que sobreviver em aulas mistas sempre voltadas para as pessoas que iniciam.

Você tem um professor, você gosta dele, respeita o trabalho dele, mas sempre que tem feriados você tenta pagar aula proporcional? Mesmo sabendo que a escola paga sempre integral seus custos? 

Reclama pra pagar a mensalidade inteira quando falta? 

Tenta negociar aulas que você faltou, mas o professor estava lá te esperando?

Seu professor pode não se sentir respeitado e, muito menos, querido. Ele administra e tenta esconder o quanto isso o magoa. Magoa realmente e principalmente os professores que montam a aula e estão sempre pensando em como fazer o aluno crescer.

Muitas vezes, ao trancar a mensalidade, outras colegas de dança também acabam trancando e, ao ver que seu tempo separado para aquela turma foi dispensado, o professor ou mesmo a escola busca outra atividade para colocar no lugar. E quando você resolve voltar, o horário não existe mais. O que o aluno faz? Reclama, se sente colocado de lado, substituído, uma visão unilateral muito comum em nossa área.

Dezembro tem festa de fim de ano e todo ano tem alguma aluna que reclama de pagar a mensalidade, alegando que estava “somente” ensaiando. O ensaio cansa triplamente o professor e ocupa o mesmo espaço físico da escola. Estar atento a limpeza dos movimentos, a ajudar o aluno, a fazer o grupo entrar na mesma energia, cobrar presença das alunas que faltam, e muitas vezes agendar muitos ensaios extras sem remuneração é um cansaço enorme. E no fim, o aluno alega que estava somente ensaiando?

Também existe uma eterna insatisfação por causa das taxas. No Rio as taxas são incrivelmente baratas e as locações dos teatros incrivelmente caras. Há uns anos atrás fazer shows era mais fácil, hoje em dia é um esforço enorme, um trabalho de amor e união entre as partes envolvidas. As escolas e os professores mal conseguem pagar os custos com a receita que totaliza Taxas + Ingresso. Se cada aluno vendesse 20 ingressos não precisaria existir taxa de ensaio, mas os que mais reclamam, não vendem, não divulgam, e eu fico pensando como é esta conta, imaginária? Como pagamos atores para costura, cenário, professores, equipe de apoio, lanche, teatro, luz, programas e divulgações?

Eu me sinto confortável em dissertar sobre isso por amar demais o que eu faço. Jamais trabalhei por dinheiro e nunca na vida um aluno para mim representou valores. Porém, gostaria que as alunas de dança do nosso meio pensassem no trabalho de sua escola e de seu professor, e quem sabe em 2018 possam refletir e mudar o padrão de algumas atitudes.

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