[Índia em Dia] A Índia e o Tribal - rastreando a presença da arte hindu nas fusões (PARTE 1)

por Raphael Lopes
Pintura tradicional indiana retratando bailarinas Rajastanis dançando Kalbelya


Olá leitores,


Gostaria de iniciar hoje uma conversa sobre as influências indianas sobre o Tribal. E quando digo Tribal não me refiro unicamente ao ATS®, mas ao Fusion principalmente, justamente por ele dar uma infinitude de possibilidades por meio de cada bailarino(a). Não conheço os trabalhos individuais de todos os bailarinos, logo posso apenas pincelar aquilo que está mais visível no mercado contemporâneo. 

Primeiramente, gosto de lembrar que toda arte é uma expressão cultural e, basicamente, é fundamentada em dois pilares: Estética e Filosofia. Assim, as danças "do Ventre" (lembrando que diversos países do Médio Oriente possuem suas particularidades) possuem uma estética e uma filosofia, enquanto o flamenco possui sua estética e sua própria filosofia, o mesmo com o Ballet, e assim por diante. Cada estilo é único, e de certa forma é "fechado". O paradigma da dança tribal é justamente aceitar o desafio de abrir esse circuito fechado que existe em cada estilo, permitindo um diálogo onde danças de estilos diferentes possam convergir numa mesma arte.

Ghagra Choli Bollywood Style

A nível estético, o desafio é grande: danças diferentes possuem padrões rítmicos singulares, e uma colagem apenas tornará mais visível as diferenças. A proposta do Tribal é fluída, e isso deve em primeira instância significar que a bailarina deve diluir as técnicas numa linguagem coesa e, acima de tudo, fluída. Não consigo conceber plágio de coreografias ou combos "prontos", colados e costurados, como uma fusão. A fusão deve ser sempre criativa, uma expressão do entendimento que a bailarina detêm organicamente dos estilos que se propõem a trabalhar.

A estética indiana está fortemente impressa na cultura do Tribal. O uso de Pashminas, Dupatas e Sarees é ampla, sejam como turbantes, xales para amarrar ao torso ou quadril, ou ainda costurados como os mais diversos arranjos, sendo o Choli um dos mais populares. O top Choli a princípio é sempre com os ombros cobertos, e com o fecho na parte da frente. Na cultura indiana mostrar os ombros é reservado para a intimidade do casal, deixando a sensualidade por conta da barriga à mostra. Esse modelo de figurino surgiu há mais de mil anos no período "Chola", tendo sido criado a pedido do próprio Rei Chola (dai o nome Choli).

Colleena Shakti in Kalbelya costumes

Além do mais temos as famosas saias rajastanis, Jaipur Silks, oriundas das tribos "ciganas" do norte da Índia que carregam seus tecidos com pequenos espelhos que criavam um brilho e fascinio nas bailarinas que dançavam ao redor das fogueiras em noites de Lua Cheia. O mesmo encanto se preservou nas bailarinas radiantes sob os holofotes de um palco. 

As jóias, assim como a maquiagem e o uso de Bindis (bijous para a testa) também possui raiz na regionalidade cultural da Índia, onde as mulheres se adornam como Deusas.

As danças Bhanjaras das ciganas de Jaipur também possui o uso dos Snujs (conhecidos como Kartalas), assim como o padrão de giros e movimentos em combo improvisado que tanto vemos ecoar no American Tribal Style®. 

Rachel Brice em postura Tribhanga

Muito embora se diga que a dança indiana seja uma raiz do Tribal, eu me atrevo a afirmar que o grande pilar que a dança indiana fundamenta no tribal seja muito mais a Estética do que o próprio repertório de movimentos. As danças clássicas possuem linhas corporais mais rígidas e poligonais, o que dificilmente se encaixaria nos sinuosos movimentos de quadril. Recentemente o Tribal parece flertar com o Odissi, que é considerado o estilo mais sinuoso entre as oito formas clássicas de dança indiana, e vemos bailarinas como Coleena Shakti, Moria Chappell e Rachel Brice introduzirem os movimentos de torso (conhecidos como Chalas) e a postura de corpo inspirada nas esculturas das Deusas, a posição em Tribhanga (tripla curvatura - pernas, tronco e pescoço).

Na próxima matéria irei abordar as influências conceituais e filosóficas da dança indiana no estilo Tribal. E lembre-se sempre, ao fusionar um estilo tenha certeza de conhece-lo com o próprio corpo, partindo de estudos e  experimentações concretas.

Moria Chappell in Odissi costumes


Até a próxima,

Raphael Lopes


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