por Mari Garavelo
Sejam muito bem-vindas e muito bem-vindos à coluna Old is Cool! Nesta coluna estamos fazendo pequenas análises sobre o período de vanguarda do estilo tribal de dança do ventre e este é o episódio final da primeira análise: o que é o tribal old school e porque é importante entender esse recorte nos dias atuais?
Esta minha pesquisa nasceu com a minha vontade de entender o pensamento das bailarinas e o motivo por trás das criações responsáveis por me fazer apaixonar pelo estilo tribal. Esta vontade foi evoluindo para uma pesquisa amadora, que depois evoluiu para conteúdo teórico imprescindível nas minhas aulas e por fim evoluiu para um convite feito pela Lailah Garbero (MG) para palestrar sobre o tema em seu simpósio on-line. Naquele momento percebi que de alguma forma essa pesquisa estava surtindo efeito e eu talvez tivesse finalmente encontrado a resposta que eu tanto buscava; lembrando que esta é minha pesquisa, meu olhar, minha conclusão e eu quero compartilhar com você aqui nesta coluna.
No nosso último encontro falei um pouco sobre como os anos 2000 com sua estética, expectativas sobre a tecnologia e a cultura pop podem ter influenciado fortemente a forma como o estilo tribal foi desenvolvido. Certamente a geopolítica, o liberalismo e a forma como os estadunidenses construíram sua história e trato com os outros países (especialmente os do oriente) também são imprescindíveis nesta análise. Sempre existe um contexto histórico que serve de base para os pensamentos e comportamentos de uma época.
Eu tenho dito nos últimos anos que o período considerado old school pode ser um dos caminhos para entender a dança hoje. Quando comecei a me aprofundar nos estudos sobre essa tema, cheguei a uma conclusão um tanto ortodoxa de que se a dança feita hoje parece muito distante da que era feita nos anos 2000, então já não se configurava mais como Tribal Fusion. Cheguei a compreender o estilo tribal como algo que só era possível naquela determinada época e circunstância e qualquer coisa feita neste momento, com outras características, já não seria a mesma linguagem de dança. Contudo, se hoje compreendo que o cabelo da Rachel Brice é inspirado em Star Wars, posso seguramente me inspirar no cabelo de um personagem de X-Men. Assim como percebo o apreço de Mardi Love pela joalheira original e antiga, me permito ousar também em minhas preferências, como, por exemplo, usar em minha caracterização um bracelete que pertenceu à minha avó, pela qual tenho muito apreço, além das referências estéticas 'étnicas'. Se compreendo hoje que uma trilha sonora de filme pode ter inspirado Frederique a dançar, posso me inspirar também pelo som do mar e dançar. E digo mais! Ao compreender minha realidade enquanto brasileira e aqui residente, não há qualquer necessidade de dançar com figurino de veludo ou mangas compridas em pleno verão.
Ainda que o agora pareça visualmente distante do Tribal que foi produzido nos anos 2000, a forma de produzir, ou o método, pode ser a mesma. Estudar o old school não requer que façamos uma caricatura, uma reprodução dessa época. O que o aprofundamento nos permite é saborear a experimentação que continha o Tribal naquele momento.
É, inclusive, essa essência que evoca a constante evolução do estilo, como se já estivesse impressa ou incorporada na linguagem do Tribal essa necessidade de experimentar e expressar a partir de nós mesmas e de nossas próprias referências. Se olharmos para trás e observarmos as numerosas subdivisões que ganhou o Tribal nos últimos quinze anos, é possível perceber essa necessidade de experimentação e adaptação. Interpretar desta forma o momento de vanguarda do estilo é valer-se de grande inspiração para experimentar, fusionar e estabelecer trocas.
Captar o sabor da liberdade para experimentação que permeou os anos 2000 neste panorama me trouxe uma melhor compreensão acerca do Tribal. A maioria das pessoas que conheci através da dança, especialmente as que vieram da dança do ventre “tradicional” para o estilo tribal, buscam certa flexibilidade diante de determinadas tradições e maior liberdade para criar a partir das próprias referências. Assim, podemos afirmar que o tribal old school pode nos servir como motivação para seguir esse caminho ao invés de engessar ou estacionar a nossa criação.
Resta-me um pensamento sobre o nome dado a esta linguagem para além das discussões sobre as problemáticas que envolvem o termo tribal fusion: este nome tão intrincado ao período de vanguarda ainda consegue abarcar todas as novas criações? Faz sentido utilizá-lo ainda? Por enquanto, a partir do meu olhar pessoal, minha resposta é que não faz tanta diferença efetivamente. A dança feita pelas ghawazee (entre outros grupos) no século XIX, conhecida popularmente em seus locais de origem como raqs el sharqi (do árab, “dança do leste”) ganhou a alcunha de danse du ventre pelos invasores franceses e, posteriormente, bellydance nos Estados Unidos, nome pelo qual é mundialmente conhecida a dança do ventre hoje. Este nome definitivamente não me soa ideal para uma dança com tantas especificidades culturais diversas e movimentos por todo o corpo, no entanto, é um nome já amplamente divulgado e reconhecido, assim como o nome tribal, também não ideal e carregado de estereótipos, mas igualmente de fácil reconhecimento no mundo todo.
Espero que você, leitora ou leitor, ao chegar nesta última parte da análise, possa ter se inspirado e se motivado a continuar experimentando, criando, expressando-se através desta linguagem, essa é a minha mensagem e o caminho que indico a todo mundo para compreender a dança do ventre tribal hoje.
______________________________________________________________________________