[Estilo Tribal de Ser] Búzios

  por Annamaria Marques


Olá, pessoal!

Hoje vamos de búzios!

Rachel Brice 


Sim, esta conchinha linda que vemos em vários acessórios étnicos, esteve muito presente nos figurinos de nossa dança e, com frequência, volta à moda mainstream seja ao natural, seja de metal ou outros materiais.

As conchas que mais vejo em figurinos são estas:

Monetaria moneta              |            Monetaria annulus


O que conhecemos genericamente como búzio é uma espécie de molusco marinho ( e dizem que existem mais de 180 espécies desta família!) chamada Monetaria (Monetaria moneta Monetaria annulus, no caso) e sua concha era usada como meio de troca em várias partes do mundo. Encontrei indícios deste uso como “dinheiro”  na África, Ásia e Oriente Médio e, posteriormente, trazida pelos colonizadores às Américas. Com a sua desvalorização e substituição dos meios de troca, as conchas passaram de dinheiro a decoração em roupas, joalheria, em instrumentos musicais, etc.

Além deste uso, as conchas também são usadas como método de adivinhação em algumas religiões africanas (e de matriz africana) e na astrologia hindu.


Por Malcolm Lidbury (aka Pinkpasty) - Obra do próprio, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=15765346

Prasnam – astrologia hindu

Exemplos de usos como decoração por diversos grupos étnicos:

Enfeites Amazigh

Adorno Kalbelya

Chapéu Kalash


Cinto Hamar -  Turmi, Ethiopia. 

Gonzuk, do grupo Ersari

Pingente Banjara (Índia)

Em nossa dança, os búzios são incorporados em  acessórios vindos destes grupos ou inspirados em acessórios étnicos originais. 


Misha Bellydance (EUA)

Morgana (Espanha)



Sharon Kihara (EUA)

Cibelle Souza (RN)



Cinto para dança Fusion ou FCBD®

Colar indiano


Não encontrei referências de como são criadas esses moluscos ou se são pescados, mas acho pouco provável que não seja predatório, visto que é algo comercializado em grandes quantidades. Vale a pesquisa.


Bibliografia:

The Tribal Bible: Djoumahna, Kajira. The Tribal Bible, Exploring The Phenomenon That Is American Tribal Style Bellydance . Black Sheep Belly Dance. Edição do Kindle.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Monetaria_moneta

https://en.wikipedia.org/wiki/Monetaria_annulus

https://en.wikipedia.org/wiki/Shell_money

astrologer.swayamvaralaya.com/prasnam

Oficina sobre figurino Kalbelya com Gulabo Sapera (jun 2020)

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Estilo Tribal de Ser



Annamaria Marques (Belo Horizonte-MG)
 é bailarina, professora, produtora do festival Tribal Core, dona do atelier InFusion e diretora da Trupe Andurá de ATS® e da Tribo Dannan de Tribal Fusion de Minas Gerais.Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 


[Corpo & Dança] Tribal Fusion x COVID

por Jossani Fernandes 

 

Então gente hoje decidi quebrar um pouco da sequência que eu estava levando com a coluna, mas por uma causa que julgo ser importante principalmente devido a fase atual que estamos vivendo. Na verdade, confesso que estou utilizando esse período de pandemia para trazer essa informação, que a muito tempo grandes estudiosos já vem se esforçando para desvendar, mas somente agora tal assunto começou a sair na mídia. Porém me incomoda muito começamos a dar importância às coisas que nos fazem bem apenas após aparecerem em fontes que nem sempre são confiáveis.

Digo isso, pois é necessário colocar em mente e dar, nem que seja um pouco mais de importância, ao fato de que nós somos sensacionais haha. O primeiro ponto que quero abordar é:

1.    O que a dança representa de fato?

Agora vamos esquecer um pouquinho dos nossos sentimentos rsrs, pois sei que a primeiro momento ela possui uma representação afetiva, mas antes de tudo a dança é um exercício físico!

2.    O que é exercício Físico?

Nada mais é que uma pratica de exercícios estruturada, ou seja, ou que nós professoras fazemos para nossos alunos e o que nós alunos nos submetemos cerca de duas vezes por semana.

Nessa perspectiva, o colégio Americano de Medicina da Saúde (ACSM, 2002) estabelece que as recomendações de exercícios podem ser realizadas com exercícios de 30 a 60 minutos intensidade moderada (cinco dias por semana) ou 20 a 60 minutos de intensidade vigorosa (três dias por semana), totalizando pelo menos, cerca de 150 minutos de exercícios moderados por semana.

Ok... Falei bastante, não sei se entenderam, mas não precisam ficar preocupadas em gravar o parágrafo acima. O importante mesmo é o fato de que nós contribuímos fortemente para melhorar a saúde das pessoas e sem perceber, da nossa, com aquele treininho de 20 minutos em períodos aleatórios  do dia, aquelas aulas 2 vezes por semana e aquele momento que unimos com nossas amigas para treinar a coreografia da professora ou até mesmo nas lives que nos jogaram para cima nessa quarentena e não nos deixaram desistir.

Ambos, simbolizam saúde, significam sair do percentual da população que se encontra na escala de sedentarismo que vem matando duas vezes mais que a obesidade. Desse modo, podemos dizer que o exercício físico é como umaa medicação diária para combater as mazelas da saúde, sejam elas físicas ou emocionais.

E por que eu citei o nosso novo normal?

O que tem haver o período de pandemia com a dança?

Tem tudo haver! Como já falei, quando dançamos, não somos felizes atoa, liberamos diversos hormônios através no nosso sistema nervoso e acima de tudo estamos em movimento. Estar em movimento, dançar, demanda uma série de contrações musculares, nossos músculos se alongam, trabalham o tempo inteiro para sustentar cada pose nova que decidimos experimentar e enquanto isso indiretamente estamos produzindo hormônios também através dos nossos músculos.

Todos já ouviram falar que o exercício auxilia a melhorar o sistema imune, não é verdade? E um dos fatores responsáveis por esses mecanismos é o próprio movimento, o tecido muscular é capaz de produzir e liberar substancias na corrente sanguínea, ele produz e libera mediadores que quando agem em outros sistemas e tecidos, mantendo a atividade funcional deste.

A Irisina é um desses e sua ação consiste em modificar o metabolismo do tecido adiposo branco, favorecendo o gasto energético. No quesito COVID – 19, ao analisar dados genéticos de células adiposas, os pesquisadores observaram que a substância tem efeito modulador em genes associados à maior replicação do novo coronavírus dentro de células humanas.

Por isso meu conselho é não tenham medo de se exercitar, se cuidem, mas continuem dançando, pois sim exercício é um santo remédio e a nossa dança nem me fale! Até a próxima tribo...

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Corpo & Dança: Um olhar sob nosso Palácio Industrial


Jossani Fernandes (Belo Horizonte-MG)
 é professora e bailarina de danças orientais, profissional de educação física, atua na área como personal trainer e pesquisadora da área da flexibilidade, é apaixonada por anatomia e por tudo que diz respeito ao corpo humano e toda a sua complexidade.  Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 

[Resenhando-RS] Dura Máter - 2019 & 2020

 por Anath Nagendra



Hoje lhes trago uma resenha do recém premiado DURA MÁTER, da escola Al-Málgama, de Porto Alegre!

Fotografia de Clovis Dariano

O espetáculo rolou em 2019, com direito à instalação artística fora do palco, mas as demais temporadas foram canceladas por conta da pandemia. Ainda assim, a escola disponibilizou o vídeo na íntegra neste ano! Infelizmente não pude comparecer na estreia, mas posso afirmar que, mesmo assistindo virtualmente, os arrepios não foram poucos!

Fonte: Facebook Al-Málgama



Confira a sinopse divulgada:

"O Espetáculo Dura Máter é um show de dança tribal, que através de uma perspectiva feminista tem como objetivo retratar a trajetória da mulher na sociedade ao longo da história. O espetáculo trata sobre como a consciência da mulher em relação ao meio social faz com que seja possível vislumbrar a busca por equidade. A necessidade de falar sobre feminismo e o que ele representa urge cada vez mais forte dentro de todas e todos que acreditam em um futuro igualitário, e é com essa força que o espetáculo traz à tona aquilo que atinge e machuca mulheres diariamente na sociedade, mas principalmente, mostra a beleza de poder contar com outras mulheres para resistir e persistir na luta diária."

Fotografia de Lau Baldo


Com o mito de Pandora como um dos temas-chave, o show recebeu oito indicações em categorias do Prêmio Açorianos, um dos mais conceituados do Rio Grande do Sul! São elas: Espetáculo do ano; Produção e Cenografia (Al-Málgama); Direção e Coreografia (Bruna Gomes); Bailarina (Taís Schneider); Iluminação (Leandro Gass) e Figurino (Loraine Santos)!

Mas até mesmo a premiação foi postergada, e somente em setembro deste ano soubemos dos ganhadores, através de uma cerimônia on-line. DURA MÁTER foi premiado em três categorias: Espetáculo do ano, Produção e Figurino, além de terem levado o Destaque de Dança do Ventre!


Não sabemos se haverá alguma temporada que envolva toda a produção e instalação artística novamente após a pandemia ser controlada, mas, por ora, apreciem o espetáculo!

 

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Resenhando-RS



Anath Nagendra (Esteio-RS) é bailarina, professora, coreógrafa e pesquisadora de Danças Árabes, Raja Yoga e, em especial, Tribal Fusion e suas vertentes. Hibridiza sua arte e percepção com grandes doses de psicologia, espiritualidade e ocultismo. Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >>

[Resenhando-SP] Tribal Beach Online - A Pedra da Feiticeira

 Por Kayra Nataraja  (Santos-SP)
Colaboração especial para coluna Resenhando-SP
Coordenação: Irene Patelli



Quem visita a praia do Itararé, em São Vicente, observa uma pedra grande, solitária, na beira do mar. Em cima dela uma escultura revela a imagem de uma mulher, erguendo aos céus uma oferenda. A história por trás da obra é uma alusão a uma lenda, que habitou o imaginário dos moradores da região ao longo dos séculos. Conta-se que uma mulher misteriosa, de cabelos desgrenhados e mal vestida era vista por alí. Falava sozinha, acenava para o mar, fazia fogueiras e às vezes, exausta, adormecia sobre a pedra. O motivo de tanta dor seria uma marinheiro português, com quem tivera um caso de amor. O marujo partiu, deixando-a grávida e com a promessa jamais cumprida de que voltaria para buscá-la.

Praticar dança tribal aqui em São Vicente tem umas particularidades deliciosas. A primeira delas é a liberdade que temos para criar e vivenciar nossas inspirações. Todos os nossos dons são aproveitados. Há espaço para diversos talentos. Assim como há espaço para todos que queiram descer a serra. O grupo vai aumentando, trazendo pessoas de várias cidades e esses momentos são apaixonantes. É mágico olhar em volta e se perceber cercada por pessoas tão interessantes e sensíveis… todos unidos para deixar no mundo sua pincelada de arte!


E assim, nessa atmosfera leve, veio a ideia do Marcelo Justino, de criar um espetáculo inspirado nesta lenda. E a responsável por caçar nossos talentos e fazer a coisa acontecer chama-se Dayeah Khalil. Falar dessa mulher requer um capítulo à parte e, sem dúvida, vou me rasgar em elogios. Porque o que ela faz é absolutamente incrível. Com suas palavras sempre doces e olhar afinado ela sabe exatamente o que “puxar” de cada uma de nós. Nos guia na dança e nos permite ir além… assim cantamos, declamamos poemas, tocamos instrumentos e podemos viver o êxtase de se entregar a arte sem os cruéis parâmetros do “esteticamente perfeito”.  

Em Fevereiro desse ano estávamos lá, na Concha Acústica de Santos. Todo o roteiro pronto, músicas e poemas na ponta da língua, instrumentos afinados, coreografias ensaiadas, figurino impecável. Entramos no palco… e começou a chover… Espetáculo adiado para data a ser remarcada. Daí o corona vírus entrou em cena… sem previsão de terminar seu show dantesco. Atire o primeiro rivotril quem não pirou nessa quarentena. Mas esse vírus maléfico “não contava com a astúcia” da  Dayeah… pensa que ela sossegou??? Não conhece essa mulher… Ela seguiu com as aulas em formato virtual e botou todo mundo para estudar.


Aproveitando nossa tradição do Tribal Beach, Outubro é o mês do Dark. E esse lance de feiticeira andando na praia descabelada, chorando e falando sozinha casa bem com a data. E assim, no meio de um isolamento social imposto, começou o processo de reorganizar o espetáculo, para que ele se encaixasse no formato virtual.  Cada uma trouxe suas percepções, que foram somadas ao todo. Conseguimos exercitar aspectos artísticos muito variados: narrar a história, ilustrar o enredo, cantar, tocar, declamar, fotografar… e dançar! Os cantinhos de nossas casas foram transformados em palcos, estúdios de gravação, ateliês… Todas as contribuições alinhadas ao roteiro.


No dia 29 no Outubro o vídeo foi lançado no Youtube, mantendo a tradição de ter perto de nós tanta gente incrível, mesmo que estivéssemos longe. Podemos ver alí o trabalho de cada um em vivenciar detalhes do mito, temperando tudo com sua verdade e beleza.

Talvez, o que estejamos construindo por aqui seja algo que vai além da dança tribal, embora ela seja o cerne de tudo. É sobretudo um trabalho de valorização das nossas expressões artísticas e de sororidade. O presente que a Dayeah nos proporciona com sua liderança é um carinho tão bom na nossa auto estima que sempre queremos mais. Nossa inspiração está sempre alerta e dançar com essas mulheres faz a gente se sentir mais uma loba da alcateia. Quer saber como é? Só vem!

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Resenhando-SP


Kayra Nataraja (Santos-SP) , transitando pelo universo da auto descoberta através da dança desde 1999, aluna da professora Dayeah Khalil. Conduz, em parceria com Samaa Hamraa rodas de dança meditativa na força do Sagrado Feminino.
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Irene Rachel Patelli (São Paulo-SP) é técnica em dança formada pela Etec de Artes/SP, coreógrafa, bailarina/dançarina, performer, professora de tribal fusion, dark fusion e ATS. Formação em yôga, pesquisadora de ghawazee e zaar. Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >>

[Folclore em Foco] Snujs - Ancestralidade na dança

 por Nadja El Balady


Snujs, sagat, zills, finger cymbals, crótalos, címbalos. Se você é uma dançarina de qualquer estilo de dança do ventre, você já está familiarizada com algum destes termos. Você sabe que são importantes acessórios para a prática da dança, sobretudo para as dançarinas de ATS®/FCBD Style® e folclore árabe. Mas você sabe por que nós dançamos tocando?  Sabe qual a importância este instrumento tem em suas culturas de origem?

Venha comigo descobrir um pouco da história dos snujs e entender o que estamos representando quando simplesmente os colocamos nos dedos e tocamos na nossa dança.

Snujs são instrumentos musicais, da classe das percussões leves, que atuam como guia para os outros músicos, ajudando a manter o andamento da música igual para todos os instrumentos. São pequenos pratos de metal, que se prendem aos dedos com elásticos e que em conjunto de quatro unidades formam dois pares de címbalos, sendo um par para cada mão.

Existem inúmeros tipos, formatos, variedades e tamanhos de snujs, bem como diferentes nomes, como demonstrado na primeira linha deste artigo. Isso acontece porque são instrumentos ancestrais, existentes há milhares de anos e em culturas de diversos locais do planeta: Da África à Ásia, do Marrocos à Índia, sobretudo no Oriente Médio, encontramos indícios de que este instrumento atravessou o tempo e permanece como traço identitário da musicalidade de diversos povos. A palavra snujs, é proveniente do dialeto sírio/libanês utilizados por imigrantes árabes no Brasil. Sagat é a palavra egípcia e zills é como o instrumento é chamado na Turquia.

Os snujs podem ser feitos de materiais diferentes, com espessuras diferentes e tamanho do diâmetro diferente também. Cada especificação gera um som diferente. Dependendo da região, são tocados de maneira diferente também. Snujs mais finos tendem a ressoar por mais tempo, snujs mais grossos tendem a ter um som mais seco. Dependendo do som que se quer produzir, pode-se usar técnicas diferentes para tocar. Existe um artigo em inglês bem interessante a respeito de diferenças entre sagat tradicional egípcio e os zills produzidos nos Estados Unidos, no site Gilded Serpent, escrito pela Yasmin Henkesh em 2011. O link de acesso estará no final deste artigo.

No Egito, existem sagat de diversos tamanhos: Entre 3 e 6 centímetros de diâmetro, normalmente usados por dançarinas, entre 8 e 10 centímetros, para músicos e entre 12 e 15 centímetros para rituais religiosos.

Muito se especula a respeito de uma origem sagrada para o instrumento. Mas não são de origem sagrada todos os instrumentos? A própria arte nasceu da catarse para expressão dos sentimentos humanos e a tentativa de comunhão com o divino: A música, a dança, a pintura. A arte servia aos antigos como forma de conexão entre o visível e o invisível. Existem comprovações de uso de címbalos com diversos formatos em algumas culturas ancestrais como antigo Egito, Babilônia, Tibete e muitos outros países da África e da Ásia. Algumas pessoas escrevem a respeito da elevação do astral do ambiente, atribuindo ao som emitido pelos címbalos características positivas e alegres. Outras pessoas ainda afirmam a capacidade de que o som teria de afastar os maus espíritos e por isso serem tão importantes em templos e atividades religiosas. Apesar destas afirmações terem mais ou menos indícios de comprovação, nunca foi de meu especial interesse estabelecer certezas neste sentido, pois ao longo do tempo os címbalos foram mudando de formato, material e também de função cultural, antes que chegasse na prática da dança do ventre como conhecemos.

Ainda sobre o uso sagrado dos snujs, é importante saber que a música árabe tem uma tradição antiga de música religiosa. A música islâmica medieval se voltava constantemente para o sagrado, assim como sagrado era o uso dos instrumentos. A partir do momento em que a música atinge outros objetivos sociais além do louvor, também o uso dos instrumentos musicais ganha um outro significado, servindo para celebrações, para a guerra, para situações cotidianas e assim se torna um elemento da identidade cultural de cada povo e é a partir deste ponto de vista que os snujs ganham importância para quem dança.


Sendo usado como acessório fundamental da dança em locais diversos do norte da África, vamos encontrar registros abundantes do uso de snujs no Egito, onde o instrumento é conhecido como “sagat”. O sagat está integrado ao cotidiano musical do povo egípcio e o uso em conjunto com a dança faz parte da tradição cultural. Não conheço registro preciso de quando o sagat foi incorporado à dança, mas se sabe que durante a idade média já era utilizado inclusive como forma de entretenimento agregado a apresentações de grupos de músicos e dançarinas em celebrações e ocasiões especiais. A partir de meados do século XIX, encontramos evidências de duas classes de dançarinas profissionais atuando no Egito: As Awalen e as Ghawazee. Ambas as classes de dançarinas profissionais existiam durante a idade média, desde o período otomano, sobrevivendo e se adaptando às transformações da cultura egípcia. Awalen era uma classe de mulheres profissionais da música e da dança que, eram educadas para se tornarem artistas. Atuavam principalmente nos centros urbanos do Cairo e Alexandria. Ghawazee é uma palavra para descrever a função de artista desempenhada pelas mulheres de etnias relacionadas ao povo Dom, entre eles algumas famílias que se identificam como etnia Nawar, que teriam migrado para o Egito na idade média, trazendo em sua tradição a prática da performance pública como forma de sustento. Essas pessoas são conhecidas como os “ciganos egípcios” (termo pejorativo, com o qual muitos não se identificam), tendo sofrido toda sorte de preconceitos ao longo da história recente do Egito. A dança ghawazee é uma arte considerada vulgar desde a invasão francesa no final do século XVIII, forçada a deixar os centros urbanos e migrar para as regiões rurais, se adaptando aos costumes de cada local. Seguiram realizando sua forma de arte espontânea e familiar a contento do povo da zona rural em suas celebrações, levando consigo a identidade cultural da região onde atuam, sendo reconhecidas como tal. Ghawazee e Awalen, apesar de diferentes em termos sociais e étnicos, eram semelhantes em suas performances no período do final do século XIX até a metade do século XX. Usavam figurinos semelhantes e sempre usavam sagat em suas performances. Uma marca das performances ghawazee e awalen.


Nos centros urbanos do Egito, estas duas classes de profissionais da dança aos poucos foram sendo substituídas por uma terceira classe: A dançarina oriental (raqisah), educada no contexto artístico para performances em teatro, casas de show e cinema. Podemos ver nos filmes do período considerado como “era de ouro” do cinema egípcio, performances de dançarinas que sempre usavam sagat para ilustrar cenas de celebrações populares e folclóricas. Pouco a pouco o uso dos sagat foi sendo limitado à representação folclórica nos shows de dança. Embora exímias tocadoras de sagat, as dançarinas profissionais foram deixando de tocar nos longos shows egípcios, deixando para tocar no trecho folclórico do show. Nos dias de hoje alguns shows não têm nem mesmo o uso do sagat pela dançarina, principalmente tendo em vista que uma grande parte das profissionais que atuam no Egito são agora estrangeiras.

Nos Estados Unidos, o instrumento chegou junto com as ghawazee que para lá migraram e influenciaram as primeiras dançarinas de belly dance profissionais. Os zills, como são mais conhecidos por lá, se tornaram parte imprescindível da performance do estilo “cabaré americano”, que é como a estilização da dança do ventre passou a ser conhecida nos Estados Unidos. Dominar diferentes padrões de toque para zills é fundamental para a dançarina profissional estadunidense. Elas usam os instrumentos para diversos fins, inclusive para abrilhantar solos de percussão, onde exibem destreza e agilidade de toque na composição musical. Zills são importantes para cativar a atenção do público e criam uma conexão cênica perfeita entre música e dança.

A famosa Jamila Salimpour, que durante as décadas de 60 e 70 formou muitas dançarinas profissionais, tinha o uso de zills como obrigatório em seu formato. Sua filha Suhaila deu continuidade ao seu legado formando pelas décadas subsequentes incontáveis dançarinas que precisam dominar os zills para terem sua formação completa. O formato Salimpour foi o ponto de partida para o surgimento da estética tribal que se desenvolveria ao longo das décadas de 80 e 90, levando este elemento étnico e ancestral como parte fundamental do estilo tribal americano.

As praticantes das fusões aprendem a tocar os snujs, mas muitas vezes não entendem bem o porquê. Quem estuda o folclore árabe, aprende a relação do instrumento com as danças populares.

Toda a estética tribal se inspira na música, movimentos e figurinos usados pelas mulheres em suas danças populares no norte da África: Das tribos nômades do povo Amazigh (Berberes), das ghawazee egípcias aos povos beduínos do Oriente Médio. O estilo tribal carrega em si estas referências importantíssimas da origem popular da dança do ventre, tendo no uso dos zills a conexão definitiva com povos que ao longo do século XX sofreram inúmeras perseguições culturais, tendo suas tradições massacradas pelo colonizador europeu, sofrendo preconceitos e limitações sociais e econômicas.

A classe das awalen não mais existe e as ghawazee estão em extinção. As dançarinas naiyliat (ouled nail) da Argélia também. Para nós ocidentais, praticantes de uma arte que tem origem tão antiga e diversa, saber quem são, quem foram e qual a importância da dança nas vidas destas mulheres é uma questão de se reconhecer como mulher que dança. É entender a ancestralidade da dançarina, suas raízes. Uma arte que muitas vezes era transmitida de mãe para filha. A dança era para elas meio de vida, como é para muitas de nós. Meio de vida não apenas como forma de pagar as contas, mas também como forma de afirmação da vida e de celebração de suas tradições. A arte é parte fundamental da identidade de um povo. Ao colocar os snujs nos dedos, estamos fazendo algo muito maior do que simplesmente tocar um instrumento musical na intenção de demonstrar agilidade. Estamos nos conectando a mulheres de povos distantes, de tempos remotos, estamos dando prosseguimento a uma tradição. A dança do ventre se espalhou pelo mundo no século XX e seguiu, se adaptando, se transformando de acordo com a passagem do tempo, de acordo com o local e história corporal das mulheres que a praticam. Uma prática que nos conecta a estas mulheres da história, às suas descendentes e respectivas culturas. Quando tocamos snujs, trazemos um pouco delas conosco. Quando tocamos snujs, as representamos para o nosso público. Quando tocamos snujs, evocamos os mistérios do tempo e de coisas que fogem à nossa compreensão.

Que possamos elevar a nossa consciência no uso das coisas por entender que as coisas carregam consigo memórias escondidas de sua história e que ao usá-las estamos fazendo parte, nos integrando a este fluxo de tempo que dá continuidade a esta mesma história. Olhe para seus snujs e pense nas mulheres que tocam desde tempos remotos até hoje. Honre estas mulheres e os povos de sua origem. Propague a beleza da cultura viva que se espalha em forma de arte e não esqueça que você também faz parte disso.


☛ Indicação de leitura complementar:

You say zills, I say sagat - Yasmin Henkesh, Gilded Serpent, 2011.

http://www.gildedserpent.com/cms/2011/04/25/yasmini-zills-sagat-difference/


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Folclore em Foco


Nadja El Balady (Rio de Janeiro-RJ) é diretora do grupo Loko Kamel Tribal Dance e proprietária do Oriental Studio de Dança no Rio de Janeiro, dedicando-se há 21 anos a estudar danças orientais. Professora de Dança do Ventre, American Tribal Style® e Tribal Fusion, com experiência internacional na Europa em shows e workshops. Estuda o Estilo Tribal desde 2005 e é uma das pioneiras da Fusão Tribal Brasileira. . Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 

[Resenhando-SC] Temporada Tribal - 2ª edição (2018)

 por Aline Pires


 

Continuando o Resenhando-SC com eventos que ocorreram durante o período que o blog estava em hiato. Vamos falar agora da segunda e última edição da Temporada Tribal, festival que aconteceu em 2017 e 2018 em Florianópolis, Santa Catarina. A Temporada Tribal foi organizada por mim e por Cíntia Vilanova, e nossa idéia era criar uma "temporada" para o tribal, como se diz aqui para se referir a estação turística onde tudo acontece, com a diferença que escolhemos a primavera. Queríamos um festival que abraçasse o estilo tribal e oferecesse aulas com professoras de fora de Santa Catarina, para atualizar as bailarinas e fazer a dança crescer em qualidade na cidade e no estado. A primeira edição também teve um Resenhando-SC, e você pode conferir aqui: https://coletivotribal.blogspot.com/2018/03/resenhando-sc-festival-temporada-tribal.html

 

Na segunda edição, em 2018, tivemos a honra de receber as professoras Aline Muhana (RJ) e Mariana Quadros (SP). Nesta edição, eu e Cíntia também oferecemos workshops.


Os workshops aconteceram na ordem que segue:


PERÍODO DA MANHÃ


Repertório Rachel Brice e Desconstruções, Tribal Fusion com Aline Pires:








TRECHO DO WORKSHOP:




Explorando Contrastes, Tribal Fusion com Mariana Quadros:





TRECHO DO WORKSHOP:




PERÍODO DA TARDE

Os Quatro Básicos e Variações, FTBD Style® * com Cìntia Vilanova:






TRECHO DO WORKSHOP:









TRECHO DO WORKSHOP:


         

 * No ano de 2018 ainda se chamava ATS®.

 

FEIRA


A Feira da Temporada contou com um Flash Day tattoo com o tatuador Lucas De Abreu, e também ateliers locais expondo seus produtos.








MOSTRA & SHOW DE GALA 


Para a mostra e show dispomos apenas de material fotográfico, infelizmente tivemos problemas com a filmagem do dia, e não temos vídeos das apresentações.

Algumas fotos da mostra de dança:





Tanto a mostra como o show aconteceram no Teatro Álvaro de Carvalho, e o show de gala contou com a presença das professoras convidadas, organizadoras e bailarinas da região.


Elenco: Aline Muhana, Aline Pires, Bia Carneiro, Cintia Vilanova, Julic Carboni, Julieta Furtado, Mariana Quadros, Mari Mallet, Silvia Bragagnolo, Tamiris Madeira.







 

Confira os álbuns completos na página do evento:


| Fan Page Temporada Tribal |



Gostaria de agradecer os participantes e o público, e agradeço o blog pela oportunidade de mostrar o festival de tribal que movimentou nossa ilha da magia, assim como minha colega Cíntia por termos feito este belo trabalho juntas.

 

 

 

No próximo resenhando falaremos da Jornada Tribal que aconteceu em 2019, não percam!


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Resenhando-SC


Aline Pires (Florianópolis-SC) é bailarina e professora de dança oriental árabe e fusion bellydance/tribal fusion natural de Florianópolis, Santa Catarina e proprietária do La Lune Noire Estúdio de Dança. Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 

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