por Hölle Carogne
Saba Khandroma é uma bailarina
argentina, que vem se destacando entre o público “mais dark”, por ter uma veia
artística muito visceral e extremamente conectada com o ocultismo. Seu trabalho
flerta com vários estilos de dança, percorrendo do Tribal, à Dança
Contemporânea e ao Butoh. Nesta entrevista, Saba conta para o público tribal um
pouco da sua história de vida e da sua trajetória na dança, bem como revela a
sua ligação com o ocultismo e a magia.
Venenum Saltationes: Saba, seja bem-vinda à Coluna Venenum
Saltationes. É uma honra ter sua arte compartilhada no meu espaço. Conte-nos um
pouco sobre a sua história de vida, falando sobre a mulher, a bailarina e a
ocultista Saba Khandroma.
Saba Khandroma: Na minha vida tenho vivido muitas vidas e por isso
tive muitas mortes, ou renascimentos... Considero-a como uma constante mutação
e por isso gosto de percorrer caminhos diferentes, sabendo que todos são um.
Desde criança tenho me sentido atraída pelo oculto, pelo misticismo e pela
poesia. Desde então, o mistério me guia. Como mulher eu me sinto parte desse
mistério e elevo-o para as estrelas. Meus estudos têm a ver com isto: filosofia, literatura e cinema. E a dança, é claro. Sempre inquieta, mas
retraída e rebelde. Eu nunca termino de me encaixar em alguma corrente, então
acabo me abrindo para o meu próprio caminho...
Venenum Saltationes: Qual foi seu primeiro contato com a
dança? E quando decidiu dedicar-se a esta arte?
Saba Khandroma: Meu primeiro contato com a dança foi quando
criança, aos 6 anos, com Expressão Corporal, que me deu grande liberdade e
conexão com o meu corpo até lugares mágicos.
Depois fiz aulas de Dança
Clássica e Jazz, quando criança também, mas a Dança Contemporânea e o Butoh,
hoje, alimentam o meu espírito. Em seguida, viria o Tribal e o Dark Fusion na
minha vida, apenas há uns quatro anos atrás.
Há mais de dez anos, eu me
dedico a performance. Eu acho que não foi uma decisão, mas entrou na minha vida
e aceitei-o, adotei-o como um estilo de vida. O meu início foi em cabarés e
casas noturnas onde eu ainda continuo atuando.
Venenum Saltationes: A dança é a sua profissão? Ou apenas um
hobby e uma filosofia de vida?
Saba
Khandroma: A dança é minha profissão, como performer. E a minha
filosofia de vida é vasta e contraditória.
Venenum Saltationes: Como você define seu estilo de dança?
Saba
Khandroma: O meu estilo de dança? Acho que é experimental acima de
tudo, é sempre um “work in progress” performativo.
Venenum Saltationes: É notável uma forte influência de butoh
nas suas criações e intenções, algo que admiro e me identifico extremamente.
Conte-nos como surgiu essa inspiração e como funciona para você essa fusão.
Saba Khandroma: Butoh é hoje em dia a linguagem em que eu
existo profundamente, eu não o escolhi, mas ele sempre foi parte de mim e eu o
encontrei novamente. É a transformação de um corpo que não é corpo. Também é a
liberdade e a extinção do “Eu”. É a poesia e o sutil, o pequeno gesto
latente... Onde se busca com o espírito, onde dançam as forças cósmicas... É um
fluir constante.
Venenum Saltationes: Em minha opinião, você tem um excelente
gosto musical. Conte-nos um pouco sobre a sua relação com a música e cite
alguns dos seus músicos favoritos.
Saba Khandroma: Quanto à música, eu sempre me conecto com
peças que despertam ou movimentam o meu interior a partir desse lugar mágico.
Meus artistas favoritos:
Diamanda Galas, Neubauten,
Daemonia Nymphae, Soriah, Lustmord, Geomatic, Desiderii Marginis, Atrium Carceri,
Inade, muito dark ambiente!! A lista poderia ser interminável.
Venenum Saltationes: Quais são os artistas que inspiram você?
Saba Khandroma: Essa lista poderia ser ainda mais
interminável, mas alguns seriam:
Artaud, Henry Michaux,
Deleuze... Especialmente poesia de todos os tempos, os poetas malditos, os
Beatniks, Blake, RAW. Poesia japonesa e textos budistas de todos os tempos.
Artistas como Fuyuko Matsui,
Bacon, HR Giger, Jean Cocteau . O cinema de David Lyncn e Cronenberg.
Na dança Minako Seki, Katsura Kan,
Yumiko Ioshioka, Ko Murobushi; em tribal: Sera Sosltice que é quem eu admiro profundamente...
Eu também sinto-me inspirada pelo trabalho de Aepril Schaille e do
absolutamente virtuoso Illan.
Silvie Guilleim, a imensa obra
de Pina Bausch, Kazuo Onho, Hijikata, Mary Wigman, John Cage.
Venenum Saltationes: Como é o cenário do Tribal na
Argentina? E como o seu estilo de dança é recebido pelo público tribal deste
país?
Saba Khandroma: Acho que a cena tribal está crescendo
rapidamente, mas ainda é pequena e está em evolução. Há pessoas fazendo um bom
trabalho a partir das salas de treinamento e cênica. E estão se construindo ligações
entre artistas para criar novas possibilidades, isso é algo no que eu estou
particularmente interessada. Gostaria de realizar algumas experiências mais
como aquela que fizemos este ano com um grupo de dançarinas inquietas tribais,
músicos e pessoas de outras disciplinas, onde tiramos o tribal dos cenários
para levá-lo numa velha mansão, onde um portal para um mundo onírico foi aberto,
numa outra maneira de experimentar a dança, uma obra atravessada pelo
surrealismo. Isso foi “Imaginarium”. E no próximo ano vai continuar
crescendo e se desenvolvendo, sem dúvida, desde um espaço experimental e de
absoluta liberdade criativa graças aos seres que o compõem.
Sobre como são recebidas as
minhas performances, não sei, sou pouco ciente disso e prefiro que assim seja,
é uma coisa boa no momento criativo. Há pessoas que se sentem
inspiradas, pessoas que "mutis pelo fórum", pessoas que acham uma
porcaria haha e tudo isso é perfeito.
Venenum Saltationes: É possível perceber no seu trabalho,
uma forte conexão com o ocultismo. Conte-nos qual é a sua ligação com a magia.
Você segue alguma linha específica?
Saba Khandroma: Minha relação com o ocultismo é natural. E
no meu caminho já passei por diferentes escolas de Mistérios do Ocidente, onde
estudei e experimentei por algum tempo a magia, com uma base em Gnosticismo
Egípcio e Hermetismo. Depois eu cheguei ao Budismo Oriental.
Venenum Saltationes: De que forma seus conhecimentos ocultos
influenciam na sua vida artística?
Saba Khandroma: Hoje minha busca também esta
filosoficamente focada na dança, porque é uma arte efêmera, e por causa disso
vital, igualmente à impermanência, que é a realidade subjacente da existência.
Eu gosto de colaborar
artisticamente em performances e eventos com amigos de diversas correntes
mágicas, e eu me sinto absolutamente em empatia.
A arte como transformação, como
um despertar constante...
Você só pode viver magicamente.
Sonhos, meditações, tudo está integrado e existe como um contínuo.
Venenum Saltationes: Seus enredos realmente estão
impregnados desta filosofia? Ou é apenas a sensação que o público tem ao vê-la
dançar?
Saba Khandroma: Sim, eu estou presente em mim, estou
testemunhando quando danço.
Minhas histórias são sempre
muito imersas, perto do sobrenatural, sempre em busca de algo, são um sinal de
pergunta, um transe...
Venenum Saltationes: Quando você monta um novo trabalho
(peça, coreografia) costuma premeditar todos os simbolismos e a energia que irá
inserir na dança ou isso surge de maneira mais instintiva durante o processo de
criação?
Saba Khandroma: Acho que as duas coisas acontecem, mas a
ordem é aleatória. Quando alguma coisa está nos chamando para trabalhar nisso,
desentranhamos mistérios, a viagem é interna, você nunca sabe onde vai chegar.
Acho que isso é o melhor: As transformações no processo, a performance é apenas
algo mínimo de um trabalho de busca ou reflexão... Por isso estou interessada
em ver obras ou peças vivas, experimentais.
Venenum Saltationes: Saba Khandroma é seu nome verdadeiro ou
é um pseudônimo? Caso sinta-se à vontade, conte-nos qual o significado deste
nome e qual a importância dele para você.
Saba Khandroma: Saba é um diminutivo do meu nome real; e
Khandroma é o meu nome mágico artístico, em tibetano significa bailarina
atravessando o céu. Uma Dakini dançante no vácuo.
Venenum Saltationes: Caos e luxúria. Esses dois termos
mágicos estão associados à sua vida? De que forma? Comente à respeito.
Saba Khandroma: Caos e luxúria sempre fizeram especial
parte da minha vida, eu assumo o caos como a fonte, é fundamental para entender.
Ele é nossa mãe.
E a luxúria... bem, os excessos
são os companheiros fiéis de todo verdadeiro buscador, pelo menos eu acho que,
como disse Blake "não vai saber o que é o suficiente, até que você saiba o
que é mais do que suficiente"... Então tem que experimentar tudo, beber da
taça descuidadamente até o final, onde os segredos são revelados. A luxúria
pode dar lugar para um estado de contemplação, mas primeiro deve ter sido uma ruína.
Venenum Saltationes: O nome desta coluna é “Venenum Saltationes”,
que significa “O Veneno da Dança”. Este termo revela a dança como um
entorpecente, um psicotrópico, que altera as percepções físicas e eleva o
espírito. O que você pensa sobre este conceito? Você acha que é possível
transcender através da dança?
Saba Khandroma: É claro que é um psicotrópico! É
absolutamente um meio de alterar a consciência, foi usada
na magia desde os tempos antigos e nesse poder reside a sua força. Estou muito
interessada no conceito de dança como um tóxico, artistas de todos os tempos
sempre foram atraídos às experiências de natureza intoxicante, as drogas e os
estados alterados. Em nossa química natural já se
encontram todas as drogas...
Em Butoh dançamos através de
estados não ordinários, meu desafio é conectar isso com a dança tribal, trazer
essa consciência diluída e flexível para uma forma, um corpo arquétipo e ver o
que acontece, seguir experimentando... é claro!
Venenum Saltationes: Saba, agradeço a sua disposição em
revelar-se e desnudar-se de forma tão intensa e visceral. Admiro muito a sua
aura artística e me identifico muito com várias nuances da sua psique. Para
finalizarmos, deixe-nos com alguns de seus trabalhos que demonstrem sua
ideologia e revelem o conceito mágico por trás da sua dança. Deixe também os seus
contatos, para que o público brasileiro possa encontrá-la. Gratidão!
Saba
Khandroma: Minhas performances sempre oscilam entre o misticismo e a
mitologia e sou inspirada por divindades de panteões antigos de deuses, como a
minha última performance, inspirado por uma divindade tântrica Vajrayogini.
Você e eu temos a energia a ser compartilhada, as mulheres ferozes e profundas em que refletem como espelhos, como Zen diz: "I shin den Shin" - meu espírito ao seu espírito Hölle!
Venenum Saltationes: Um brinde à nossa energia Saba! Um
brinde ao nosso espírito e aos nossos instintos! Um brinde repleto dos melhores
néctares!
Canal do youtube:
Imaginarium:
Vídeos:
Incrível o trabalho dela!
ResponderExcluirAdorei conhecer!
bjin