por Aerith Asgard
Nossa primeira entrevistada do ano é a bailarina carioca, Lucielle Le Fay. Lucielle nos conta sobre sua trajetória na dança tribal, sobre sua visão sobre a dança, seu grupo, conquistas, realizações, projetos para 2018 e muito mais! Bora conhecer mais sobre quem faz parte da nossa cena? Boa leitura. ♡
Minha trajetória na Dança do Ventre/Tribal começou
em meados de 2002. Na época, aos 12 anos, fui seduzida como a maior parte das
adolescentes e pré-adolescentes pela novela “O Clone”. Matriculei-me em uma
turma de Dança do Ventre e me apaixonei perdidamente pelos movimentos e pelo
aspecto místico relacionado à dança que ainda estava em alta naqueles anos no
Rio de Janeiro. O Tribal surgiu cinco anos depois em minha vida quando minha
professora de Dança do Ventre abriu uma turma desse estilo. Rapidamente comecei
a devorar os vídeos da Rachel Brice e da Zoe Jakes no YouTube, além de comprar
DVDs didáticos e iniciar os estudos em Hatha Yoga.
Acredito que a identificação com o Tribal Fusion
ocorreu por causa de aspectos da minha personalidade que se encaixaram com o
estilo. Sou muito analítica e reflexiva nas minhas ações e sempre gostei de
destrinchar minuciosamente cada movimento para compreendê-lo em sua totalidade
e executá-lo com perfeição. Vi que essa prática era bastante pronunciada no
Tribal e me senti “em casa” dançando-o. Além disso, sou muito introspectiva e
não ter que ficar sorrindo o tempo todo durante uma performance é maravilhoso
(rs). É interessante como eu me sinto mais à vontade no Tribal para expressar
facialmente estados de espírito gerados pela execução detalhada e profunda de
cada movimento. É simplesmente incrível.
Todas as professoras me marcaram, cada uma à sua
maneira. Dara el Kanaan, minha primeira professora de Dança do Ventre, era
muito atenciosa com a técnica dos movimentos e nos fazia repeti-los milhares de
vezes até que ficassem limpos. Agradeço muito a ela por me dar o ensinamento da
persistência. Nadja el Balady, com a qual estudei Dança do Ventre e Dança
Tribal, é uma artista de grande visão e abarca em seu corpo a linguagem de
várias danças. Direta ou indiretamente, ela me ensinou a estudar DANÇA e não só
suas subdivisões. Jade el Jabel, com a qual realizei um curso de
aperfeiçoamento profissional, constrói uma relação íntima com a música durante
vários meses até apresentá-la, além de prezar pela qualidade dos movimentos e
não pela quantidade. Com ela aprendi que menos é mais e a me concentrar
nas minhas criações, sem ser atropelada pela correria dos tempos atuais. Liane
de Luna, primeira professora de Flamenco, extremamente emotiva, ensinou-me a
sentir mais a dança e não ficar só fissurada na técnica. Thereza Canário, atual
professora de Flamenco, cheia de energia e vigor em sua dança, ajuda-me a criar
uma performance com a força e a paixão que só a Dança Flamenca sabe expressar.
Só tenho a agradecer a essas mestras e a todas as outras que não citei aqui.
BLOG: Além da dança tribal você já fez ou faz mais
algum tipo de dança? Há quanto tempo?
Fiz Ballet e Jazz na infância e atualmente faço
Flamenco há 4 anos. A busca pelo Flamenco foi motivada pelo estudo do ATS ®, na
expectativa de compreendê-lo melhor no que concerne a forma como a Dança
Indiana, Dança do Ventre e Dança Flamenca estão fusionadas dentro dele.
Minhas primeiras inspirações internacionais – e
acho que da maioria das dançarinas de Tribal – foram a Rachel Brice e a Zoe
Jakes. Ambas trabalharam no sentido de construir um estilo muito próprio e são
incríveis dentro dele: Rachel com um conhecimento absurdo sobre o próprio corpo
e Zoe com uma construção cênica/teatral genial. No Brasil, minha primeira
inspiração foi Mariana Quadros, pois vi em sua dança uma desconstrução do ATS®
extremamente inteligente, além da postura e dos lindos movimentos de
braços.
Atualmente, as dançarinas que me inspiram são
Joline Andrade, Rocío Molina e Heather Stants. São três estilos
completamente diferentes mas que causam em mim aquele estado de espírito
provocado quando você está de frente para uma grande obra de arte. A Joline é
uma grande dançarina e a quantidade de estudo que eu consigo ver em cada
segundo de seus solos me impressiona tanto que inspira a ser tão estudiosa
assim nos meus. Rocío Molina, que está na vanguarda do Flamenco, é uma bailaora
a qual desenvolve espetáculos em volta de uma temática e que vão muito além de
uma única linguagem artística. O foco no processo investigativo durante a
criação de suas obras, o diálogo criado entre música, dança e teatro me fazem
ampliar a visão para pensar arte e não só dança. Já a Heather
traz um estudo de linhas com o corpo pelo espaço e uma simplicidade nos
figurinos que me agradam bastante.
Percussão é algo que me inspira também. Comecei a
estudar derbake há alguns anos para entender melhor a música árabe e agora
inicio meus estudos em cajón, por causa do Flamenco. O uso de música mecânica
foi e é muito importante para que a dança ganhe espaços todavia levou a uma
distanciamento entre essas linguagens que precisa ser reduzido (caso a intenção
da performance seja realmente fazer uma leitura da música). Nesse ponto, o
Flamenco em sua íntima relação com o tempo através de palos que se desenrolam
sobre determinados compassos tem muito a ensinar.
A dança é uma ferramenta de autoconhecimento muito poderosa na minha vida. Quando comecei nunca imaginei que trabalharia com ela.
Minha intenção desde pequena era ser cientista tanto que me graduei em
biologia. Quando terminei a faculdade, em 2014, a sensação de não estar dando o
meu melhor nem para a biologia e nem para a dança, que já era a minha profissão
desde 2008, estava me consumindo e tive que optar por uma delas. Optei pela
dança, não porque já dava aulas há muitos anos, mas porque não consigo viver
sem.
BLOG: O quê você mais aprecia nesta arte?
A dança não precisa de nenhuma extensão corporal (instrumento, pincel, …) para existir. Nem da música. Por muitos anos ouvi que a função dx bailarinx/dançarinx era ler a música com o corpo e hoje, após ter contato com a Dança Contemporânea, entendi que não é bem assim. O corpo basta.
Sem contar a quantidade de caminhos que podemos seguir dentro da dança e as
possibilidades de fusão. Acho interessante como aprender um movimento novo ou
criar um diálogo entre danças traz a possibilidade de expressar algo que até
então não era possível.
BLOG: O que prejudica a dança do ventre e como melhorar
essa situação? Você acha que o tribal está livre disso?
O primeiro ponto é um problema que prejudica a dança como um todo: a preocupação por sobrevivência dentro do meio nos obriga a pensar mais nos meios de produção e lucro do que na dimensão artística do nosso trabalho. O segundo ponto é que muitxs dançarinxs não se reconhecem enquanto profissionais. Logo, a categoria é muito fraca no que concerne à luta política pelas nossas condições de trabalho. Poucxs sabem qual é a legislação que rege a atuação dx dançarinx, quais nossos direitos, qual o papel que a arte desempenha na sociedade…
No caso da Dança do Ventre soma-se a
isso tudo que em pleno século XXI não sabemos lidar bem com sensualidade e
sexualidade, o que leva a muitas visões deturpadas que nós dançarinxs nos
deparamos a cada “olha, você faz dança do ventre, não quer fazer um show
particular para mim?”. Por último, eu acrescentaria o desprestígio que a dança
tem dentro das artes e que as danças orientais tem dentro da dança. O Tribal
não está livre de nenhum desses pontos que apontei. Temos muito trabalho aí
pela frente para mudar isso.
BLOG: Você já sofreu preconceitos na dança do
ventre ou no tribal? Como foi isso?
Dentro deles não, mas durante o meu trabalho sim.
Comecei a lecionar Dança do Ventre aos 18 anos e não era levada muito à serio
por algumas alunas com mais idade que eu. Ao longo das aulas elas observavam
minha postura profissional e passavam a me respeitar como professora. O outro
preconceito, como apontei na pergunta anterior, veio de dentro do meio da
dança, por pessoas que olham a Dança do Ventre como coisa de gente amadora, que
nunca vai chegar a ser o que o Ballet é por exemplo.
Eu me indignei muitas vezes como aluna com minhas colegas de sala que estavam ali só para fazer “terapia” e ter uma distração. Elas achavam que não precisavam se empenhar o que causava um rendimento fraco da turma. Isso me levou a ser bastante autodidata estudando também em casa porque percebia que podia ir além. Infelizmente meus pais não tinham condições de investir tanto dinheiro pagando mais aulas de dança, então tive que me adaptar. Hoje como professora diria que o maior desafio é mediar esse ambiente tão heterogêneo que é a sala de aula, de uma maneira que não desmotive esses alunos que assim como eu querem aprender e não só passar o tempo.
BLOG: E conquistas? Fale um pouco sobre elas.
Poder trabalhar em quatro estúdios de dança do Rio
de Janeiro além das aulas particulares é uma grande conquista para mim,
principalmente porque três deles foram convites que recebi de seus donos, os
quais viram minha atuação no meio. A possibilidade de ter ido ao Egito em 2015
e fazer aulas com uma professora de lá; ter concluído o curso de formação em ATS®
com Carolena Nericcio em 2015, tornando-me Sister Studio FatChanceBellyDance®; e
passar novamente para uma universidade federal (dessa vez para estudar História
da Arte) foram as maiores conquistas dos últimos anos. Além dessas, destacaria
as oficinas de Dança do Vente e de Dança Tribal que ministrei na Semana da
Dança do Sindicato dos Profissionais da Dança do Rio de Janeiro (SPDRJ) durante
três edições do evento, a entrevista que concedi ao canal do YouTube “Papo bom
com gente boa” e ficar em cartaz por um final de semana no Centro Coreográfico
do Rio com o espetáculo Rosas de Andaluzia da academia Sol y Luna Danzas, na
qual trabalho.
BLOG Você foi uma das primeiras bailarinas do Brasil a se envolver com o estilo tribal. Como eram as informações sobre o estilo na época em que você começou a pesquisar? Como era visto a dança tribal naquela época e como hoje ela vem se apresentando na cena brasileira? Na sua opinião, o quê precisa ser melhorado, aperfeiçoado e, até mesmo, mudado no comportamento da(o) tribalista(o) brasileira (o)?
Quando eu comecei a estudar o estilo tribal, em 2007, o YouTube estava se popularizando no Brasil. Grande parte das informações que tínhamos vinham dele, em vídeos de apresentações do Bellydance Superstars e do extinto Tribal Fest (EUA) que naquela época já estava na sétima edição. Como sabemos, YouTube é uma ótima ferramenta para conhecer e não para ensinar. Então ficava aquele burburinho sobre o que era aquela dança hipnotizante que ninguém conseguia definir. Foi quando, nesse mesmo ano, a Sharon Kihara veio para o Brasil ministrar um workshop no II Encontro Bele Fusco, em São Paulo. A vinda dela foi crucial para fomentar a pesquisa e dar uma clareada no que se sabia sobre Tribal. Além desse evento, o Tribes Brasil, organizado pela Jhade Sharif e pela Nadja el Balady no Rio de Janeiro em 2008, foi fundamental para reunir as profissionais de vários estados brasileiros que já tinham uma pesquisa consistente em Tribal. As oficinas oferecidas nesse evento foram muito valiosas para pessoas que, como eu, eram alunas na época.
A outra forma de ter acesso às informações era através de DVDs didáticos que rapidamente copiávamos e repassávamos. Nosso repertório era pequeno, então fazíamos coreografias inteiras com os movimentos ensinados nos DVDs ou reproduzindo os que víamos no YouTube. Nesse sentido, as coisas começaram a mudar quando conhecemos o ATS® e os DVDs do FatChanceBellyDance®. Além de poder criar a partir da desconstrução do ATS®, nós começamos a entender a evolução do Estilo Tribal e a dar mais solidez para o nosso trabalho.
Naquela época, pelo menos no início, a dança tribal era vista como uma “dança do ventre com roupa esquisita” (rs). Um conjunto de movimentos sinuosos executados com uma roupa preta e expressão facial fechada (o famoso “carão”). Felizmente, hoje ela vem se apresentando múltipla e com várias possibilidades de fusão.
Sobre o comportamento dx tribalista brasileirx, eu destacaria uma rixa que surgiu na época que comecei entre a Dança do Ventre e o Tribal. Era comum ouvir comentários depreciativos por praticantes de ambas modalidades sobre a quantidade de glamour e exibicionismo existentes na Dança do Ventre de um lado e sobre a “esquisitice” do Tribal por outro. À nível individual, isso pode até ajudar com que a pessoa decida qual estilo quer estudar, mas numa discussão ampla sobre dança esses julgamentos não levam a nada. Dança do Ventre e Dança Tribal são parentes próximas, e não inimigas. O segundo ponto, válido para qualquer estudante de dança, é: estudem mais. Fazer meia dúzia de aulas não te dá a formação para lecionar Dança Tribal. Há dez anos, com a escassez de material que tínhamos, era até compreensível que pesquisadores com pouco tempo de estudo de Tribal se tornassem professores do estilo, mas hoje não.
BLOG: Como é o cenário da dança tribal do Rio de Janeiro? Pontos positivos, negativos, apoio da cidade/estado, repercussão por parte do público bem como pela comunidade de dança do ventre/tribal?
Crescendo a passos lentos. O Rio de Janeiro é uma cidade muito cara o que atrapalha bastante a realização de eventos. Os teatros cobram aluguéis abusivos, fora os custos de iluminação, som, marketing… O estado não paga em dia seus servidores que dirá investir em show de dança. O Tribal está presente em festivais de Dança do Ventre, em shows de academias e na Convenção Carioca de Dança Tribal e Fusões, cultivando um público ainda pequeno. Infelizmente o cenário econômico do nosso estado não vem ajudando a mudar esse quadro.
BLOG: Conte-nos um pouco sobre suas principais
coreografias. O quê a inspirou para a formulação da parte conceitual e técnica
das mesmas, assim como seus processos de elaboração dos figurinos e maquiagens.
Como essas coreografias repercutiram na cena tribal?
Minhas
principais coreografias, pelo menos os solos, são geralmente inspiradas pelas
minhas deficiências (rs). É importante conhecer a si mesmo e identificar os
movimentos que o seu corpo faz com facilidade para não entrar numa zona de
conforto. Se eu quiser ficar nela vou dançar parada, fazer cambret e movimentos
sinuosos em todos os meus solos (rs). Meu ultimo trabalho, o solo “Estudo 1”,
veio imbuído do conceito de linhas de forma que me desafiasse a explorar meus
pontos fracos: deslocamento, explosão muscular e trabalho de chão. Os figurinos
e maquiagens prezam sempre pela não limitação dos meus movimentos o que me leva
a reduzir cada vez mais a quantidade de acessórios, por exemplo. Ficar
preocupada com um bracelete que pode agarrar ou um arranjo de cabeça que pode
cair num giro são coisas inadmissíveis para mim. Preciso estar inteira e
consciente durante a performance. Por isso venho usando malhas e body chains
largos tanto nos meus solos quanto nas coreografias do meu grupo, a Tribo do
Rio. A repercussão tem sido interessante porque venho recebendo comentários de
profissionais que não são só do meio tribal, mas também do Flamenco e do Contemporâneo.
BLOG: Conte-nos como surgiu a Tribo do
Rio, a etimologia da palavra, seus integrantes, qual estilo marcante
do mesmo e se ele sofreu alguma mudança estrutural ou de estilo desde quando
foi criado.
A Tribo do Rio surgiu como um laboratório de experimentação
dentro da minha turma de alunos intermediários. Optei por esse nome pela sua
simplicidade e eficácia para definir o que somos. "Tribo" é um agrupamento humano
unido por seus costumes e "Rio" identifica que somos do Rio de Janeiro. Somos um
grupo de quatro integrantes (Ananda Botelho, Leonardo Martins, Lucielle
le Fay e Pilar Castro) que faz fusões tribais utilizando o ATS® como base. No
início eu desejava restringir o estilo do grupo ao Tribal Contemporâneo e assim
nasceu nossa primeira coreografia, “Keep your distance". Pouco tempo
depois veio a vontade de aplicar meus conhecimentos sobre Flamenco e assim
nasceu nosso Tribal Flamenco. Percebi que meu trabalho como coreógrafa de grupo
é muito melhor quando atende minhas vontades criativas e não quando se fecha em
um único estilo.
BLOG: O evento Criações, sob sua
direção e produção já possui quatro edições realizadas na cidade do Rio de
Janeiro. Conte-nos o quê a inspirou para a formulação da parte conceitual
e qual é a história por de trás do mesmo? Como foi o processo
de elaboração das coreografias e figurinos, bem como a repercussão
do mesmo.
A inspiração para o Criações foi proporcionar uma oportunidade para que xs alunxs experimentassem a sensação de se apresentar para um público com mais tranquilidade, fora dos grandes eventos de dança. A emoção de uma apresentação só pode ser sentida quando a fazemos. Você pode falar sobre suas experiências no palco, dar dicas, aconselhar, mas no final das contas xs alunxs só aprendem mesmo quando passam por si mesmxs. Minha intenção, então, foi criar um ambiente de carinho e acolhimento para elxs terem sua primeira experiência. O público é composto em sua maioria por pais, amigxs e namoradxs que estão ali para apoiá-lxs. As três primeiras edições do Criações (2013, 2014 e 2015) foram compostas por estilos estudados em sala de aula (clássica, folclore, moderna, tribal fusion, …) mas me incomodava o fato dos números não serem agrupados em torno de um tema. No ano retrasado (2016) fiz o primeiro Criações temático, no caso "Anos 70", no qual reuni músicas da década que mais amo e as coreografei. O resultado foi fantástico e grande parte do público e dos alunos pediu um outro show com o mesmo tema. Atendendo a pedidos, o Criações de 2017 foi "Anos 70 - parte 2". Em 2018, o foco será outro.
As coreografias e os figurinos foram elaborados de acordo com o estilo de dança nas três primeiras edições (Balady, ATS®, Tribal Fusion, ...) e de acordo com o tema do show na quarta e quinta edições. Nestas abusamos das calças boca de sino, dos acessórios hippies e de toda estética apaixonante dos anos 70.
As coreografias e os figurinos foram elaborados de acordo com o estilo de dança nas três primeiras edições (Balady, ATS®, Tribal Fusion, ...) e de acordo com o tema do show na quarta e quinta edições. Nestas abusamos das calças boca de sino, dos acessórios hippies e de toda estética apaixonante dos anos 70.
Para mim, é de importância vital. O ATS® é a base das fusões tribais que fiz e quero fazer e foi muito construtiva a noção de sintonia entre xs dançarinxs que ele me deu. Sei que o Tribal Fusion vem evoluindo para um distanciamento do ATS® e de forma alguma sou contra xs dançarinxs que decidiram distanciar-se dele, mas eu, muito provavelmente por ser Sister Studio e amar o ATS®, não desejo fazê-lo.
Fazer parte de um grupo de ATS® é criar um conhecimento sobre o corpo dxs colegas de forma que o cue mais sutil é percebido por todxs. ATS® é uma linguagem totalmente não verbal o que te obriga a usar outras formas de sinalização durante uma performance. Quando o grupo se conhece e desenvolve bem essas outras linguagens parece mágica.
Fazer parte de um grupo de ATS® é criar um conhecimento sobre o corpo dxs colegas de forma que o cue mais sutil é percebido por todxs. ATS® é uma linguagem totalmente não verbal o que te obriga a usar outras formas de sinalização durante uma performance. Quando o grupo se conhece e desenvolve bem essas outras linguagens parece mágica.
BLOG: Em abril de 2015, você esteve em uma imersão
em São Paulo, realizado pelo Festival Campo das Tribos, a estudos
pela dança tribal e por sua certificação em ATS® com a criadora do
estilo, Carolena Nericcio, e Megha Gavin. Gostaria que nos
explicasse melhor sobre o processo de certificação (General Skills/ Teacher
Training1 e 2) e como se alcança o tão estimado selo de Sister
Studio. E qual importância de conseguir tal certificação, em sua
opinião.
O processo de certificação é bem pesado porque envolve várias horas de aula por dia para revisarmos os principais movimentos do ATS® durante o General Skills clássico e moderno. Digo os principais porque os movimentos dos DVDs 8 e 9 do FatChanceBellyDance® não são trabalhados nesses cursos (pelo menos não no ano que fiz, 2015). No Teacher Training, o foco é a didática específica para o ensino do ATS® e a Carolena e a Megha trazem muitos exemplos de situações que ocorrem em sala de aula, com dicas valiosas para todxs que desejam ensinar esse estilo. No último dia do curso, a turma fica dividida em subgrupos e cada integrante sorteia um movimento. Criamos então uma situação hipotética em que x integrante deve dar uma aula sobre tal movimento para o resto do grupo. No final, o grupo dá um feedback para x “integrante professor(a)” da vez, com comentários sobre o que já está bom e o que pode melhorar. O selo de Sister Studio FatChanceBellyDance® pode ser alcançado por todos que concluem o Teacher Training e que desejam se comprometer com uma série de regras que ele implica. Após concluir o curso, recebemos um e-mail com o regulamento para quem quer se tornar Sister Studio FatChanceBellyDance®. Se você concordar, deve enviar uma resposta dizendo que está de acordo, comprometendo-se a seguir as orientações.
Para quem quer dar aula de ATS® a certificação é fundamental. Eu estudei muito os DVDs didáticos do FatChanceBellyDance®, mas tinha milhares de dúvidas que só consegui esclarecer no curso. No General Skills vemos cada movimento detalhadamente, além de praticá-los várias vezes com a turma. O curso como um todo vale cada centavo.
Para quem quer dar aula de ATS® a certificação é fundamental. Eu estudei muito os DVDs didáticos do FatChanceBellyDance®, mas tinha milhares de dúvidas que só consegui esclarecer no curso. No General Skills vemos cada movimento detalhadamente, além de praticá-los várias vezes com a turma. O curso como um todo vale cada centavo.
BLOG: Hoje contamos com diversos recursos de
estudos. O próprio FCBD® vem lançando materiais muito bons nos últimos anos. Em
relação ao estudo de ATS®, que dicas você daria para aqueles que ainda não
podem estudar com uma professora do estilo, mas que gostariam de aprender mais
sobre o mesmo, tanto na teoria quanto na prática?
Primeiramente, que comece a estudar os DVDs didáticos do FatChanceBellyDance®, mesmo que não saiba falar inglês. Se for muito ruim entendê-los, estude-os visualmente observando e tentando reproduzir os movimentos. Uma olhada no vocabulário básico de anatomia em inglês ajuda bastante também porque aos poucos vai saltando ao ouvido um “elbows” (cotovelos) ou “shoulders” (ombros) com o assistir contínuo dos vídeos. Participar de grupos de discussão de ATS® no Facebook e assistir vídeos de apresentações no YouTube são ótimos também. O próprio canal do FatChanceBellyDance® no YouTube tem vídeos de sequências de treino que podem ser reproduzidos pelx estudante.
BLOG: Conte-nos como surgiu a ideia de criação
do Curso de Qualificação para Instrutores de Dança (CQID), voltado
para a dança tribal, no Rio de Janeiro. Como é o formato do
curso e sua proposta. Qual seu diferencial e o que as alunas inscritas podem
esperar?
A ideia do curso é fornecer para x alunx as ferramentas necessárias para que elx possa conduzir seu próprio estudo. O curso está dividido em dois módulos (ATS® e Tribal Fusion), sendo o módulo ATS® o mais extenso. A intenção disso é dar uma boa base para xs alunxs que desejem experimentar as fusões. No módulo Tribal Fusion, vemos algumas possibilidades como o Tribal Fusion Belly Dance e o Tribal Gypsy. Meu curso é voltado para formar dançarinxs e instrutores pesquisadores. Para isso, preocupei-me com um conteúdo que xs permita ter uma base sólida para serem capazes de fazer suas pesquisas individuais conscientemente.
BLOG: Além de ser bailarina e professora de tribal
fusion, você também é de dança do ventre. Na sua opinião, há dificuldades em
coexistir as duas modalidades? Quais são os benefícios da dança do ventre para
o tribal fusion e vice-versa?
Não há dificuldades, e sim vontades. Tem épocas que
sua inspiração está mais voltada para o Tribal e outras para a Dança do Ventre.
Eu entendi que isso vai sempre acontecer e respeito esses momentos, extraindo
deles o máximo criativo que posso. Minha única preocupação é manter um mínimo
de excelência nas duas modalidades.
A Dança do Ventre beneficiou os movimentos de
quadril no Tribal Fusion ao passo que este reacendeu a busca pelo isolamento
corporal e pela limpeza de braços. As duas práticas podem coexistir em nós e só
tem a acrescentar.
BLOG: Apesar de estar cada vez mais se
consolidando e ganhando força, a dança tribal ainda é recente no universo da
Dança no país. Como a dança tribal está ganhando espaço na cena acadêmica? E o
quê você considera importante ainda ser trabalhado no âmbito acadêmico para a
dança ser mais valoriza e reconhecida?
Como comentei anteriormente, temos muito trabalho pela frente. Vejo que a Dança Tribal é levada para a cena acadêmica por dançarinxs que se apresentam em eventos na universidade ou que escolham abordar esse tema em seus trabalhos de graduação. É um trabalho de formiguinha, mas que aos poucos vai ganhando força e cutucando as danças “consagradas” dentro das faculdades de dança. Sinto falta de teóricos da dança, dançarinxs mesmo que problematizem seu fazer enquanto artista e que produzam textos acadêmicos sobre as especificidades da nossa arte. Sempre que leio algum artigo relacionado à dança o autor ou é jornalista, atuando como crítico de arte, ou de alguma área que capta a dança como objeto de estudo, como a História da Arte ou a Psicologia às vezes fazem. Não tem jeito: meio acadêmico funciona por textos, pela realização de simpósios, congressos, mesas-redondas… Xs dançarinxs pesquisadores precisam ocupar esses lugares para a dança ser conhecida e reconhecida.
Sinto que a prática do Yoga fornece um condicionamento físico e mental perfeito para a dança. Se levada à sério, propicia encontros com você mesmo onde podemos nos centrar e pensar o que somos, onde estamos e o que queremos enquanto dançarinxs. Essa reflexão dá sentido à profissão que escolhemos e plenitude durante o exercício.
BLOG: Você considera a dança tribal uma dança
étnica contemporânea? Por quê?
Sim. A proposta da Dança Tribal é ultrapassar
fronteiras existentes ou que nós criamos entre estilos de dança, navegando
pelas etnias e promovendo seus diálogos, trocas e sínteses. O termo dança
étnica contemporânea resume bem o que a dança se propõe a ser.
BLOG: Em sua opinião, o quê é tribal fusion?
Tribal Fusion é uma estilo de dança que desconstrói
o ATS® para fusioná-lo com outra dança ou estética que você deseja dialogar.
A possibilidade infinita de fusões, a liberdade de criação,
a abertura para emergir um estilo próprio e, principalmente, a possibilidade de
aplicar seus conhecimentos sobre outras danças, evitando que fiquemos
engessados num lugar comum.
BLOG: Como você descreveria seu estilo?
Meu estilo é um conjunto das linguagens que
passaram pela minha formação, das experiências de vida que tive, das percepções
que tenho sobre o meu corpo e de como eu me entendo enquanto artista.
BLOG: Como você se expressa na dança?
Expresso-me pelas minhas coreografias, que refletem
minhas inquietações artísticas e a busca incessante pelo desafio.
Pensando em shows que fiz e workshops que ministrei, lembro que os melhores momentos foram aqueles em que recebi um abraço apertado de alguém da plateia após alguma apresentação, agradecendo pela performance que executei. Ou o sorriso dxs alunxs ao conseguirem executar um movimento que julgavam impossível. Dão aquela sensação de dever cumprido, sabe? Sou muito grata por esses acontecimentos.
BLOG: Quais seus projetos para 2018? E mais
futuramente?
Em 2017 fiz parcerias com artistas de outras áreas para sair um pouco das falas características do nosso meio e experimentar outras possibilidades com a dança. São projetos em andamento que devem florescer em 2018. Futuramente, pretendo ingressar na Licenciatura em Dança e produzir um material teórico mais extenso, já visando uma possível pós-graduação.
BLOG: Improvisar ou coreografar? E por quê?
Improvisar e
coreografar. Gosto de deixar um trechinho dos meus solos sem uma coreografia
fechada, de forma que ele se desenrole de acordo com o meu estado de
espirito no dia da apresentação.
BLOG: Você trabalha somente com dança?
Sim.
BLOG: Deixe um recado para os leitores do blog.
Reflitam sobre seus objetivos na dança e caminhem na direção deles. Durante o caminho, evitem comparações, pois cada um sabe da sua trajetória. Mantenham o foco: a vida está cheia de distrações visuais e midiáticas, não se percam nelas. Conheçam/escutem os seus corpos e se orgulhem de cada progresso ao invés de ficar sempre se pressionando pelo que ainda falta alcançar. Pensem a si mesmos como ARTISTAS e não apenas dançarinxs. Nós criamos fronteiras entre as artes que na verdade não existem, principalmente no momento da criação. Por fim, desejo que vocês sejam inquietxs, curiosxs e eternxs pesquisadorxs. A Dança - ou qualquer área que decidam seguir - agradece! =)
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