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Um sentido para "Tribal"

por Aerith Asgard

Esse texto é para arrematar os pontos dos meus textos anteriores sobre o assunto. Ele foi gerado a partir de uma conversa com a leitora Pâmila (esqueci seu sobrenome xD Caso veja esta postagem, me lembra de atualizar, por favor =) ) há um tempo atrás.

Essas são apenas minhas reflexões e impressões pessoais sobre todo o processo. Comentários são bem-vindos e servem para aprendermos mutuamente ^^


 
É difícil falar uma coisa que não vivi.Comecei a ser praticante de tribal no final de 2008. O processo que tento fazer é o mesmo que historiadores fazem,que é coletar dados, informações e tentar encaixar um com o outro de forma que façam sentido entre si. É um processo investigativo. Claro que uma pessoa que viveu esse processo vai falar com muito mais convicção, detalhe, clareza e propriedade sobre tudo isso =) Por isso vejo nas entrevistas uma grande ferramenta de ajudar a reconstruir a nossa História Tribal Brasileira, pois cada um conta suas experiências e como a dança desenvolveu em tal época. Desta forma, podemos ir juntando as peças deste grande quebra-cabeça.

A dança tribal entrou no país em 2001, com  Shaide Halim. Não existia youtube, a conexão era ruim e a informação disponível na internet era rara. Ou seja, quando a dança entrou aqui foi porque a Shaide teve contato com a dança lá fora e, o que ela aprendeu lá, ela trouxe para cá, introduzindo o que era peculiar ao estilo dela. Ela foi a primeira disseminadora do estilo no país. Os primeiros grupos que tenho conhecimento, começaram a ser criados com maior intensidade a partir de 2005-2006. Ou seja, a dança já tinha entrado, mas havia a dificuldade de comunicação e de divulgação, pois não existia  meios de propagação. Uma novidade demorava meses para chegar ao interior do mesmo estado,por exemplo. Imagina a informação sobre o tribal alcançar diferentes localidades numa extensão territorial que é o Brasil? Por isso o processo inicial foi lento. As pessoas começaram a ter mais informações sobre o estilo a medida que  a mesma foi se tornando globalizada e,portanto, acessível, e claro que a internet foi um marco nisso tudo;mas mesmo com algumas informações aparecendo, ainda não existia o youtube , por isso, o jeito era conseguir dvds didáticos para estudar que , mesmo assim não eram tão fáceis. Por volta de 2006, o Youtube tornou a informação mais acessivel a diferentes partes do Brasil e do mundo. Assim, cada localidade começou a ter conhecimento do que  outras regiões distantes estavam fazendo e, assim, a cena tribal  começou a andar em saltos, sendo conhecido pelo mundo inteiro. Primeiramente, pelo principal ícone, Rachel Brice, através dos dvds do BDSS; e, segundo, através do Tribal Fest, maior evento do gênero do mundo, cujos vídeos começaram a pipocar com a ascensão do Youtube. Mais ou menos nessa época, os primeiros workshops internacionais de tribal fusion no país começaram a acontecer e as bailarinas começaram a embasar melhor aquilo que só tinham conhecimento por vídeos,por experiências relatadas por redes sociais e workshops nacionais como da Shaide.

Entende o motivo das  bailarinas recorrerem por vídeos? Por necessidade da ocasião! Era tudo o que elas tinham em mãos, então elas tinham que aprender a dança com as ferramentas que tinham disponíveis.E isso não foi nada fácil. Vai por insistência, tentativas e erros, passar por preconceitos por uma paixão doida chamada tribal.


Fusion com ou sem ATS® ?


Eu acho que assistir uma fusão tribal e uma fusão de dança do ventre exemplifique o quero dizer. As bailarinas podem usar o mesmo tema, mas com certeza vão ter posturas diferentes, repertório de passos diferentes, expressão facial diferentes e intenções diferentes. Tudo isso alcança o público, que terão respostas diferentes ao que assistiram. O impacto que o tribal causa no seu público é de prender a atenção, hipnotizar, conseguir transcedentar o arquétipo feminino e sensual da mulher para simplesmente uma palavra: Arte. O tribal emana força e não fragilidade. 

O ATS® possui todas suas regras, seus passos característicos e um formato. Quando Carolena criou o ATS® não foi no sentido de instituir dogmas, mas no intuito da dança não se esvair; ela queria que todos conhecessem sua criação e suas características. Quando o tribal fusion chegou, ele chegou de forma abrupta, de forma que a dança que lhe deu origem ainda não tinha sido finalizada. E todo o processo foi rápido de mais, e claro que a internet tem importância nessa rapidez toda. 

ATS® é isso, é a criação da Carolena. Claro, com  muita referência da sua professora, Masha Archer e, indiretamente, pela Jamila Salimpour. Mas foi um processo "acumulativo e hereditário" que uma hora tomou forma com a sensibilidade e sagacidade de Carolena que viabilizou todo aquele processo que a dança tribal estava tendo desde suas " antecessoras". Resumindamente, podemos dizer que Jamila foi o estopim do processo. Masha o divisor de águas; e Carolena quem deu forma a isso tudo, com regras bem estruturadas. Apesar do mundo todo, descender da veia do “tribal”, ou o "tronco maior" dessa árvore ser proveniente do ATS®/Carolena, vejo que os EUA possui um tribal não só ligado ao ATS®, mas também ao trabalho das Salimpours. Elas não deixam de fazer parte do Tribal Norte Americano. Ou seja, o tribal dos EUA possui o ATS® (base). Essa base possui resquícios do trabalho da Jamila e Masha, sendo Carolena,a grande visonária, criando a dança que conhecemos como ATS®, a partir dos processos anteriores, mas com seu "toque especial". Contudo, nos EUA, há uma fusão da base com uma das gerações que a antecedeu (Salimpours, Jonh Compton, Katarina Burda). No resto do mundo, acredito que o tribal venha somente da veia da Carolena, do ATS®, pois não tivemos e nem temos contato com toda essa cultura que o berço do tribal sofreu desde a década de 60.


Eu gosto deste vídeo. Ele mostra a essência da dança tribal, e entendemos um pouco que Jamila foi a progenitora de tudo isso. Muita coisa que assistimos neste vídeo nos lembra arquétipos trabalhados por bailarinas de ATS®, ITS ou tribal fusion. Esse é o cenário do berço do tribal; tribal nascido sob a óptica e licença artística norte-americana


Agora, eu não sei dizer ao certo se para ser Tribal Fusion tem que ter passos de ATS®. É muito complicado esse ponto. Como eu disse, teoricamente seria, mas não é isso que vemos na prática. Existem muitas bailarinas que quase não usam...e ai? Ignoramos ? E quando tais bailarinas são famosonas?  

Eu vejo que existem bailarinas que misturam passos "puros" de ATS®; bailarinas que usam passos de ATS® modificados; bailarinas que usam, em grupo, os desenhos , disposição de palco,etc baseando-se no ATS®; mas vejo bailarinas que não fazem nada disso e emanam a tal força ou atitude do tribal. Eu acho que muito dessas bailarinas que não usam tanto os passos do ATS®, pelo menos alguma vez, tiveram contato com o estilo ou fizeram aulas do mesmo. Acredito que para o fusion, o ATS® seja uma espécie de “parâmetro”, de “guia”. Ou seja, quanto mais próximo desse "guia" você  se manter, seja estudando os passo (tendo aulas, fazendo workshops,etc) ou de fato desenvolvê-lo em coreografias,improvisações, mais próximo do Tribal Fusion vindo do ATS® as bailarinas estarão. Acredito que estudar o estilo é importante para você adiquirir a" filosofia" das bailarinas de tribal fusion ,cuja força e ousadia acaba transparecendo, mesmo você não usando o ATS® , pois sua filosofia torna-se viva intrínsicamente em cada batimento da sua dança. Um exemplo de tudo isso são bailarinas, principalmente as norte- americanas, que denominam sua dança como fusion bellydance, um bom exemplo disso é a Anasma. Ela não usa passos de ATS®, ela utiliza o repertório do hip hop para fusionar com a dança do ventre. Mas sim, ela já estudou com diversos ícones da dança tribal e , portanto, o feeling, o impacto, a essência da sua dança possui "algo de tribal" intrínseco.

Achei interessante uma colocação sobre Masha Archer, sobre estética da dança que ela criou (é interessante ler todo o contexto):

"Se a postura e atitude correta é obtida, então a dança tem uma forte base física e artística. Cada movimento descreve uma linha e uma forma e quando o desempenho é bom, se torna reconhecível para o público como o que agora é chamado de ATS. Cada forma de dança tem a sua própria estética reconhecível."*
(http://www.gypsytrailtribaldance.com/newsletter3.html

Quando se estuda o Fusion vindo do Tribal/ATS®, a fusão torna-se diferente, pois os objetivos tornam-se diferentes do que uma fusão do ventre, em que a bailarina nunca teve contato com esse novo conceito. A dança não tem o mesmo impacto, não tem o mesmo hipnotizar, não é tão intensa e densa como uma fusão tribal. Tribal fusion enraízado no ATS®. ATS® este que derivou de vários processos políticos, sociais e culturais que aconteceram no mundo, sobretudo na Califórnia. Entender Tribal é entender tudo isso. Não é algo linear e sistemático. Nunca foi. Entender Tribal é visualizar esse emaranhado da sua História acontecendo e servindo como caminho para a criação que estaria porvir.



Entre minhas andanças, encontrei esse comentário da Rachel Brice no blog da Asharah (último comentário):


"Artigo maravilhoso! Formato de Jamila é inegavelmente o idioma raiz do ATS, lindo e surpreendente em sua originalidade e organização. Gostaria de acrescentar que dialetos diferentes podem ser tão coesa e poderosa como o original. Por exemplo, além da postura e traje de Masha mudou o olhar, sentir e toda intenção da forma, enfatizando uma mentalidade de tribo e apoio total, incansável para o outro. A organização de Carolena dos movimentos (levemente alteradas através da tradição oral) nos deu a incrível invenção da improvisação de grupo na dança do ventre. Tudo começou com Jamila, e muitas outras mulheres brilhantes e criativas contribuíram para a idéia original, enriquecendo e animando o formato. Obrigado novamente por seu post muito bem escrito!" *

*Traduções informais da autora

 - Para entender o contexto desse texto, leia os posts anteriores:


 - Este texto dialoga com o texto da Natália Espinosa, em seu blog, no sentindo de fortalecer a idéia do Tribal Fusion:


- O Blog Nossa Tribo & Nossa Dança está realizando o projeto "Pilares do Tribal", contando sobre os três principais pilares do Tribal: Jamila Salimpour, Masha Archer e Carolena Nericcio. Vale a pena conferir!


- Para aprofundamento sobre o assunto, sugiro os blogs  abaixo:

- Divagações Tribais e Afins, de Mariana Quadros (SP);
- ATS e ITS, de Aline Muhana (RJ);
- Tribal Mind, de Ana Harff (ARG/BRA);
- Opinião Alternativa, de Nadja El Balady (RJ)
- Blog Campo das Tribos, de Rebeca Piñeiro e colaboradores (SP)
- Tribalices, de Natália Espinosa (SP)  

Reciclando o repertório na dança tribal

por Aerith Asgard

Olá pessoal!

Já faz um tempinho que não posto por aqui, não é mesmo? =)



Hoje trago um assunto para refletirmos um pouco sobre a cena tribal brasileira. Não quero criar confusões e sim levantar um questionamento como crítica construtiva.

Esse não é o primeiro post que falo algo sobre os eventos brasileiros(leia o outro post , clicando aqui!). Sobre a falta de reciclagem dos shows de galas. Não desmereço nenhum trabalho; considero todos profissionais e merecedores de estarem no gala mostrando sua arte. Porém, a realidade é que estamos tendo, todo ano, as mesmas pessoas dançando. Muda o nome do evento, mas não muda a cara, pois o conteúdo é o mesmo. Isso vem acontecendo com mais frequência de uns 4 anos para cá.  Acho que só tem dois ou três eventos que realmente variam o repertório, renovando as energias. Eu acho um pouco cansativo e saturado para um show, pois cai na mesmice, tornando-se previsível. Eu gosto de ver novidades, novos rostos, novos ares, novas propostas =D Acho isso saudável e enriquecedor para um espetáculo!

Enfim.

Eu acho que os eventos deveriam abrir mais suas portas. Para quê existem as mostras? Apenas para lucrar? Ou para divulgar os trabalhos realizados naquela região ou em  todo país(dependendo da proporção do evento)? Usemos as mostras como um caça-talentos! Como uma oportunidade para tais bailarino/as mostrarem todo seu potencial e o quão são  "capacitados" para participarem do Gala em uma próxima edição. Promova novas estrelas! Como é recompensador a um  produtor de eventos ter participado da divulgação daquele(a) bailarino(a), colaborando para que mais pessoas o conheça e também apreciem sua dança!Com certeza tal artista nunca se esquecerá de tal apoio. =)

Vejo em eventos internacionais que as mostras são realmente um mostruário e que seus produtores, mesmo não assistindo na hora, tem acesso as gravações de vídeos  e possuem o feedback do público sobre os bailarinos que se destacaram neste tipo de show. Muitos bailarinos,  após terem dançados no open stage/showcase do evento , são convidados para o show principal, tornando-se conhecidos no universo tribal.


Acho que seria bacana essa relação, em que a mostra seria uma oportunidade para o Gala, como uma extensão, dando idéia de continuidade e não de segregação. Os produtores devem atentar-se aos anseios de seu público. Não digo como uma voz  única. Eu estou aqui dizendo o que venho ouvindo de muita gente chateada ou insatisfeita. Muita gente que já falou que não vai mais dançar na mostra porque não vale a pena =(  E muita gente que é super talentoso(a) e merecia estar lá também abrilhantando o espetáculo. Consequentemente, o lucro também cai, pois tais pessoas buscarão por novas possibilidades.

OBS: Esse texto não se refere apenas à solistas, mas a grupos também.



Alguns exemplos de mostras de dança servindo como porta de entrada para artistas:




Bex (UK):


Alexis Southall (UK):




Bela Saffe (BRA):


Asharah (USA):



Bailarinas do mesmo ventre



Avisos:

1-O texto é muito grande, com 6 páginas no Word, então leia se você realmente tiver tempo e interesse pelo assunto.

2- Eu não dividi o texto em partes porque a pessoa pode não ler as demais partes, por isso, se preferir, divida a leitura conforme o seu ritmo ou entusiasmo pela mesma =)

3- Essa é a minha opinião e não a verdade absoluta, eu estou aberta a diferentes perspectivas e,sim, posso mudar de opinião caso eu veja que o embasamento apresentado é coerente. Mas,por favor, vamos manter a cordialidade e uma discussão saudável, no intuito de aprendermos e nos completarmos uns com os outros .

Esse texto foi  escrito em função da seguinte  indagação da bailarina Natália Espinosa:  “O quê é o Tribal Fusion?”

 
Falar sobre o que é o Tribal Fusion requer sair da "zona de conforto", sem indagações e contestações, para colocar nossas mentes para refletir e tentar raciocinar diante do tema, que não é tão simples assim, principalmente no Brasil. Primeiro, porque não moramos nos Estados Unidos, particularmente, na Califórnia, que foi o berço da dança. Conhecer o local, entrar em contato com sua cultura e “respirar o mesmo ar” é importante para começar a entender todo esse processo. Há de se pensar também no processo  histórico, político, sócio-cultural para entender tudo isso. Ou seja, é bem mais complicado para entendermos  do que as norte-americanas. Talvez, isso esteja na mesma proporção delas entenderem o samba e todo o processo que este também possui na nossa cultura. Segundo, como já dito anteriormente, a dança entrou faltando peças, aqui no Brasil. Faltou explicarem sobre o ATS® e que este era a base do Tribal Fusion. Ou seja, faltou uma parte bem grande a ser explicada. Quando conseguiram encaixar essa peça na cena, a dança já estava enraizada e, com ela, seus vícios, suas disfunções e carências. Mas houveram bailarinas engajadas em recuperar tudo isso e reconstruir  tudo isso. A dança tribal ainda é recente no país e , por mais que o acesso as informações e professores tenha sido aumentada, a comunidade de dança do ventre ainda não entende o que é o Tribal. Tudo isso eu já disse em um post anterior, que você pode ler aqui, caso tenha interesse.

Na minha opinião, o Tribal Fusion faz parte do grupo de danças do ventre. Danças essa que não é só a dança do ventre com “glamour” ocidentalizada que estamos acostumados a ver em cima dos palcos. Pensar em Tribal Fusion é  pensar no que é a própria Dança do Ventre. É tentar sistematizar as idéias para que essas tenham coerência entre si.  De forma bem simples(resumida), conhecemos a Dança do Ventre:


  • Tradicional -libanesa, egípcia,etc; 
  • Clássica - bases no ballet clássico, como giros, postura elegante, meia-ponta,etc;
  •  Moderna  tem um visual mais flexível,músicas mais parecidas com ocidentais mantendo-se os ritmos árabes,etc;
  •  Folclore Árabe - Ghawazee, Khaleege, Hagalla,Fellahi,Núbia,etc;
  •  Fusão - fusão da base de passos da dança do ventre com outras danças, como indiana, flamenca, africana,etc. 



Todos esse conjunto de dança faz parte das danças “do ventre”. Claro, muitas delas fazem referência à dança ligado originalmente ao arquétipo feminino, à celebrações cotidianas ou estacionais das diferentes épocas do ano, da fertilidade, gestação e maternidade. Essas danças tem em comum muito gingado ,movimentos acentuados nos quadris, ondulações e vibrações abdominais. Sim, existem as danças árabes que são masculinas, mas estamos entrando apenas no mundo feminino, pois é o enfoque em questão. 

As danças folclóricas árabes são de diferentes lugares do Oriente Médio( “um termo que se refere a uma área geográfica à volta das partes leste e sul do mar Mediterrâneo. É um território que se estende desde o leste do Mediterrâneo até ao golfo Pérsico.” ) e Norte da África. Eu aprendi que estudar dança do ventre requer deixar a preguiça de lado e olhar todo o contexto em si. Então, para nos situarmos, temos que procurar um mapa geográfico e visualizar os países que fazem parte do:

·         Oriente Médio (Afeganistão, Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Chipre, Egito,Emirados ÁrabesUnidos,Lémen,Israel,Irã,Iraque,Jordânia,Kuwat,Líbano,Líbia,Omã,Palestina,Qatar,Síria,Sudão e Turquia);

·         Norte da África(Egito, Líbia,Sudão, Argélia, Marrocos e Tunísia).

Ouled Nail
A partir daí,temos que conectar às danças folclóricas que conhecemos.Por exemplo, o Hagalla é uma dança beduína, encontrada no Egito e Líbia.Dança Núbia é originária da Núbia, região entre o  Egito e Sudão ao longo do Rio Nilo.Fellahi é no Egito, uma dança de agricultores. Khaleege é uma dança do Golfo Pérsico( Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Quatar, Bahrein , Kuwait, Iraque, e Irã.). As ghawazee são denominadas ciganas egípcias que,provavelmente, imigraram do Norte da Índia. Na Argélia temos as Ouled Nail. Enfim, essas são algumas danças típicas e suas regiões de origem.

Agora vamos nos voltar para a dança tribal. Sabemos que o Tribal tem três principais bailarinas que participaram do seu desenvolvimento: Jamila Salimpour, Masha Archer e Carolena Nericcio. A partir disso, podemos pensar em cada uma delas separadamente para depois juntá-las.

Pensei primeiro: “O quê é Jamila Salimpour?” Quais suas inspirações, influências? Como foi criado o Bal Anat? Eu não vou desenvolver tudo isso, pois isso daria outro enorme post. Então, de uma forma sucinta vou tentar colocar as respostas e esquematizar aqui. 

1)Anteriormente, Jamila foi dona de uma casa noturna, Bagdad Cabaret, no Broadway. E isso é um fator importante no contexto da dança tribal por dois motivos, na minha opinião: 


  • por ela ter estado em contato com diferentes bailarinas do Oriente Médio, conhecendo diferentes passos e catalogando os movimentos, criando um rico repertório de passos; 

  • para a construção de uma dança de entretenimento, uma dança performática.
Bal Anat

 
2)Na década de  60, o Bal Anat nasceu no contexto do Renaissance Faire, sendo um grupo bem circense, devido a sua bagagem como acrobata, havendo  apresentações acrobáticas, show de mágica, música ao vivo e representação de  fusão com danças  folclóricas do Egito, Marrocos, Argélia e Turquia de forma teatral e através de licença criativa/poética alteravam tais danças, ao introduzir alguns movimentos modernos, porém,  de forma a aparentar que eram representativos  ao arquétipo antigo para o público.Logo, a primeira geração tribal nasceu da fusão entre  as danças folclóricas de tais regiões. O figurino do Bal Anat era baseado no Norte de África e do Mediterrâneo Oriental, assuit escuros, uso de máscaras, cobras e espada(sim, Jamila também foi a criadora da dança com a espada e com a cobra na dança do ventre). Assim, este tipo de tribal é chamado como Tribal Folclórico, termo que John Compton utilizava para descrever seu próprio grupo, Hahbi ' Ru, que é uma linha bem forte do Bal Anat.
 
Hahbi ' Ru

Nosso segundo pilar foi Masha Archer,aluna de Jamila e professora de Carolena Nericcio. Masha tinha uma óptica diferente da dança do ventre, ela queria valorizá-la, trazendo-a para cima dos palcos, tirando-a da marginalidade que ela vinha sendo tratada em bares e restaurantes. Masha formou, nos anos 70, o San Francisco Classic Dance Troupe, cujo estilo era denominado “Tribal Art Nouveau”, pois ela utilizava figurinos em tons pastéis, joalherias pesadas de tribos e peças antigas tanto do Oriente Médio quanto da Europa, fazendo alusão a Arte Européia;além do uso de outras músicas além das tradicionais folclóricas, mas músicas clássicas e óperas, o que compunha todo uma visão de uma dança que lembrasse pinturas européia.

San Francisco Classic Dance e Masha Archer(à direita)

O terceiro pilar e o fomentador do estilo Tribal, é Carolena Nericcio. No final da década de 80, ela cria o seu grupo, o FatChance BellyDance(FCBD). Carolena teve muita bagagem herdada por Masha, mas a distribuição das bailarinas no palco teve influência de Jamila: forma de coro em meia-lua, havendo momentos de destaque entre um pequeno grupo de duas ou três bailarinas que depois retornavam ao coro principal. No figurino há o uso de calças bufantes, xales,cholis ,sutiã de moedas e uso de adornos étnicos e flores e muitas jóias étnicas.  Ao figurino foi acrescentado turbantes, saia rodada, bindis e cinturões com pom-pons, além de ser um figurino mais sério, com  mais uso do preto e cores vivas.Carolena resgata as raízes folclóricas  do Norte da África e do Oriente Médio, acrescentando a postura , projeção do tórax, braços e alguns passos da dança flamenca, e o Kathak, dança do Norte da Índia, também foi acrescentando, através de giros e outros movimentos  adaptados deste. Assim, houve a formatação dos passos mais utilizados a partir da necessidade de apresentá-lo em diferentes espaços(pequenos ou muito grandes), por meio da improvisação coordenada.

OBS:Lembrando que o ATS® não é a fusão aleatória da dança do ventre, indiana e flamenca! É uma dança formatada, que possui características próprias e independentes das danças anteriores mas que usou recursos das mesmas para criar sua própria identidade. Eu não vou me alongar nesse ponto, pois já dei a minha opinião sobre isso nos textos anteriores, quem se interessar, leia aqui.

Carolena Nericcio
 
Nesses três exemplos vemos o uso do termo “estilo tribal americano”. O termo “estilo tribal” pela tentativa de representar tribos e seus arquétipos de antiguidade. Contudo esse estilo não era genuíno, não era verdadeiramente étnico, pois eles não representavam fielmente seus folclores, modificando passos e figurinos; o termo “americano” é empregado para esclarecer que é uma adaptação americana, ou sob a óptica, “sensibilidade” dos norte-americanos em recriar aquele folclore e trazê-lo para nossa atualidade/realidade. Os americanos são muito performáticos, sempre elevando a arte em proporções de espetáculos e isso pode ter sido visto desde Jamila e seu show circense, visando a diversão e o entretenimento dos espectadores de forma impactante, inusitada e hipnotizante, através de uma série de atos entre  dança, malabarismos e magia. Esse lado circense é muito característico até hoje no Tribal Americano.

 
De uma forma bem simples, poderia ser um “Neo-folclore” se esse termo fosse permitido, mas deixo claro que o emprego dele é incorreto, estou utilizando apenas para ilustrar este processo, porque folclore se trata de tradição, e isso é consolidado também através do tempo, passados através de gerações.

Bom, agora depois de traçar todo esse panorama sobre nossa dança, eu vou dar o meu ponto de vista. 

Na minha opinião a dança tribal é um tipo de dança do ventre. Não a dança do ventre que conhecemos,mas sim uma dança do ventre “modificada”. Vou dar um exemplo bem simples: médico x médico veterinário. Ambos são médicos, porém, um é de humanos e outro de animais. Geralmente o médico tem mais prestígio que um médico veterinário(= dança do ventre é mais famosa que a dança tribal). Contudo, o veterinário estuda não apenas  a base da medicina comum as duas, mas outras espécies de animais(= estuda diferentes fusões, como dança indiana, flamenca, street dance, etc), ele tem outras áreas de atuação além da clínica e laboratório, mas atua no campo, tecnologia de alimentos,etc . Eu vejo a mesma coisa com relação ao caso Dança do Ventre X Dança Tribal.

Outro ponto a demonstrar que o tribal é uma dança do ventre é que esta veio de bailarinas do ventre. Percebe-se que a  maioria das bailarinas que já tem a base de dança do ventre consegue aprender o tribal sozinho( e esse foi o processo inicial que aconteceu no Brasil quando a informação ainda era escassa. Não vamos esquecer do processo que a dança se desenvolveu por aqui).  Fazendo um parênteses:eu não estou dizendo que é para todo mundo deixar de fazer aulas de tribal porque você pode aprender sozinho. Não é essa a questão. Isso foi dado a “circunstâncias de sobrevivência” e adaptação de um estilo! As bailarinas tinham que se virar com as únicas informações escassas que conseguiam ter acesso para estudar. E logo depois tivemos o início de workshops internacionais que foram alicerçando melhor o estudo das bailarinas nacionais.  Então, voltando ao assunto,imagine pegar uma bailarina que só dançou dança flamenca ou só dança indiana e nunca fez dança do ventre. Será que elas teriam a mesma facilidade que as bailarinas de dança do ventre? Eu acredito que não,apenas dominariam aquilo que diz respeito a sua dança, portanto, elas teriam que aprender os movimentos básicos da dança do ventre, como maias, shimmies etc, pois a maior base do tribal veio da dança do ventre. Imagine a dança tribal como uma árvore genealógica, quando vamos olhando as gerações vemos que o “ sangue da dança do ventre” é o que mais se mantém. O cruzamento da dança do ventre com outras danças étnicas se deu com mais força a partir da Carolena Nericcio e sua trupe.


 Além disso, além da base de movimentação ser principalmente de dança do ventre, vemos os ritmos árabes sendo trabalhados com o uso de snujs e derbakes, eu nunca vi , por exemplo, o uso de percussão indiana nas apresentações de Tribal. O uso de elementos cênicos utilizados por bailarinas do ventre, como véus, cestos, jarros e espadas. As bailarinas de tribal no exterior sempre participam de eventos de dança do ventre e não somente os especializados na fusão tribal. Todas as bailarinas famosas, assim como grupos  utilizam o termo “bellydance”: FatChance BellyDance, Black Sheep BellyDance, WildCard BellyDance,etc


A dança tribal é étnica contemporânea  no sentido de remeter às tribos,seus folclores e culturas, mas contemporâneo por ser atual e fusionar com danças modernas, como o street dance e a dança contemporânea, por exemplo, misturando músicas eletrônicas, rock, metal,etc; usar figurinos mais leves, sem tantos adornos, ou que valorizem o corpo e a execução de seus movimentos. Eu não gosto muito de usar esse termo, ainda não me sinto confortável o suficiente por ter receio dele ser usado erroneamente( e já vi muitos equívocos e por isso estou comentando), de achar que a base da dança tribal é a dança contemporânea. Essa é um conceito equivocado! Todo o processo da dança tribal veio com a dança do ventre. A dança contemporânea foi introduzida depois, com bailarinas como Tjarda e Heather Stants, por exemplo. Nesses últimos 3 anos é que ela vem ganhando mais enfoque dentro da comunidade Tribal. 


Quando penso nos principais ícones do Tribal Fusion(apenas citarei a Rachel Brice e Zoe Jakes para não me estender ainda mais nesse post) vejo que as duas convergem em suas ideologias,mas usam as bases do tribal de forma diferente. Rachel tem muita influência do estilo Bal Anat, de Carolena Nericcio e Masha Archer; mesmo nunca ter tido aulas ou contato com esta, sinto muito a força de Masha em Rachel, que sempre usa um estilo mais vintage  e a Art Nouveau em suas danças, isso foi muito bem visto no The Indigo e agora no Datura vemos as três linhagens bem características em sua dança. Eu acho que ela consegue passar um pouco das três bailarinas bases da Dança Tribal. Vejo Rachel usar a dança de forma ritualística,mas lembrando muito a cultura do Oriente Médio e suas mulheres, a força que um grupo feminino pode causar ao dançar juntas. No caso da Zoe eu sinto essa mistura meio diferente. A Zoe é muito mais performática e teatral na minha opinião, talvez seja toda a bagagem que ela vem tendo ao longo dos grupos de dança e musicais que fez parte. Zoe primeiramente fez parte do grupo Aywah de Katarina Burda, que estudou com Jamila e fez parte do Bal Anat;lembrando que a Zoe já fez parte do Suhaila Dance Company em 2001;também saiu em turnê com The Yard Dogs Road Show que tinha várias performances variadas desde tribal fusion quanto burlesco e afins. Na questão tribal dela, vejo muito o uso da raiz indiana que é a fusão que ela mais utiliza movimentos e aparenta gostar de interpretar seu cerne ritualístico.


No Brasil ainda não nos identificamos como bailarinas do  ventre e nem as bailarinas de dança do ventre nos reconhecem como tal. Talvez pela forma que a dança entrou, como poucas informações, havendo “seqüelas” para comunidade de dança do ventre que ainda vê a Dança Tribal como algo estranho. Talvez para dar destaque e status, permitindo que seja uma dança independente e não vinculada à Dança do Ventre. Talvez por preconceito de ser uma dança alternativa, com muitas pessoas tatuadas, com piercings, cabelos coloridos que podem chocar um público acostumado com bailarinas padronizadas. Enfim.

 
A dança tribal, na minha opinião, é uma dança do ventre principalmente no sentido original da palavra, por ser uma dança feminina, ritualística, de valorização do corpo feminino, do parto, da maternidade e fertilidade. Por ser uma dança cujo ventre é o alicerce de toda dança. E sinceramente, essa rusticidade e sua ancestralidade, a força que ela emana vêm da forte consangüinidade entre suas principais danças que as compõem: indiana, dança do ventre e flamenca. Onde as três convergem em sua linha genética? As três tem a dança cigana como seu ascendente. E acho que isso é determinante para que o Tribal tenha nascido com esse espírito cigano, livre, indomável,ousado,sensual,alegre e festivo, cujas mulheres dançam entre si, resgatando sua feminilidade e ancestralidade nos dias atuais. Talvez essa seja a essência, a magia, o espírito da dança que precisamos alimentar nosso corpo nos dias de hoje, que sempre oxidam com o estilo de vida criado pelo homem industrializado, computadorizado e robotizado em sua rotina cotidiana.

 

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