Nossa entrevistada do mês de agosto é a bailarina de Rio Claro-SP, Paula Braz, diretora da Shaman Tribal Co. Paula nos conta sobre sua trajetória, sobre a cia, Shaman's Fest e projetos futuros. Vamos conferir?
BLOG:
Conte-nos sobre sua trajetória na dança do ventre/tribal. Como tudo começou
para você?
Estréia em 2006 |
Meu primeiro
contato com a dança foi logo enquanto criança. Sempre gostei de dançar, mas até
os 21 anos ela esteve presente na minha vida de maneira bem informal, como
hobbie, nada mais. Entretanto, tenho uma relação simbiótica com a música! Aos 7
anos comecei a tocar piano e estudei música clássica por 10 anos pensando
sempre que seguiria carreira enquanto musicista. Por muitos motivos decidi
estudar Arte Educação e foi na faculdade, por obrigação, que voltei a dançar. E
foi então que meu caso de amor com a dança começou de verdade.
Na faculdade
descobri a Dança do Ventre e fui super envolvida por ela! Fazia aula 3 vezes
por semana e por 3 anos mantive esse ritmo até alcançar o profissional e
começar a me preparar para a prova da Khan el Khalili. Foi quando descobri o
The Indigo, através de um dos dvds do Bellydance Superstars, no início de 2006.
Minha professora, Dandara Kali, viu em mim uma afinidade maior com o Tribal e
me estimulou muito a seguir o caminho desta dança. Então em um de seus
espetáculos, deu à mim e Ellen Paes, também aluna de Dandara na época, a missão
de montarmos um trabalho sob o estilo Tribal. Assim nascia o embrião do que
viria a ser a Companhia Shaman Tribal.
BLOG: Quais foram as professoras que mais marcaram no seu aprendizado e por quê?
Em primeira
instância, a professora mais importante que tive foi Teodora Alves, professora
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Ela me ensinou a entender a
dança enquanto linguagem expressiva e a entender o meu corpo enquanto campo
expressivo. Cruzando as fronteiras estilísticas da dança me ensinou a
existir com meu corpo todo e não apenas com minha mente. Foi revolucionário na
minha vida, tenho muito a agradecer a ela. Ainda na UFRN, o professor Maurício
Motta me apresentou o Teatro-dança e como podemos utilizar técnicas do teatro
na dança. Minha maneira de pensar a dança esta muito influenciada por estes
dois grandes mestres e em meu trabalho enquanto artista é possível
reconhecê-los.
A Dandara
Kali foi a professora que me ensinou a amar e respeitar a dança do ventre
enquanto arte. Ela sempre lidou com a dança do ventre de maneira muito similar
a que nós, tribalistas, lidamos com a dança tribal, de maneira devocional,
ritualística e muito, muito respeitosa. Além disso, foi a professora que me
estimulou a estudar o Tribal e me dedicar à ele mesmo que isso significasse
abandonar a dança do ventre.
Shaman Co. e Mira Betz |
Enquanto
tribalista estudei com muitas grandes profissionais brasileiras e estrangeiras
e gostaria de poder me estender e citar todas elas pois a sua maneira, cada uma
delas contribuiu para meu crescimento e amadurecimento profissional. Entre
elas, devo citar Shaide Halim, precursora do estilo no país que me trouxe bases
importantes; além de apresentar-me e à companhia Shaman o Tribal Brasileiro -
pelo qual já estávamos nos aventurando na época, mas sem muita consciência do
que estávamos fazendo e quantas eram nossas possibilidades! Sharon Kihara foi
de extrema importância, pois elucidou muitas questões visto que foi a primeira
americana a ensinar o estilo em nosso país. Ariellah Aflalo foi quem me mostrou
que era possível misturar as técnicas aprendidas no teatro-dança ao tribal e
ousar em relação a isso. Mira Betz foi e é provavelmente sempre será a mestra
das mestras para mim, ela é a somatória de todos os mestres que citei acima e,
em suas aulas, me sinto desafiada, provocada e retirada de minha zona de
conforto; ela é realmente muito importante para mim enquanto eterna aprendiz
que sou. Tjarda van Stratem e Heather Stants foram as professoras pelas quais
conclui minha ótica sobre os laços entre o existencialismo, a dança
contemporânea, o teatro-dança e o Tribal Fusion.
Rachel Brice
e Carolena Nericcio foram as professoras que sedimentaram minha ótica sobre o
Tribal Fusion e a importância de respeitarmos e celebrarmos nossas origens.
BLOG: Além da dança tribal você já fez ou faz mais algum tipo de dança?
Há quanto tempo?
Enquanto hobbie
pratiquei todo tipo de dança! De jazz a forró!
Há 12 anos
estudo dança enquanto profissional e passei por muitos estilos a fim de
acrescentá-los ao meu próprio estilo: dança flamenca, dança indiana, danças
folclóricas brasileiras, dança contemporânea, teatro-dança, dança moderna,
algumas das danças do universo do Hip Hop, etc. e etc.! Serei aprendiz para
sempre me re-formando sempre que puder.
BLOG: Quais foram suas primeiras
inspirações? Quais suas atuais inspirações?
Sempre digo
que minhas inspirações estão por todo lugar e a todo tempo, tento ser uma
esponja sempre, absorvendo tudo aquilo que me toca, me emociona, me provoca... E
essas referências e inspirações se dão por muitas fontes artísticas e também
sociais. Sou amante das artes plásticas, do cinema, do teatro, da música em
geral, da moda, de (quase) todos os estilos de dança entendendo sempre que
todas essas linguagens, de alguma forma, podem me inspirar. Também tento ser o
mais observadora possível prestando atenção no como as pessoas se comportam e
como reagem umas as outras e ao seu meio.
Restringindo
minhas grandes inspirações ao mundo da dança: Isadora Duncan, Martha Graham,
Marie Louis Fuller, Pina Baush e a incrível Mary Wigman foram artistas que mudaram minha ótica (bastante limitada
na época) sobre a dança. Apresentadas à mim durante a faculdade, elas foram as
primeiras bailarinas a realmente me emocionar. Foi muito inspirador e foram as
primeiras a despertar-me o desejo de estudar mais sobre dança.
Já envolvida
com o universo do Tribal Fusion: o extinto The Indigo sob direção de
Rachel Brice, em sua formação original, foi de longe, minha primeira grande inspiração.
Cada elemento utilizado, movimentos, músicas, figurino, expressão... uau,
aquilo foi arrebatador para mim na época! Foi quando tive a certeza do que
queria para minha vida profissional.
Quando
ampliei minhas pesquisas descobri grupos como o The Uzumé e o Urban Tribal, a
bailarina brasileira Karina Iman, a Companhia Halim, a bailarina Isidora
Bushkovski , que entre muitos outros, me inspiraram bastante e desta vez,
enquanto coreógrafa.
Atualmente o
FatChance BellyDance e a Carolena Nericcio (pela força das raízes), o Datura
dirigido pela Rachel Brice (pelos desenhos), Tjarda van Stratem e Mira Betz
(pela expressividade), o grupo Unmata (que me fizeram chorar como bebê no
Tribal Fest pela verdade e honestidade com que dançaram) Colleena Shakti (pelas
fusões maravilhosas), entre vários outros, tem me emocionado bastante em suas
apresentações. O espetáculo House of Tarot, sob direção da Zoe Jakes também me
inspirou bastante validando muitas das idéias que temos para nossos próximos
espetáculos.
Mesmo
que pareça piegas e tendencioso, repito sempre que o trabalho autoral das
demais bailarinas da Shaman me são deveras inspirador! Cibelle Souza sempre me
arranca lágrimas e me estimula a ousar em minhas criações, Gabriela Góes e suas
fusões com sapatilha de pontas me inspira a repensar o ballet, as fusões com
danças brasileiras de Priscila Miranda, Alana Reis e Gabrielli Cassab me
estimulam e inspiram a trazer sempre as danças brasileiras para minhas próprias
criações, Cris Dantas me inspira a trabalhar melhor meus isolamentos, e todas
as demais, de alguma forma, me tocam, me provocam, me inspiram... BLOG: O quê a dança acrescentou em sua vida?
Creio que em
primeiríssima instância: pessoas e viagens! A dança, sobretudo o Tribal, me
apresentou pessoas maravilhosas as quais admiro respeito e tenho profundas
afinidades. Viajar é meu combustível para viver feliz. É nestas viagens que
minha visão periférica amplia consideravelmente, minhas referências aumentam,
me deparo com muitas inspirações e conheço mais pessoas interessantes.
A
dança é minha profissão, meu ofício. Existem "dores e delícias" como
existem em todas as outras, exige muito dedicação e empenho para que haja
destaque profissional e funciona da mesma forma em qualquer outra
profissão.
BLOG:
O quê você mais aprecia nesta arte?
Minha relação simbiótica com a música foi amplificada com a dança. Para mim, dançar é a maneira mais visceral de interagir com a música, mais intenso do que fazer música e executar música.
BLOG: O quê prejudica a dança do ventre e como melhorar essa situação?Você acha que o tribal está livre disso?
Penso que o que mais prejudica a dança do ventre é o preconceito do público e a retroalimentação deste por parte de profissionais do estilo. Pouco estudo, muita vaidade, pouco comprometimento com a arte, muito ego em palco... Temos bailarinas profissionais de dança do ventre maravilhosas em nosso país, mas infelizmente, temos muitas mais bailarinas amadoras que pensam ser profissionais que acabam por alimentar o preconceito de que a dança do ventre é uma arte menor. Apresentações com pouca qualidade, figurinos de gosto duvidoso, pouca compreensão do que se está fazendo em cena... E o público acaba por atribuir ao estilo e não à bailarina ou grupo em questão a pouca qualidade artística.
Estudar muito, praticar mais ainda e
compreender que enquanto artistas temos um papel muito bem definido a cumprir.
Subimos no palco não para engrandecer-nos e ao nosso ego. Em cena, somos quase
prestadoras de serviço! Temos como obrigação emocionar aqueles que estão
dispondo tempo e dinheiro para estarem ali.
O Tribal não
está livre disso, de maneira alguma, e o texto acima funciona para os dois
estilos! Entretanto, sempre observei no meio do Tribal um interesse maior
por parte das alunas em estudar e participar de oficinas, workshops, festivais,
etc. Essa dedicação e esse comprometimento com o estilo elevam a qualidade das
apresentações.
BLOG: Você já sofreu preconceitos na dança do ventre ou no tribal ? Como foi isso?
Com a Dança do Ventre, sim. Pelos motivos citados acima.
BLOG: Houve alguma indignação ou frustração durante seu percurso na dança?
Durante o percurso na dança frustrações certamente me ocorreram. Mas falando no presente, me frustra que o estilo Tribal ainda não seja compreendido pelos estudiosos e críticos em dança. Temos dificuldades em nos enquadrarmos quando participamos de Festivais de Dança que não sejam do estilo. Não somos incluídas nos grandes Festivais e Encontros de Dança do país por ignorância, no sentido lato da palavra, dos organizadores.
BLOG: E conquistas? Fale um pouco sobre elas.
Puxa, foram muitas... Difícil elencá-las! Mas
hoje, passados os percalços, sinto como grande conquista ter me tornado amiga
de pessoas como Rachel Brice, Mira Betz, Tjarda van Stratem, Heather Stantes e
Samantha Emanuel, as quais sempre admirei, sempre tive como mestras.
Sinto um
orgulho tremendo em entender que, graças aos Shaman's Fest, tenho estas
mulheres que tanto admiro, como amigas, para as quais escrevo apenas para dizer
"oi, que saudade..." - me sinto privilegiada.
BLOG Você foi uma das primeiras bailarinas do Brasil a se envolver com o estilo tribal. Como eram as informações sobre o estilo na época em que você começou a pesquisar? Como era visto a dança tribal naquela época e como hoje ela vem se apresentando na cena brasileira?
As fontes eram muito escassas. Vídeos pela internet, dvds didáticos e de shows, e pouca oportunidade para estudar com pessoas de carne e osso! Muita informação desencontrada... Informações estas que estão chegando até hoje!
A dança
tribal era um peixe fora d' água... Hostilizada pelas profissionais da Dança do
Ventre que viam no estilo uma descaracterização da dança do ventre, hostilizada
pelos profissionais da dança moderna e dança contemporânea que ao se depararem
com o estilo só percebiam nele uma dança do ventre esquisita.
Hoje as
profissionais da Dança do Ventre compreendem que o estilo Tribal é apenas outro
estilo de dança, os profissionais de outros estilos recebem nossas
apresentações com admiração e mais respeito.
As fontes de
pesquisa são infinitamente maiores e melhores! Tive a oportunidade de
participar como objeto de estudo de alguns trabalhos de mestrado, doutorado e
TCCs e posso afirmar esse avanço. Temos muito a agradecer a estas
bailarinas-pesquisadoras que tem levado o estilo Tribal ao universo acadêmico.
BLOG: Conte-nos como surgiu a Cia Shaman, a etimologia da palavra, seus integrantes, qual estilo marcante do mesmo e se ele sofreu alguma mudança estrutural ou de estilo desde quando foi criado até agora.Como é o processo de introdução de novos integrantes? A propósito, a companhia era conhecida na forma brasileira “Xamã” e em 2012 vocês alteraram o nome para “Shaman”, algum motivo especial com relação a mudança?
Ellen Paes e Paula Braz |
A Shaman surgiu como conseqüência ao desafio da minha professora de Dança do Ventre! Eu e Ellen Paes apresentamos um duo em 2006 e a resposta do público foi muito estimulante. Tínhamos colegas na Dança do Ventre interessadas em estudar o estilo então sistematizamos nossas pesquisas, nossos encontros, e tudo foi fluindo com muita naturalidade.
A escolha do
nome se deu pelo nosso entendimento de que havia algo de sacro no Tribal.
Sentíamos que havia um apelo devocional muito grande. Na época, nossa
compreensão do estilo era muito mais intuitiva do que objetiva. Uma de nossas
integrantes, Bartira Calado, sugeriu o nome e foi imediatamente aceito pelas
demais integrantes. O xamanismo considera conceitos animistas: a manifestação
divina iminente a todos os elementos do Cosmos, a todos os elementos da
natureza, a todos os seres vivos e a todos os fenômemos naturais. Bartira,
Ellen e eu, cada uma a sua maneira, estávamos ligadas religiosamente a este
conceito e embora não fôssemos xamânicas compreendíamos a religiosidade desta
mesma maneira. O nome nos serviu como uma luva! Mesmo quando começamos a
nos aventurar em nossas pesquisas junto ao universo do cabaret vaudeville, da comédia del’arte, do teatro-dança, da dança contemporânea, ainda sim,
conseguíamos sentir o aspecto devocional em nossa dança. Dançamos com muita
verdade, com muita honestidade, com a consciência de que nossa arte é muito
maior do que nós mesmas e com um propósito e objetivo muito bem definido, o de
emocionar e provocar nosso público colocando-o em contato com sua humanidade.
Estréia 2007
|
Primeira Formação - 2007 |
Imediatamente
após nossa estréia, Cibelle Souza, na época integrante da Trupe Ashaki, foi
convidada a integrar a direção do grupo. Nosso entrosamento foi instantâneo e
descobrimos ter uma afinidade muito grande no processo de criação.
Com o crescimento da companhia e demandas de apresentações vimos a necessidade de criarmos o sistema de audições para novas integrantes e usamos o mesmo sistema até hoje. Anualmente, nossas bailarinas são auditadas e são abertas vagas para novas integrantes.
Cibelle Souza, Ellen Paes e Paula Braz |
Quanto a mudança de Xamã para Shaman: a mudança foi exclusivamente por conta de nossa internacionalização. Shaman é utilizado no mundo todo, ao contrário de Xamã - utilizado apenas no Brasil e alguns outros poucos países.
BLOG: Em 2008, a Cia Shaman realizou
seu primeiro espetáculo, "Experimentado Híbrida", gostaria que
comentasse um pouco sobre a idéia do espetáculo, o quê inspirou
vocês para a formulação da parte conceitual e do roteiro do mesmo, e qual é a
história por de trás dele? Como foi o processo de elaboração das
coreografias e figurinos, bem como sua repercussão?
O espetáculo
"Experimentando Híbrida" foi, como diz o nome, um experimento do
"Híbrida", espetáculo pelo qual ganhamos o prêmio Djalma Maranhão em
Natal. Infelizmente, a versão final do espetáculo não foi colocada em prática,
mas o experimento foi um sucesso. Utilizamos outras linguagens além da dança:
performances, projeção de vídeos-arte como cenário e uma dj fazendo as
interfaces musicais.
"Híbrida" tinha
como eixo central a estampa da multiplicidade da mulher e suas várias facetas
emocionais e os conceitos que cernem o Tribal Fusion enquanto estilo e suas
hibridações.
A repercussão
desse espetáculo foi fundamental para a companhia e o desenvolvimento dos
espetáculos seguintes: Las Nieblas e o Tribal Tales.
BLOG:
Em 2009, a Cia Shaman teve uma
segunda formação em Rio Claro(SP), sob sua direção. Como são os trabalhos
desenvolvidos em conjunto com a Cia
Shaman SP e como é essa extensão do trabalho realizado pelo grupo
original e com a segunda formação? Onde os grupos convergem entre si e em quê
quesito eles têm autonomia?
Os grupos trabalham como um só. A demanda de trabalho, seja enquanto produtoras, seja enquanto bailarinas, é dividida entre as bailarinas da companhia como um todo, sempre orientadas por mim e/ou Cibelle. Nossos festivais internacionais, nossas coreografias, nossa atuação enquanto produtoras estão intimamente interligadas, numa coexistência.
Os grupos trabalham como um só. A demanda de trabalho, seja enquanto produtoras, seja enquanto bailarinas, é dividida entre as bailarinas da companhia como um todo, sempre orientadas por mim e/ou Cibelle. Nossos festivais internacionais, nossas coreografias, nossa atuação enquanto produtoras estão intimamente interligadas, numa coexistência.
Temos
autonomia quanto aos festivais realizados por nossas escolas, que consideram a
participação das alunas de nossos estúdios e quanto a apresentações pequenas em
nossas cidades sedes.
Shaman Co. - Núcleo SP |
Eu e Cibelle trabalhamos muito bem a
distância, entendendo e respeitando nossas aptidões natas e dividindo o
trabalho respeitando essas nossas habilidades. Nem sempre é fácil, mas até
hoje, tem sido eficiente.
BLOG: Entre 2011 e 2013, vocês já
estiveram em eventos internacionais na Argentina e no Chile, como Opa
Fest e MEM. Qual retorno e repercussão você teve pelo público
sul-americano? Quais aprendizados e/ou vivências você adquiriu dançando e
estudando nesses países? Conte-nos um pouquinho sobre cada evento e suas
principais características e o quê você mais gostou deles.
Nossa
primeira viagem à Buenos Aires foi para estudar com Mira Betz e Mardi
Love no Opa Fest, em 2010. Foi maravilhoso, pois foi nossa primeira
viagem internacional e nosso primeiro contato com a Mira - ela realmente
fez a diferença. Dançamos no Hafla do evento para um público de, no máximo, 10
pessoas, sendo metade destas, brasileiras! Mas o fizemos sob os olhares atentos
de nossas mestras e estávamos muito felizes em estarmos lá então foi muito bom
para nós.
Voltei no
ano seguinte para ministrar um workshop a convite da produtora do Opa Fest e
com cerca de 17 alunos para participar do MEM, para estudar com a Jill Parker.
Desta vez, dançamos no Show de Gala do evento, apresentando o Carcará (com a
versão que inclui o Shaman Soul), coreografia inventada exatamente para essa
apresentação, pois queríamos reforçar nossa identidade junto ao público
internacional. A resposta do público foi emocionante. Nós acreditávamos que os
brasileiros sentiriam uma afinidade maior com o Carcará, mas o público e elenco
do show ficaram extasiados. Saímos do palco sob os gritos do elenco do show:
"grossas!!!" - que soubemos depois significar "maravilhosas!". Muitas
delas estavam chorando.
No ano
seguinte, estava dando aula no Opa Fest junto a Samantha Emanuel! Vê-se que o
retorno foi bem positivo!
O Chile foi
adorável. Tenho me encontrado com a querida Marisu Parada desde a minha
primeira visita a Argentina e ela sempre olhou para nosso trabalho com
interesse. A admiração foi crescendo no decorrer dos anos e o convite para
ensinar em Santiago foi mesmo um presente.
BLOG:
Você é produtora do evento Shaman’s
Fest, juntamente com Cibelle
Souza, que se destaca no Nordeste e Sudeste como um dos principais
eventos de dança tribal do Brasil. Conte-nos como surgiu a idéia do evento, sua
proposta e objetivos, organização e elaboração deste,bem como a repercussão do
mesmo para a comunidade tribal quanto para seu público. O evento , desde 2012, vem trazendo bailarinos
internacionais. Esses artistas comentam sobre as fusões brasileiras que
assistem nos eventos? Qual a reação deles com relação ao Tribal realizado no
Brasil?
O Shaman's
Fest surgiu despretensiosamente com o objetivo de facilitar o
encontro da companhia com bailarinas com as quais gostaríamos de estudar.
Viajarmos todas ao exterior nos parecia uma tarefa mais difícil e mais cara do
que contratá-las para vir ensinar para nós.
No primeiro
Opa Fest que participamos, em 2010, ficamos maravilhadas com a Mira Betz e foi
durante o encontro o surgimento da idéia de convidá-la a ensinar em nosso país.
Não teríamos condições de arcar sozinhas com os custos de trazê-la então
entendemos que a única solução seria organizar um workshop.
Com o
estímulo e apoio das bailarinas do núcleo SP me vi as voltas dessa produção sem
a menor idéia dos rumos que o festival iria tomar ou as proporções que ele
ganharia ao longo dos anos. O primeiro aconteceu em Rio Claro, em formato
retreat, pois a cidade não oferece muitos hotéis e condições fáceis de
deslocamento. Eu tinha algumas poucas experiências com produção e não sabendo
as proporções desta, cuidei de toda a pré-produção praticamente sozinha
contando com o auxilio de nossa cenógrafa Skylar VJ. Para mim, foi realmente
uma loucura! Durante o evento todo, eu mal pude conversar com Mira e com
qualquer outra pessoa!
Findado o
Shaman's 2011, entendemos todas que tínhamos algo muito grande nas
mãos. Para o ano seguinte, todo o corpo de baile foi envolvido na
pré-produção, dividimos todas as tarefas e tudo ocorreu de maneira muito mais tranqüila.
Em 2012
realizamos o evento em Natal com a Samantha Emanuel, entre outros professores,
e foi um sucesso! 50 alunos em sala de aula, e platéia da Mostra e Show
absolutamente lotada!
Em 2013 já
estávamos "afiadas", adquirimos experiência e maturidade
profissional e nossa equipe estava absolutamente confortável com as demandas da
pré-produção e produção. Heather Stants, Tjarda van Stratem, Marisu Parada,
Rebeca Piñeiro e Guigo Alves foram os mestres queridos dessa edição.
Estávamos
prontas para o que viria pela frente!
BLOG: Em
2014, vocês concretizaram um sonho de vários bailarinos tribais ao
trazerem o grande ícone do tribal fusion: Rachel Brice. Como foi tal experiência em realizar um
evento de grande porte e responsabilidades? Alguma curiosidade sobre a vinda da
nossa grande musa e inspiração? Quais impressões que ela teve com relação ao
Brasil, tanto em relação a nossa cultura quanto o trabalho realizado pelos
grupos e solistas da cena tribal brasileira? Será que a teremos
novamente em nosso país? =D
Realizar o sonho de centenas de pessoas... Que
privilégio!
Paula Braz, Samantha Emanuel e Cibelle Souza |
Nós fomos
contatadas pela Rachel ainda em 2012. Samantha foi embora do Brasil maravilhada
com as brasileiras e com a qualidade de nossa produção. Sam foi nossa grande
madrinha. Falou sobre nós aos quatro ventos. Logo após o Shaman's elas se
encontraram na Europa e dois meses depois recebemos o email da Rachel. Foi um
choque. Uma semana inteira sem dormir. Ela queria vir ao Brasil em 2013, dali
três meses. Ficamos loucas! Negociamos a vinda dela para 2014, pois nós
tínhamos total consciência do que a vinda dela representaria para o cenário da
Dança Tribal no Brasil.
Nossa equipe
estava completamente pronta para recebê-la. Nós desenvolvemos uma maneira muito
eficiente de trabalharmos juntas e a distância! Mas tínhamos em mente nossa
responsabilidade e 2013 foi um ano de muita ansiedade para a Shaman.
Paula Braz, Rachel Brice e Cibelle Souza |
Curiosidades...
- temos muitas histórias para contar, mas penso que seriam melhores contadas
pessoalmente! Nossos estúdios estão abertos a visitas! Mas uma ok! - uma
delas: em contrato, Rachel nos avisou ter uma alimentação praticamente
vegetariana, muito equilibrada, livre de glúten entre outras restrições. Mas
como resistir a comida brasileira? O que a Rachel mais amou no país foi
certamente a comida! Ela comia pratadas! Era realmente divertido vê-la comer,
pois ela fazia com muito, muito gosto! – desculpe, Rachel querida, eu precisava
contar essa!
Rachel ficou
muito impressionada com a qualidade da dança do Brasil. Saía das aulas do
avançado dando pulinhos de alegria, excitadíssima, pensando no que ela teria
que mudar na aula do dia seguinte, contando o que ela teve que acrescentar no
programa de aula dela visto que os alunos aprendiam muito rápido! Os olhinhos
dela brilhavam findadas todas as aulas.
Quanto a
qualidade das apresentações... Puxa como tenho orgulho de ser brasileira! O Sol
é um grande produtor cultural e os melhores feedbacks, com certeza, foram os
dele. Não temos dúvida, o Brasil figura entre os melhores no estilo Tribal no
cenário mundial.
Se depender
de nossa vontade e a vontade da Rachel, sim, a teremos no Brasil novamente!
BLOG: Em 2014 , a Cia Shaman participou do evento
internacional Tribal Fest (Califórnia), principal evento de tribal mundial. Conte-nos como surgiu a oportunidade para dançar neste
evento e qual foi a experiência em levar sua dança para o berço da dança
tribal. Qual retorno e repercussão você teve pelo público norte-americano?
Quais aprendizados e/ou vivências você adquiriu dançando e estudando nos EUA?
Shaman Co. - Tribal Fest 14 |
Sonho
realizado. Subir no palco do Tribal Fest foi uma das coisas mais emocionantes
que já fiz na vida.
Ao
contatarmos a produção do evento, submetemos nossa inscrição ao show e fomos
aprovadas. Nossa grande surpresa foi o horário nobre em que nos colocaram. Só
entendemos isso ao perceber a reação das pessoas quando dizíamos qual o dia e
horário de nossa apresentação! Domingo, quase no encerramento, depois que os
workshops já tinham terminado o que significaria contar com todo o público do
evento.
Shaman Co. e Carolena Nericcio |
Estudamos
com a Zoe Jakes e com a grande dama Carolena Nericcio e cada minuto com elas
foi precioso. Além disso, assistir ao vivo grupos como o FCBD, o Unmata, o
Datura, Imajaghan, entre outros; e bailarinas como Carolena Nericcio, Zoe Jakes
e o House of Tarot, Collenna Shakti, entre outros grandes talentos foi um grande
aprendizado, um grande presente, uma grande honra.
Shaman Co. e Zoe Jakes |
Voltamos com a certeza de que temos que honrar nossas origens, e isso inclui a nossa própria origem, nossas danças, nossas tradições... não temos dúvidas de que o Tribal Brasileiro - como eles se referem ao nosso estilo lá - é algo que devemos continuar a fazer.
BLOG:Vocês fizeram algumas adaptações ao reapresentarem Carcará no Tribal Fest 14, como chegaram aos resultado coreográfico final? Alguma curiosidade sobre esse processo?
Assim como
no MEM, na Argentina, queríamos novamente reforçar nossa identidade e nosso
estilo individual. Sabíamos que a escolha da coreografia a ser levada
significaria a forma como o mundo tribal nos identificaria. Foi bastante
difícil visto que só três de nós tínhamos condições de ir. Tivemos muitas idéias
antes da conclusão final.
"Moiras"
é uma coreografia que amamos e que acontece em três, mas não queríamos frisar
essa nossa faceta, então utilizamos a movimentação da entrada e essa escolha
foi bastante natural. Todo o processo de seleção da trilha sonora, escolha da
coreografia e figurino foi realizado a distância por meio de reuniões via
skype.
Tínhamos
como desafio criar uma peça que nos representássemos primeiro enquanto
sacerdotisas shamanicas e fazer uma passagem coerente para o arquétipo do
pássaro (tótem da companhia visto que o Carcará é inspirado em nossa primeira
coreografia, também utilizando o pássaro como animal de poder). Cobrir o cabelo
na entrada, fazer as referências ao ATS e nossas origens por meio da música,
retirar os véus para a entrada do Catimbozada que é absolutamente ritualística
e unir tudo isso ao Carcará nos pareceu uma escolha bem interessante.
Quando
unimos a trilha sonora, absolutamente tudo fez sentido para nós.
BLOG:Neste
mesmo ano, você também viajou para Califórnia, nos Estados Unidos. Você acha
que estar no berço da dança tribal ajudou-a a entender melhor todo o processo
por trás da criação dessa dança? Compartilhe suas impressões sobre essa
maravilhosa jornada! =)
Essa
pergunta é absolutamente pertinente! SIM!!! Compreendo de maneira muito mais
ampla o que fundamenta o estilo.
Há muitos
anos sinto vontade de sentir o Tribal onde ele foi criado e desenvolvido.
Conhecer São Francisco é algo que toda tribalista deveria fazer. Ir até lá e
entender como tudo o que é dito é praticado reacendeu meu amor pelo estilo e
por seus conceitos.
O conceito
de coletivo é algo que pertence a todo cidadão daquela cidade. Esse conceito
reflete na forma como tratam uns aos outros e na forma como reagem aos
conflitos mais simples. Além disso, São Francisco é considerado o berço da
tolerância à diversidade. Para eles, sermos diferentes uns dos outros reflete
riqueza cultural e eles realmente parecem estimular que sejamos todos diversos!
O Tribal não poderia ter nascido em outra cidade... O berço da Contracultura,
do Movimento Hippie, do Feminismo enquanto movimento social... Foi uma
experiência maravilhosa.
Se visitarem São Francisco, não deixem
de conhecer o estúdio do FCBD. Tente não se derramar em lágrimas ao subir as
escadas desse templo.
BLOG: O quê você mais gosta no tribal
fusion?
Me agrada
demais a escolha musical, a plasticidade dos figurinos, o estímulo a
reinvenção. Mas gosto muito de como a mulher é estampada e o quanto este
empoderamento é refletido nos movimentos, na postura, nos figurinos, na
expressão corporal e facial.
BLOG: O quê você acha que falta à comunidade tribal?
Penso que a maioria das suas entrevistadas diria UNIÃO. Eu discordo!!!
Permeei o
mundo do teatro, da dança contemporânea, das artes plásticas, da moda, do
figurinismo e posso afirmar com propriedade que vejo no tribal algo que não
vejo nestes outros mundos que citei. Vejo muito mais união do que em qualquer
um destes. Até porque, como poderia ser diferente? As bases do estilo defendem
a dança em grupo num sistema de criação coletiva em que não há muito espaço
para falta de união! E lamentaria muito saber que existem professoras ensinando
qualquer coisa diferente disso aos seus alunos.
Quando falamos
da esfera que envolve profissionais e representantes do estilo no país posso
colocar que acontecem sim divergências de opiniões, de posturas e de condutas,
afinal somos indivíduos diversos! Mas ainda vejo isso acontecendo com respeito.
Não vejo movimentações que reflitam sabotagens. Quase todas as grandes
produções de Tribal do país alinham suas datas de eventos ou pelo menos se
esforçam para não chocar datas. Estamos sempre conversando umas com as outras
sobre quem pretendemos trazer e quando. Existem exceções? Sim, mas estas são
bem menores quando comparadas com a maioria.
BLOG: Como você descreveria seu estilo?
Tribal Fusion! Quando entendido o conceito amplo do estilo fica difícil dar outros nomes a minha dança que não este!
Tribal Fusion! Quando entendido o conceito amplo do estilo fica difícil dar outros nomes a minha dança que não este!
Transito por
muitos co-estilos e transitarei por muitos outros enquanto dançar, então
prefiro me abster de qualquer tipo de rótulo que me limite!
BLOG: Como você se expressa na dança?
É como melhor me comunico... É minha melhor e pior face. Me desnudo dançando. Se quiser me conhecer na intimidade, veja meus solos, eu estou em todos eles muito mais do que me apresento ao mundo no dia-a-dia da vida real.
BLOG: Quais seus projetos para 2015? E
mais futuramente?
Em 2015 estamos focadas em colocar estrear nosso novo espetáculo, desta vez para maiores públicos e colocá-lo em turnê. Além disso, eu e Cibelle estamos voltando para a faculdade. Estudar é preciso sempre, e mais.
Em 2015 estamos focadas em colocar estrear nosso novo espetáculo, desta vez para maiores públicos e colocá-lo em turnê. Além disso, eu e Cibelle estamos voltando para a faculdade. Estudar é preciso sempre, e mais.
Em 2016
temos nova edição do Shaman's Fest e se nosso planos se concretizarem, nossas
convidadas irão novamente abalar as estruturas da História do Tribal no Brasil
!!!
BLOG: Improvisar ou coreografar?E por quê?
Pessoalmente, coreografar. Porque é quando
dou o melhor de mim. É quando tenho condições de explorar a música em todos os
seus níveis incluindo os menos óbvios. Não gosto de sair do palco com a
sensação de que poderia ter sido muito melhor.
BLOG: Você trabalha somente com
dança?
Sim, com a dança e tudo que cerne o cenário da dança. Não sou exclusivamente bailarina (sonho!), sou coreógrafa, diretora de uma companhia, diretora de produção de um festival internacional de dança, administradora de um estúdio de danças - o que inclui ser também recepcionista, telefonista, etc!
Sim, com a dança e tudo que cerne o cenário da dança. Não sou exclusivamente bailarina (sonho!), sou coreógrafa, diretora de uma companhia, diretora de produção de um festival internacional de dança, administradora de um estúdio de danças - o que inclui ser também recepcionista, telefonista, etc!
BLOG: Deixe um recado para os leitores do blog.
Em respeito as minhas mestras quero fazer 3 citações:
"Um grupo de mulheres muito
poderosas, fazendo algo que é muito poderoso, juntas."
(definição do que é Tribal Fusion por
Sharon Kihara)
"Respeite suas origens, respeite
suas mestras, respeite aquelas que vieram antes de você, e dessa forma, você
receberá respeito daqueles a quem ensinar".
(Rachel Brice)
"Muitos artistas continuam a criar
e expandir este estilo, empurrando as fronteiras da dança do ventre
com sua teatralidade, escolha musical, figurino e seleção local. O
Tribal Fusion continua a estar em um estado de evolução.”
(Heather Stants)Contato: