por Hölle Carogne
No primeiro “Desvendando” de 2017, temos a convidada Persephone LeFay, bailarina da cidade de Curitiba. Ela nos conta o que há de oculto por trás de seu trabalho intitulado "Dancing Before Sacrifice". Confira a história desta criação e conheça um pouco mais sobre esta bailarina tão sensível e devota às suas crenças!
Querida, Persephone:
Obrigada por dividir conosco teu belíssimo trabalho!
Venenum
Saltationes: Quando e como surgiu a vontade de criar "Dancing Before Sacrifice"?
Esta coreografia
tem uma grande importância para mim. No momento que a fiz, vinha refletindo
muito sobre a questão dos sacrifícios, em todos os seus aspectos. Nos
sacrifícios que antigos guerreiros faziam por aquilo que acreditavam, nos
sacrifícios que fazemos aos deuses e deusas, nos sacrifícios que fazemos por
aqueles que amamos. Na doação. Como a doação é importante e como se sacrificar
sempre traz a ideia de um amor muito grande, trazendo a dor do sacrifício
juntamente ao coração aberto e feliz pela oferta de si mesmo, ou daquilo que
representa nossa vontade. Baseada nessas reflexões que vinham preenchendo meu
viver nesta época, realizei esta coreografia.
Venenum
Saltationes: Do que se trata este trabalho? Qual o assunto abordado?
Como comentado
acima, o assunto que ela trata é o Sacrifício, numa tentativa humilde de
personificá-lo dançando. Como uma última dança antes de se sacrificar por algo
a alguém, ou por alguém a algo. Ela é uma coreografia onde trago a dor da
doação, juntamente a glorificação de estar se sacrificando de bom grado por
aquilo que me preenche, me domina, e eu preciso e respeito.
Venenum
Saltationes: Existe alguma linguagem oculta por trás de "Dancing Before
Sacrifice"?
Sim, existe! Desde as músicas pensadas, até os
movimentos que trago, são todos baseados em questões de sacrifício que eu vinha
realizando em minha vida pessoal, pois eu trazia em mim na época (e ainda
trago) o sacrifício de uma guerreira que estava lutando por algo que
acreditava, o sacrifício para minha deusa, o sacrifício para aquilo que
acredito, a doação de mim mesma, a abdicação de coisas de mim, em virtude de
outras pelas quais tinha grande afeto e eram muito importantes. A união de
sacrifícios que vinha passando criaram cada linguagem e expressão corporal e
facial que busquei desenvolver na coreografia, e pela união de tantos
sacrifícios, decidi simbolizar a personificação do sacrifício em si, do modo
que estava vendo e vivendo.
Venenum Saltationes: Com quem "Dancing
Before Sacrifice" tenta se comunicar? E o que ela quer dizer?
Primeiramente, ela
se comunica comigo, com minha visão da personificação do sacrifício. Antes de
me doar para a dor, irei dançar a dor, em virtude de algo maior. Ela busca se
comunicar com a deusa que habita em mim, que vê e acolhe meus sacrifícios,
simbólicos, mas nem por isso menos reais. Ela busca se comunicar com quem
assiste, para que seja tocado e relembre a si mesmo de seus próprios
sacrifícios, doações e motivações.
Venenum
Saltationes: Comente sobre os processos de criação de "Dancing Before
Sacrifice".
Para criar esta
coreografia, senti os chamados das músicas, que eu mesma editei em sequência,
criando com elas meu sentido. Eu, no início, sabia o que queria dizer, mas como
muitas vezes ocorre com todos nós, me perguntava como. Após o chamado das
músicas e a música final pronta, eu já sabia que o início me chamaria para
incorporar o sacrifício e personificá-lo no palco, que foi o que busquei fazer,
me oferecendo de bom grado, mas nem por isso ignorando a dor, para atingir algo
maior. Minhas taças e o líquido que bebo simbolizam o sim que disse para muitos
sacrifícios pessoais em vários aspectos que vivia no momento, e o sim para
humildemente simbolizar o sacrifício de muitos significados. A segunda música
chama a glorificação, sem ignorar a dor, mas mostrando a mim que a partir da
doação podemos conquistar aquilo que desejamos e nosso sacrifício tem
importância, é reconhecido e ouvido. Ele nos toca, ele purifica, ele ensina. É
uma coreografia carregada de simbolismo. A queda do final é a redenção final,
em agradecimento por ter sido atendida, o descanso e emoção do sacrificado. Ter
realizado este trabalho me ajudou a ver o próprio sacrifício de outras formas,
ver que acima de tudo fazemos escolhas ao pronunciarmos os nossos chamados e
realizarmos a busca de nossas vontades. Mostrou-me a importância de unir a dor
da doação com a glorificação da conquista. Fez-me olhar tudo aos olhos do
sacrifício em si, do sacrificado, e não só de seu objetivo final, da conquista.
Tenho imenso carinho por ela.