Apesar dos meus dois anos de aulas em Porto Alegre, foi como começar do zero. A escola de Jasmin ensinava especificamente dança do ventre Egípcia. Pela primeira vez aprendi os nomes dos movimentos. As aulas eram planejadas e estruturadas em "sessões" de 6 semanas cada. Além das aulas de técnica geral de dança do ventre iniciante/intermediário/avançado, haviam aulas específicas de acessórios (véu, snujs, bengala, melaya leaf). Todo verão havia um grande espetáculo de encerramento com participação de todas as alunas e durante o período de aulas pequenas haflas para quem quisesse se apresentar com coreografias próprias. Também eram promovidos pela escola workshops e festivais com participação de bailarinas convidadas, como o Shimmyfest. Era uma escola dedicada exclusivamente a dança do ventre, e a organização, planejamento e comprometimento com a dança legitimava e elevava esta a um patamar bem mais alto do que a minha limitada experiência tinha me dado no Brasil. Eu fui aluna da escola por mais ou menos dois anos, entre 2002 e 2004.
Apesar de toda a infraestrutura e glamour, ainda assim eu não me apaixonei pela dança do ventre. Aprendi a respeitar a dança, mas continuei sem me identificar muito com a estética, principalmente os solos, que eu nunca tive nem vontade de fazer. As coreografias em grupo eram legais - principalmente os ensaios e as aulas, mas eu nunca tive qualquer vontade de levar a dança do ventre além daquele espaço de lazer que ocupava na minha vida.
Até que numa sexta-feira após a aula, encontrei no vestiário uma colega vestindo uma saia preta longa, se preparando para sair. Fiquei empolgada, pois achei que era uma saia de Flamenco, e perguntei onde ela estava fazendo aulas. Ela me contou que participava de um grupo de ATS, chamado Read My Hips, e que ela estava saindo da aula para uma apresentação num local próximo da escola. Eu achei interessante, pois já tinha ouvido o nome Tribal em outras conversas e como não tinha nenhum outro compromisso, fui assistir.
Nossa, e pensar que foi tão por acaso que isso aconteceu. Fiquei completamente e constrangedoramente apaixonada. Até hoje me sinto meio constrangida com o meu comportamento totalmente stalker durante o evento. Tirei milhares de fotos, e como era um local aberto, o grupo ia fazendo pequenas improvisações em vários ambientes - e eu ia seguindo. Pela primeira vez eu vi uma dança que não só me inspirava visualmente, mas me dava uma vontade louca de participar. Algo do qual eu queria fazer parte, mesmo ali, na apresentação em público.
Criei coragem para me aproximar, puxei papo, peguei um cartão com as informações da aula e aguardei ansiosamente até a terça-feira, único dia da semana que tinha aula para iniciantes.
Cheguei na aula com meu cinto barulhento de dança do ventre, a sala estava lotada. A professora, diretora do grupo Read My Hips, Stephanie Barto, explicou como a aula funcionaria. Iniciaria com um breve aquecimento, aí dançaríamos uma música de improvisação e escolheríamos um dos movimentos ou combos para trabalhar. Depois na segunda metade, o mesmo com o vocabulário rápido. Para quem era novo por ali, era só ficar no fundo da sala e ir acompanhando da melhor forma possível. Uma loucura.
Além do choque de ter que me adaptar em dois minutos a pedagogia "vire-se", as músicas também eram algo completamente fora da minha experiência. A relação dos movimentos com a música era muito diferente da dança do ventre. Era como ter entrado em outro mundo. De fato, me vi experimentando uma invenção americana, que não tinha nada a ver com o que eu tinha aprendido de dança até então. Foi difícil, mas foi extraordinário. Errei muito mais do que acertei, mas nunca me senti mal por isso. Ouvi pela primeira vez a versão remix de Walk like an Egyptian, e até hoje, 18 anos depois, toda vez que escuto essa música visito aquela sala de aula.
Depois dessa primeira aula, segui assistindo a todas as apresentações do grupo, comecei a pesquisar sobre o estilo, fazia aulas particulares. Continuei na escola de dança do ventre, mas meu coração já não estava mais ali. Só queria saber de ATS, e me perguntei pela primeira vez, por que uma escola de dança do ventre tão renomada quanto era a da Jasmin, não oferecia aulas de tribal.
Descobri por acaso, em conversas de corredor, que a palavra Tribal era proibida por ali. Que como não era dança do ventre, não era ensinada na escola. E ponto. Ao mesmo tempo, nas aulas de ATS, à medida que fui me familiarizando com o repertório, pude reconhecer a similaridade de alguns movimentos com aqueles que eu já conhecia da dança do ventre. Mas a grande maioria dos combos e sequências que faziam parte do repertório do grupo eram influenciados por outras danças, poucas delas folclóricas ou clássicas. Havia um distanciamento intencional da dança do ventre e as influências mais modernas eram estimuladas. Nada era proibido.
O repertório do grupo era vivo. Apesar de existir uma base comum de movimentos de ATS (V.1, V.3 e V.4 FCBD®), que todos aprendíamos no nível básico, novos combos eram criados com frequência pelo grupo principal. Isso não afetava a identidade do grupo enquanto ATS. Criar novos combos e ter identidade própria -ou seja - não passar a vida imitando o Fat Chance era ok. Na verdade, após a formação, a relação das professoras com a Carolena era a de colegas distantes, que tinham total liberdade de espalhar o ATS da melhor forma que pudessem, sem grandes restrições. No Midwest, que é a região central dos Estados Unidos, Stephanie foi responsável por ensinar a grande parte das bailarinas o ATS. Mas essas bailarinas aprendiam tanto aquele repertório básico de ATS (que era bem pequeno) quanto os combos originais do grupo Read My Hips. O interessante dessa época é que era possível identificar numa apresentação de um grupo, pelo repertório e figurino, a sua genealogia: com quem as bailarinas haviam estudado, quais as influências externas que adicionaram tempero para seus combos. A influência da dança do ventre, nessa época, era restrita àquela que havia sido imbuída nos movimentos básicos originais do FCBD®. Já a presença dos gestos e posturas do flamenco é muito mais evidente, principalmente no vocabulário lento: carregado de movimentos aparentemente simples, mas intensos, fortes. A postura, a presença e o domínio do palco pelo grupo se mostra pela sincronia e execução cuidadosa de cada movimento. Muito pouco da dança do ventre tradicional aparece ali.
Em meados de final de 2004, houve uma cisão completa no grupo Read My Hips quando, sem conseguirem entrar em acordo, 5 das bailarinas do grupo principal se desligaram do grupo. Como diretora, Stephanie queria mudanças, incorporar novas técnicas de movimentos e novos membros para o grupo principal. As bailarinas do grupo de estudantes, The Outskirts, que já estavam juntas há mais de dois anos, passaram a integrar o grupo principal. Um novo grupo de estudantes surgiu, The Blue Cat Tribe, do qual passei a fazer parte. Com a saída das integrantes antigas, iniciou uma época de grandes mudanças no Read My Hips.
Em Chicago, o pessoal do Tribal era bem disperso - acho que na dança do ventre também, mas como não vivenciei muito fora da sala de aula, não posso dizer com certeza. Haviam poucos grupos de ATS além do Read My Hips (RMH), que dominava a cena, e era o de maior renome. O grupo era contratado para apresentações pagas em diversos eventos, além de algumas participações sem cachê em eventos comunitários. Mas poucos destes eventos não pagos eram de dança do ventre, e os que participei com o grupo foram fora de Chicago.
Em 2003, quando iniciou a turnê do show do Bellydance Superstars (BDSS) eu pouco tinha ouvido falar sobre tribal fusion. Importante lembrar que as tecnologias e as facilidades de comunicação que experienciamos hoje era outra, principalmente para qualquer movimento artístico underground. A maioria das pessoas não tinha celular, não participava de redes sociais e não tinha blogs (eu tive um nokia 9120 no Brasil em 1997, mas durante todo o período que morei nos estados unidos,de 2001 a 2006, só tive dois amigos que tinham celular). Eu tinha uma página no myspace, sem amigos e sem seguidores; e somente em 2005 entrei na tribe.net. Então para ficar sabendo de notícias do mundo ATS ou tribal só conversando pessoalmente mesmo - ou conversando com gente que conhecia alguém que morava na costa oeste.
Meu círculo começou a falar sobre o assunto das meninas de Tribal que faziam parte do Show do BDSS. Sobre a parte de dança do ventre eu só ouvia muitas críticas, devido às bailarinas terem sido escolhidas pela aparência e não pela competência técnica, etc. (dor de cotovelo, talvez?). Só para entender as conversas eu fui atrás para descobrir o que era Tribal Fusion e como isso seria diferente do que eu já estava aprendendo. Consegui com a Stephanie vários vídeos que ela recebia pelo correio da Heather Stants, diretora do Urban Tribal e ex-membro do RMH. Assistindo esses vídeos, pude começar a compreender por que a Stephanie, mesmo mantendo a estrutura de ATS no grupo RMH, se esforçava em trazer diversas influências e técnicas externas para desenvolver novos combos, o que fazia do grupo um híbrido: "ATS Fusion", por assim dizer, mas sem todo o conflito e crise existencial que vivenciamos hoje. E esse processo estava acontecendo com vários grupos de ATS, uma vez que era muito mais fácil conseguir uma instrutora de fusion para dar um workshop fora de San Francisco, do que viajar até San Francisco para ter aula com a Carolena, que nunca saía de lá. ATS puro só quem fazia era o Fat Chance, mas o ATS híbrido ainda assim era aceito como tal.
O que se seguiu nos próximos dois anos foi uma imersão total. Fui convidada para integrar o grupo principal e, num primeiro momento, recusei. Eu estava bem satisfeita participando das aulas e das pequenas performances do Blue Cat Tribe; a ideia de dançar profissionalmente me parecia muito além da minha capacidade como bailarina. Mas justamente o desafio de ultrapassar meus limites acabou por me estimular a aceitar.
Sabendo que a minha estadia nos EUA era finita, me dediquei quase que exclusivamente para a dança, aproveitando tudo o que eu podia. Fiz workshops de várias danças com o objetivo de melhorar minha técnica e contribuir para o desenvolvimento de novos combos para o grupo. Dancei em eventos e lugares fantásticos, nos quais nunca imaginei entrar.
House of Blues
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Raquy&RMH - 2005 |
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Mixed Arkadesh |
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King Tut Opening - Field Museum 2006 |
Silk Road no hotel Four Seasons
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Silkroad Oasis
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Karsh Kale |
Dancei com música ao vivo espetacular (fotos Brent Roman at old town, Raquy and The Caveman, Karsh Kale), e às vezes nem tanto. Viajei para participar de eventos dedicados ao Tribal Fusion (Fort Launderdale, Portland, e Kansas City). Assisti duas vezes ao show do Bellydance Superstars e uma ao Yarddogs Roadshow com Zoe Jakes. Fiz workshops com grandes nomes do tribal (Jill Parker, Rachel Brice, Heather Stanz, Sharon Kihara, Kami Liddle). Passei por perrengues no palco (snujs e apliques de cabelo voadores, quedas,milhares de erros) e muita farra nos bastidores.
Em 2006, já se aproximando a data do meu retorno ao Brasil, participei da apresentação do grupo no Spirit of Tribes, na Flórida.
Em 2005, sabendo que eu retornaria ao Brasil no ano seguinte, comecei a fazer planos para a volta. Comecei a trabalhar na minha área profissional, e ao mesmo tempo comecei a pesquisar sobre o Tribal no Brasil, para descobrir se eu conseguiria continuar fazendo aulas e dançando quando eu voltasse.
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Head My Hips - Spirit of Tribes (2006) |
Na época, o site do Read My Hips tinha uma das listas de links mais compreensivas sobre tribal, nos Estados Unidos e fora. Para o Brasil havia apenas uma referência, que era a Shaide Halim, de São Paulo. Num vídeo que assisti, ficou bem evidente que o trabalho dela era muito diferente do ATS que eu estava fazendo, começando pelo fato de que era coreografia e não improvisação coordenada. Com essa perspectiva, aos poucos fui me dando conta de que se eu quisesse continuar dançando, eu mesma teria que dar aulas quando voltasse. Mesmo que em outros estados já houvesse gente dançando e estudando tribal fusion, eu deduzi, baseada na experiência do Midwest, que tudo devia ser baseado nos vídeos de tribal fusion da Rachel Brice e do BellyDance Superstars; e que no Rio Grande do Sul não tinha nada. Após duas turnês do BDSS, quase todo o estúdio de dança do ventre tinha alguém dando aula de "Tribal", que nada mais era que dança do ventre com choli de meia arrastão e dreadlock de lã. A Stephanie então me deu diversas orientações e oportunidades para aprender a ensinar ATS. Mas mesmo assim, eu não estava nem de longe preparada para a realidade que encontrei quando voltei ao Brasil.
Acho que deixei bem claro desde o começo desta narrativa, que eu sempre dancei por mim mesma. Eu nunca tive o objetivo de me profissionalizar como bailarina, nem de mudar de carreira. A dança não é minha vida. Se eu me tornei "professora" foi de forma acidental e relutante. Eu amo ser aluna. Sabe aquelas pessoas que não gostam de liderar no ATS? Sou uma delas. Adoro a vida de seguidora. Na minha mente, eu chegaria em Porto Alegre, começaria a dar aulas, montaria um grupo e pronto, reviveria todos os bons momentos dos meus tempos de RMH. Bem fora da realidade essas minhas expectativas.
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Ingressos para o show do Bellydance Superstars (2006) |
Em 2006 me inscrevi no orkut, pois sabia que era muito mais popular com o brasileiros do que o myspace, tribe e facebook. Tinha lá diversas comunidades discutindo Tribal. Já fiquei feliz, pois isso significava que existia Tribal no Brasil. Entrei nas comunidades, mas não me manifestei nas discussões, pois não curto. E também eu estava completamente por fora da realidade das brasileiras, então não tinha cabimento ficar dando pitaco. Mas lembro que fiz contato com uma menina de Santos, que também disse ser difícil encontrar gente para dançar, e informações mais aprofundadas sobre a dança na internet. Era a Mariana Quadros.
No Orkut, descobri um evento que estava programado para outubro em Porto Alegre. O primeiro encontro Tribos do Sul, com workshop de dança tribal com Shaide Halim. Fiquei empolgadíssima e me inscrevi para participar, pois seria minha oportunidade de apresentar meu trabalho, me integrar com todo o pessoal de tribal da minha cidade e fazer contatos e vivermos felizes para sempre. Hehehe, que inocente.
Tive muitas gafes, mas acho que a pior delas foi a de não me dar conta de que eu estaria adentrando um mundo do qual eu não sabia absolutamente nada: não só a cena artística no Rio Grande do Sul, mas a cena da Dança do Ventre. E no RS, assim como na maioria dos estados, o Tribal saiu direto da comunidade da dança do ventre. Muito diferente da minha experiência nos EUA. Infelizmente, para essa incipiente comunidadeTribal migraram não só as bailarinas que se identificavam com a estética do tribal (pois sejamos francas, nesse período só tinha como adotar a estética, pois a técnica era impossível) , mas todas as mazelas, antipatias e facções que fazem parte da comunidade da Dança do Ventre.
Minha participação nesse evento foi ótima, principalmente os contatos durante o workshop da Shaide, que antecedeu o show. Eu aprendi muita coisa, pois era um workshop com técnicas de flamenco e uma coreografia de dança indiana, o que eu sempre gostei de misturar com o ATS que eu conhecia. Inúmeras das bailarinas que participaram do workshop tinham técnica excelente, e pegavam os movimentos muito melhor que eu. Mas no show de encerramento me decepcionei muito: foi a primeira vez que eu dancei um solo sem estar com o Read My Hips ao meu lado, então eu estava muito nervosa. E mesmo assim, sem falsa modéstia, a minha foi a única apresentação Tribal que aconteceu naquela noite. Muitas tentativas de fusão de dança do ventre, algumas ótimas, outras nem tanto. Mas de Tribal não tinha nada, nem mesmo a roupa. Nos bastidores várias pessoas já ficaram pasmas com a minha roupa, depois da apresentação ficou um silêncio antes das palmas, e muita gente veio falar comigo depois. Consegui um lugar para dar aulas ali mesmo. Mas por outro lado, a minha presença expôs claramente o que era Tribal e o que era dança do ventre. E nem todo mundo ficou feliz com isso.
Dali para a frente eu não parei de dar aulas, mas pouco consegui me integrar com as outras bailarinas da região. No primeiro ano não fui convidada a participar de nenhum evento, nem para ministrar workshops. No início várias alunas que me assistiram dançar vieram fazer aula comigo, mas rapidamente desapareceram. Demorei para me dar conta de que por demanda do público algumas escolas de DV já ofereciam aulas de "Tribal", mas como eu não estava vinculada a nenhuma delas, as alunas não podiam fazer aula comigo. E como eu não participava de nenhum evento, permanecia na obscuridade. O que francamente, não fazia muita diferença pra mim, pois o que eu queria mesmo era dançar e montar um grupo. Aquariana que sou, queria desbravar novos mundos, e trazer gente que não era da dança do ventre para fazer Tribal.
Através de amigas em comum, conheci a Muna Zaki, diretora da Escola de Dança do Ventre Harem, e produtora da Feira Harem de Dança do Ventre. Dei aulas na Harem, e me apresentei em vários eventos promovidos pela escola. Em 2008, participei da organização do evento que trouxe a bailarina Ansuya ao Brasil. Foi um grande espetáculo.
A paixão da Muna pela Dança do Ventre é tão grande que até me contagiou um pouco, e eu perdi o ranço com a Dança do Ventre. Em 2008, participei do primeiro Introspetáculo, promovido pela Bruna Gomes. Essas duas pessoas, longe ou perto, são minhas parceiras até hoje.
Durante esse período (2006-2009), que eu chamo de minha 2º fase, o repertório que eu ensinei foi totalmente ATS Read My Hips. Eu sabia que o repertório era em sua maioria único, mas jamais questionei o fato de ser ATS ou não. Apesar de eu manter a estrutura de aula padrão da Stephanie (aquecimento, improv-lento, técnica, improv-rápido, técnica) eu adotava diversas técnicas de tribal fusion, para ensinar movimentos, postura e musicalidade. Mas a improvisação coordenada e a dança em grupo eram o foco.
Triste dizer então que durante todo esse período eu nunca mais dancei em grupo. A coisa que eu menos queria era dançar solo, e era justamente o que eu tinha que fazer. Isso criava uma expectativa errada nas pessoas que me assistiam. Eu dançava sozinha por falta de opção, na esperaça de inspirar alunas para conseguir ensinar os combos para dançarmos em grupo. E as pessoas que me viam dançar na sua maioria queriam aprender a técnica para dançar solos ou aprender coreografias. Um paradoxo que eu não consegui resolver.
Em 2009 eu fui para São Paulo para participar do evento Tribal y Fusion, promovido pela Bele Fusco. Foi incrível. Conheci pessoalmente muita gente com quem eu só tinha falado pelo orkut, vi como o Tribal tinha se desenvolvido pelo Brasil afora, ainda que não fosse nada daquilo que eu tinha experimentado com o Read My Hips.
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Bárbara Kale e Mariana Quadros no Tribal Y Fusion , em 2009. |
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Flyers, cartões e postais adquiridos no Tribal y Fusion (2009) |
ATS ainda era só uma sigla jogada nas conversas, mas ainda sem qualquer representação. Tribal Fusion em todas as suas vertentes, parecia ser o único investimento. Pessoalmente eu só sabia que eu estava cansada de dançar solo. Na época eu já estava grávida de 3 meses, estava me mudando de Porto Alegre para o interior do estado e não tinha mais energia para recomeçar. E sem stress, eu terminei o ano "letivo", me despedi de minhas alunas e fiquei os próximos 4 anos sem dançar.
Esse ano de quarentena, que certamente não foi fácil para ninguém, me lembrou um pouco meu hiato da dança. Da mesma forma que eu não me arrependo de ter parado de dançar antes, também estou em paz comigo mesma por não ter dançado quase nada em 2020. Mais tranquila ainda talvez, pois sei que posso voltar quando eu quiser.
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Formação em ATS com Carolena Nericcion e Megha Gavin no Festival Campo das Tribos, e 2015. |
Em 2014, meio que por acaso, uma amiga de Porto Alegre, professora de dança do Ventre, se mudou para Santa Maria, onde eu estava morando. Ela, muito empreendedora, já me convidou para dar aulas, participar do show que estava promovendo e tal. Eu, me sentindo super bem na minha aposentadoria, dei um monte de desculpas, mas fui assistir ao show. E ali, sentada na platéia, eu senti uma vontade de voltar. Comecei a reativar minhas contas, fazer pesquisas na internet e me deparei com uma outra realidade. ATS bombando, milhares de grupos, escolas exclusivamente dedicadas ao tribal e tudo mais. E ainda mais que isso Carolena Nericcio viria ao Brasil ministrar uma formação em ATS. Que fantástico! Que motivador. Entrei numa lista de espera, e em cima da hora consegui uma vaga para participar.
A participação na formação em 2015 daria um outro texto, mas o mais marcante pra mim foi a experiência de finalmente, depois de nove anos, poder dançar ATS em grupo. Se eu for bem sincera, vou dizer que a melhor parte de participar do Festival Campo das Tribos (atual Congresso Tribal) é ficar dançando em grupo com um monte de gente diferente.
Minha 3ª fase de vida na dança começou após a formação. Foi um recomeço, com mais experiência de vida e sem expectativas ingênuas. Retomei meus contatos, criei novos e consegui, graças a colaboração e apoio de muitas pessoas, criar até um grupo de ATS com minhas alunas, o Trelissa.
Pós quarentena não sei muito bem o que vai acontecer. Não quero me aposentar ainda, mas tampouco sinto uma grande pressão para dar aulas e produzir conteúdo. Como boa bibliotecária, sou excelente disponibilizadora de conteúdos de terceiros, e indico todas essas professoras ótimas que se mobilizaram na quarentena para minhas alunas não se sentirem abandonadas por mim.
Mas eu não danço a distância. O que me conquistou no ATS foi a interação em grupo. Sem isso, a dança pra mim não tem muito sentido, então eu aguardo ansiosamente o retorno das atividades presenciais para encerrar meu período de hibernação.