por Mariana Garavelo
Faz
um tempo já que eu percebo que muitas pessoas no meio da dança falam comigo e
soltam frases do tipo "Sei que você não gosta de ATS®..." ou "Tudo
bem que o ATS® não é sua praia...", ou ainda "Você vai participar do
evento, mas não vai falar nada contra o ATS® né?"...
Comecei
a pensar se não acabei criando por meu próprio mérito este estereótipo de ser
“anti-ATS”. Talvez escrevendo e expondo meus pontos sobre este assunto eu
comece a criar uma nova imagem sobre mim para quem dança.
A
história do Tribal Fusion no Brasil demorou a chegar com informações reais,
todo material era bem escasso e a grande maioria de quem pratica o Tribal
Fusion aqui no Brasil conheceu o ATS® depois de conhecer o Tribal Fusion. A
linha do tempo da história do Tribal foi “invertida”. E cá para nós, eu
acredito que isso não seja um problema. Primeiro, porque a história não é linear
e muitas manifestações artísticas aconteceram simultaneamente auxiliando na
construção do Tribal; segundo, porque trabalho num estúdio de Dança do Ventre e
ninguém procura as aulas porque viu um vídeo da Samia Gamal ou porque adora
Souhair Zaki. Conforme a aluna vai estudando ela aprende a história e as
origens.
Mais
tarde com a quantidade de informações na internet, livros, monografias, vídeos,
entrevistas e professoras brasileiras formadas no exterior, a história do
Tribal foi preenchendo nossos materiais de estudo aqui no Brasil e isso foi
fundamental para que nós entendêssemos o papel de cada bailarina e de cada
inserção de informação nesta dança até ela se tornar o que fazemos hoje.
O
ATS® é um dos diversos pontos na história do Tribal Fusion. Se pudéssemos
desenhar uma árvore genealógica desta dança, na raiz estaria a Dança do Ventre
e as danças folclóricas dos povos do Norte da África. Jamila Salimpour foi a
primeira idealizadora desta estética adicionando um pouco de teatralidade
circense às performances do seu grupo Bal Anat, porém nunca chamou o que fazia de
“Tribal” e não foi a responsável pela adesão do flamenco e das danças indianas
que vieram depois.
As
responsáveis por dar corpo a este estilo foram Masha Archer e depois Carolena
Nericcio, que terminou a construção do que passou a ser chamado de American
Tribal Style® ou simplesmente ATS®. Em simultâneo, grupos como Hahbi'ru e Aywah
formados a partir de integrantes do grupo de Jamila que também trilhavam o caminho
da construção do Tribal Fusion. Hoje o que nós dançamos é um punhado disso tudo
somado as nossas próprias inserções. Logo, o ATS® é um dos troncos desta árvore
genealógica e tudo o que veio depois, através de experimentações feitas a partir
do já consolidado ATS® e de outros grupos que surgiram após Jamila Salimpour,
passam a ser galhos destes troncos.
Todas
as danças tem uma raiz, no caso do Tribal, especificamente, são raízes
diversas. Se existe uma informação que circula sobre a origem do Tribal com a
qual eu não concorde é a de que o ATS® é a única origem do Tribal Fusion. É
fato que o termo “Tribal” vem de “American Tribal Style”, pois o nome surgiu a
partir de bailarinas que praticavam o ATS® e modificaram seu repertório. Mas
não estou considerando o nome, e sim a dança como linguagem. Muitas bailarinas
também foram influenciadas por grupos fora do círculo do ATS®, como Rachel
Brice (que já declarou sua admiração e influência de John Compton) e Zoe Jakes (que
foi integrante do grupo de Katarina Burda).
Sendo
assim, não tem muito fundamento esta dicotomia entre Tribal Fusion com e sem
ATS®, pois as matrizes são as mesmas. Se você estuda Tribal Fusion, certamente
aprenderá ao menos um pouquinho de ATS® (seja a estética, os desenhos, o
repertório). Você pode nunca ter feito uma aula de ATS®, mas ele está ali, quase
sempre intrínseco no que você aprende assim como a influencia de Jamila
Salimpour, John Copton, Katarina Burda e outros. Da mesma forma como não há
quem estude o ATS® sem aprender um pouco da dança do ventre, do flamenco e das
danças clássicas indianas.
Aprendi
isso estudando pontos da história que há anos atrás eu não entendia. Espero que fique
esclarecido então que eu nada tenho contra o ATS®. Nunca tive e adoro! Acho o
estudo dele e de suas matrizes ricos, tanto para quem apenas pratica o Tribal
como para quem leciona. As vivências em todas estas danças são muito
agregadoras ao nosso glossário de movimentação.
Que
a arte do Tribal Fusion, contemporâneo ou ATS®, permaneça no seu intuito de
unir as culturas numa só fusão e linguagem; e que todos tenham o prazer de
praticá-la reunindo seus mais diversos arquétipos e expressando-os em forma de
dança.. É
isso o que importa, a dança está cada vez mais ativa e acessada por todos e sua
história sendo contada cada vez mais sem protecionismos.