por Kilma Farias
“Trago comigo uma bagagem de lembranças
históricas, que posso alimentar por meio de conversas ou de leituras – mas esta
é uma memória tomada de empréstimo, que não é a minha.” (HALBWACHS, 2003, p.
72)
Partindo
do pensamento do historiador Halbwachs, faço um paralelo com a bagagem de
memórias que adquirimos no Tribal ao assistirmos vídeos de bailarinas da Índia,
Estados Unidos, Japão, Egito, etc., ou ao lermos sobre danças étnicas diversas
do mundo, apreciarmos fotografias, etc. Trata-se de uma bagagem de memória
tomada de empréstimo quando não estivemos nesses lugares vivenciando dada
realidade, mas que acessamos nas nossas composições em dança.
Juliana Garcia - João Pessoa-PB |
“[...]
uma memória [...] que não é a minha.” E que faz com que nosso produto final em
dança chegue ao palco como se também não fosse nosso. Porque falta a nossa
memória vivida. Somos feitos de tempo e espaço, e das lembranças que, de modo
consciente ou inconsciente, essa relação gera em cada um de nós.
O
caminho que percorremos de casa ao trabalho, o supermercado que frequentamos, a
praia, o cinema, a sala de aula, nossa casa, nossa rua, as viagens que fizemos,
as pessoas com quem cruzamos diariamente ou uma única vez na vida, tudo isso
faz parte da nossa memória vivida – colabora para o que cada um de nós é hoje.
E nos modifica. É na relação com os espaços que as experiências acontecem e as
múltiplas identidades dão lugar à coletividade, a uma visão de mundo, um ethos.
Nesse
sentido, um dos pontos que tenho abordado no Curso de Formação em Tribal Brasil
é a relação da bailarina com sua cidade, com o conceito de lugar e suas
implicações afetivas trazidas pela memória. Essa ação tem o intuito de trazer à
tona uma memória corporificada, que confira verdade à dança – porque vem plena
de vivências do dia-a-dia.
Dayeah Khalil - Guarujá - SP |
Em uma das atividades desenvolvidas, peço para que a aluna aproveite um momento de
caminhada rotineira para observar o mundo que a rodeia, o “lá fora”: os sons,
aromas, formas, cores. Apenas observar o ambiente que anda influenciando-a,
muitas vezes de modo inconsciente. E partir daí essa vivência é registrada no
“diário de bordo” do curso – uma espécie de diário onde a bailarina registra de
modo artístico, livre ou sistematizado, através de poesia, desenho, pintura,
colagem, texto, fotografias, suas experiências ao longo do curso, suas relações
com o que estão descobrindo, etc.
E
a partir disso compõe-se uma pequena partitura em dança que passa a ser
registrada em vídeo, de modo livre – seja videodança, videoarte, documental,
videoclipe, etc. E, nesse fazer, podemos apreciar as diferences nuances e
impressões que a cidade nos provoca e o quanto ela modifica nossa dança. Não
precisamos deixar de fora tudo o que nos influencia no nosso cotidiano para
dançar Tribal. Às vezes ficamos tão maravilhados com a alteridade, com o que
nos é exótico – o que vem da Índia, Egito, etc. – que calamos nossas beleza,
riquezas e singularidades: nossa brasilidade.
Selecionei
algumas atividades das alunas do Curso de Formação para compartilhar nesse post e faço um convite a você também. Da
próxima vez que sair na rua, observe os relevos, construções, pessoas, aromas,
formas, relações, afetividades. Traduza em palavras, imagem, desenhos ou
pintura a sua percepção, como esse mundo vivido por você te afeta. E, num
segundo momento, traduza para o corpo, para o movimento, buscando as relações
com o seu fazer Tribal. Se puder viver essa experiência em um lugar da sua
cidade que signifique para você, melhor ainda. E se resolver registrar em
vídeo, compartilha comigo. Vou adorar conhecer um pouco mais sobre o Brasil que
você vive e sua relação com a cidade.
Karine Neves – Rio Grande do Sul:
Juliana Garcia – Paraíba: