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[Dançando Narrativas] Aquelas que Escolhem os Mortos: Trabalhando a Figura das Valquírias na Dança

 por Keila Fernandes

 

Em 2017, fui convidada pela Aerith Asgard a ministrar uma palestra para o nosso grupo sobre  as Valquírias. Nesse ano apresentaríamos uma coreografia sobre elas para o espetáculo Death, do Underworld Fusion Fest. 

Para isso, desenvolvi uma boa pesquisa sobre essas entidades, e montei uma apresentação para explicar para o grupo quais aspectos tínhamos escolhido trabalhar, e porquê. 

Hoje, quero compartilhar essa pesquisa com vocês, para mostrar um pouco do que venho falando nos primeiros textos da coluna: como desenvolver uma personagem mitológica na dança.

 

VALQUÍRIAS: REPRESENTAÇÕES FEMININAS NA MITOLOGIA NÓRDICA

 

Introdução

 

As valquírias são entidades femininas, filhas e servas de Odin. Sua imagem mais recorrente é a de belas mulheres que cavalgam pelo céu, recolhem os mortos nos campos de batalha e os levam para Valhalla.

A palavra valquíria deriva do nórdico antigo valkyrja (plural valkyrjur), que é composta por duas palavras; o substantivo valr (que se refere aos mortos em batalha) e o verbo kjósa (que significa "escolher"). Portanto o próprio nome já faz referência ao principal papel que essas entidades possuem.

No século XIX, a Era Viking passa a ter grande importância na construção de uma identidade escandinava. A representação dos guerreiros e das mulheres é construída com cuidado para esse fim. As valquírias estão inclusas nesse processo. Seguindo o padrão de beleza vigente, elas são representadas como mulheres que, apesar de portar armas, tem traços e figura delicada, usam vestidos finos e se destacam pela beleza.

 

Valquírias da ópera “O Anel dos Nibelungos”, de Richard Wagner.

Atualmente são muito recorrentes em jogos e HQs, nos quais são representadas, geralmente, como guerreiras com poderes de regeneração, e como aquelas que levam os mortos para Valhalla.

 

Lenneth, personagem do jogo de 1999 para PlayStation: Valkyrie Profile: Lenneth.

 

Parte 1: A Diversas Faces das Valquírias

 

Guerreiras que escolhem os mortos, profetisas, deusas do destinos, esposas e amantes. As valquírias possuem facetas diversas, e para escolher os aspectos que seriam desenvolvidos na coreografia, tivemos de buscar conhecê-los nas fontes históricas.

A iconografia (estelas, esculturas e pingentes), apresenta duas facetas das valquírias: a mulher guerreira e a atendente no Valhalla.

A imagem da guerreira armada com lança e escudo e portando cota e elmo só é encontrada nos pingentes da Era Viking, cujas amostras datam no século IX.

Pingentes representando valquírias com equipamento bélico. Dinamarca, século VII - VIII


Já as peças do final da Era Viking (século 11 d.C) e do início do período de cristianização, apresentam figuras mais domésticas usando vestidos e portando apenas uma lança ou um corno de hidromel, evidenciando seu papel de atendente no Valhalla.

 

Pingente representando uma Valquíria levando hidromel. Suécia, século X.

Para Hilda Davidson, a principal característica das valquírias é o fato de serem mulheres sobrenaturais capazes de escolher os rumos de uma batalha.

Para a mesma autora, existem quatro principais facetas das valquírias de acordo com as fontes. Estes são: atendentes (servindo no Valhalla), amantes/esposas dos guerreiros, guerreiras e profetisas.

Guerreiro portando escudo com espiral, ao lado valquíria, triskelion e valknut. Estela de Stenkyrka Lillbjärs III, Gotland, Suécia, séc. IX. Fonte: Allan, 2002: 65.


O simbolismo do Cisne

Na poesia édica[1], as valquírias aparecem como esposas espirituais dos heróis e como aquelas que escolhem os mortos. Em alguns poemas, as valquírias são associadas com as donzelas cisnes e profetisas, assumindo um papel parecido com as nornas[2], sendo entidades ligadas ao destino.

O cisne aparece nas pedras e estelas como o animal responsável por guiar os mortos até seu destino.

Estela de Alskog e pedra Rúnica de Sanda - Suécia - 1020/1050. Em destaque: imagem do cisne que guia o morto para seu destino.


Tecelãs do Destino

 

Segundo o mitólogo Rudolf Simek, a tecelagem e a fiação, como símbolo de determinação do futuro, estão ligadas apenas às valquírias, visto que não há nenhuma fonte escandinava que fale de algo parecido sobre as nornas, sendo até mesmo o número 3 inspirado pelas parcas gregas.

 

No poema Darradarljord, as valquírias são representadas como guerreiras que usam suas lanças para tecer uma tapeçaria com entranhas, cabeças e membros de pessoas mortas.

 

Deusas da Morte

Segundo Régis Boyer, o aspecto guerreiro das valquírias foi herdado das tradições germânicas arcaicas nas quais as mulheres tinham papel de sacerdotisas em ritos de morte e batalha.

As tradições celtas de deusas da morte e da guerra, como a deusa Morrigan, também influenciaram a figura guerreira das valquírias.

Segundo Charles Donahue, celtas e germanos estiveram em contato durante o período romano, e dividiam uma crença em ferozes espíritos ligados à guerra, o que pode ter tido influência na literatura viking a respeito de entidades como as valquírias.

Os poemas escáldicos[3] transformaram as valquírias em entidades guerreiras maravilhosas aos olhos dos humanos. Porém com um aspecto menos violento e mais feminino.

Também há, em antigos encantamentos nórdicos germânicos, a presença de ferozes espíritos femininos ligados à morte, ao destino e à magia, o que nos leva a crer que essas entidades femininas sempre estiveram presentes na espiritualidade desses povos.

Segundo Johnni Langer, os pingentes de valquírias encontrados em túmulos de mulheres indicam que as mulheres tinham uma forte presença nos cultos odínicos


Pingentes representando diferentes aspectos das valquírias.

Parte 2: Xamanismo e Corvos

 

O corvo está sempre presente nas narrativas nórdicas como um animal ligado ao deus Odin.

Em alguns poemas eles aparecem rondando o campo de batalha, e são designados com o adjetivo welceasig (em inglês arcaico) que significa escolhendo os aniquilados. No poema nórdico "Hrafnsmál"  há um diálogo entre um corvo e uma valquíria.

A ligação com as aves está presente desde as formas mais primitivas de religiosidade escandinava. Petroglifos da idade do Bronze (1000 - 400 a.C.) trazem imagem de aves e sacerdotes vestidos como aves, evidenciando elementos xamânicos na religiosidade nórdica.

Além do corvo, o cisne também é um animal que tem ligação com as valquírias, representando a função de guia e sendo o animal que entrega os mortos no Valhalla.

 

 Parte3: De Poderosas Entidades a Figuras Domesticadas

Assim, o que é possível concluir é que as valquírias possuem facetas diversas que foram se fortalecendo ou se enfraquecendo com o tempo. É possível que sua origem esteja nas tradições primitivas pré-viking, onde encontramos figuras femininas ligadas à morte e à guerra, presentes em ritos sacrificiais e proféticos, tendo o poder sobre o conhecimento do futuro e da morte, além das práticas xamânicas.

Tais representações começam a se modificar com as trocas culturais ocorridas com os romanos e, posteriormente, com os cristãos, tornando as valquírias figuras mais coerentes com as tradições patriarcais, nas quais são representadas como belas donzelas, atendentes e esposas.

 

Baixo relevo representando uma valquíria com cornos de hidromel. Gotlândia, séculos VIII - IX

Hoje, o aspecto mais conhecido da valquíria seja, talvez, a sua principal faceta: aquelas que escolhem os mortos. O interesse da cultura pop na história germânica e escandinava resgatou a imagem das valquírias guerreiras e que estão sempre presentes nos campos de batalha para colher seus escolhidos. 

Por isso o arquétipo que decidimos evocar foi o de uma valquíria com as características bélicas presente nos poemas escandinavos como aquelas que escolhem os mortos. E também tentamos trazer o aspecto primitivo xamânico da profecia e dos ritos de morte e guerra. 

Grupo Asgard Tribal Co.

Com a participação do Clã Skjaldborg, grupo de combate viking, desenvolvemos uma narrativa em três atos, na qual as valquírias, dotadas do dom da profecia, dançam o destino dos guerreiros, e aparecem, assim como os corvos, rondando o campo de batalha, em um ritual de guerra e morte, que culmina com a escolha daqueles que serão levado para o Valhalla.

 

Release da coreografia:

As valquírias são poderosas entidades femininas presentes na mitologia nórdica. Filhas de Odin, estão ligadas à guerra, ao destino e à morte, pois são elas que tem na ponta de suas lanças a sina dos guerreiros, sendo as responsáveis por escolher os mortos que entrarão em Valhalla. Sua origem pode ser encontrada nos primitivos cultos escandinavos, como figuras femininas presentes em ritos sacrificiais e proféticos, que possuem o poder sobre o conhecimento do futuro e da morte, sobrevoando o campo de batalha, prontas para tomar a vida de seus escolhidos.

 

Você pode conferir a apresentação aqui: 

| Asgard Tribal |


Referências bibliográficas:

 BOYER, Régis. Mulheres viris. In: BRUNEL, Pierre (org). Dicionário de mitos literários. RJ: José Olympio, 1997b, pp. 744-746.

 DAVIDSON, Hilda Ellis. The lost beliefs of Northern Europe. London: Routledge, 2001.

 ________. Roles of the northern goddess. London: Routledge, 1998.

 ________. Myths and symbols in pagan Europe: early Scandinavian and celtic religions. Syracuse: Syracuse University Press, 1988.

 ________. Escandinávia. Lisboa: Editorial Verbo, 1987.

LANGER, Johnni. Símbolos religiosos dos vikings: guia iconográfico. História, imagem e narrativas 11, 2010b, pp. 1-28. Disponível em: Acesso em 05/01/2012.

LANGER, Johnni, NEIVA, Weber. Valquírias versus gigantas: modelos marciais femininos na mitologia escandinava. Revista Brasileira de História das Religiões. ANPUH, Ano V, n. 13, Maio 2012.

OLIVEIRA, Ricardo Wagner Menezes de. Entre nornas e valquírias: o simbolismo do cisne na religiosidade nórdica pré-cristã. II Simpósio internacional da ABHR. História, gênero e religião: violências e direitos humanos. SC, 2016.

SIMEK, Rudolf. Dictionary of Northern Mythology. London: D.S. Brewer, 2007.

 


[1] Coletâneas do século XIII, encontradas na Islândia, que compilam histórias e mitos dos deuses e heróis nórdicos.

[2] Deusas da mitologia nórdica, responsáveis por controlar o destino de homens e deuses. São representadas por três mulheres: Urd, a guardiã do passado, Verdani, a guardiã do presente, e Skuld, a guardiã do futuro.

[3] Tradição oral presente na Noruega e Islândia entre o século 10 e 12 d.C.


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Dançando Narrativas


Keila Fernandes (Curitiba-PR) é escritora, professora de história e  historiadora, especialista na área de Religiões e Religiosidades e História Antiga e Medieval. É aluna da bailarina e professora Aerith Asgard e co-diretora do Asgard Tribal Co. Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 

[Dançando Narrativas] Qual é o limite da liberdade artística?

 por Keila Fernandes

Quando criamos coreografias usando personagens ou conceitos já existentes, temos certa liberdade de moldá-los e encaixá-los melhor na nossa linguagem e interpretação.

Vou chamar isso de liberdade artística, ok?

Devo frisar que estou usando o termo liberdade artística para a dança, como o termo licença poética é usado para linguagem (falada, escrita, cantada): no sentido de permitir modificações e “erros” para inovar, desconstruir ou criticar, desde que o contexto permita (lembrando que até mesmo para desconstruir ou subverter algo, é necessário conhecê-lo, e conhecê-lo bem).

No entanto, mesmo cientes da liberdade que a arte nos dá, é necessário termos responsabilidade com nossas escolhas e como isso aparecerá em nossa dança.

Eu costumo dizer que o limite da liberdade artística ao desenvolver um personagem é o bom senso.

Isso pode parecer genérico, e é. Pois cada pessoa vai ter uma interpretação e estabelecer limites aos quais não estará disposta a ultrapassar.

Por isso, como citei no texto anterior, é necessário pesquisar bastante antes de criar uma coreografia baseada em uma figura já existente, seja ela mitológica, histórica ou até mesmo da cultura pop.

Existem características chaves, pelas quais tais figuras são facilmente reconhecidas, características que formam sua personalidade. E estas devem ser mantidas.

E há o espaço para criar, se expressar, subverter e inovar.

Você pode dar uma roupagem moderna a Anúbis, por exemplo. Usando figurinos e movimentos urbanos. Mas é importante que ainda assim, ele seja reconhecível. Ele é um deus ligado à morte, à mumificação e ao julgamento dos mortos. E isso deve ser mantido, seja nos detalhes do figurino, nos movimentos e na expressão. Mas você não precisa usar uma cabeça de chacal, ou trajes “egípcios”. Não precisa ser caricato ou estereotipado.

 

O deus Anúbis, na série Deuses Americanos. Uma interpretação atual que manteve as principais características dele: a ligação do deus com a morte, pois ele trabalha em uma funerária, e ainda é seu papel de pesar o coração dos mortos e determinar seu destino.

 É possível reinterpretar mitos e criaturas, fazendo-os conversar com o presente, desde que eles não sejam descaracterizados.

E como fazer isso sem deixar caricato?

Eu vou dar algumas dicas, baseadas em experiências que tive na criação e desenvolvimento de personagens para as coreografias do grupo do qual faço parte, o Asgard Tribal Co., dirigido pela minha professora Aerith Asgard, e codirigido pela Rossana Mirabal e por mim. E também vendo apresentações de outros grupos e bailarinas e bailarinos que desenvolveram um trabalho primoroso.

Nós gostamos muito de trabalhar com personagens, e para encaixá-los nas nossas propostas de coreografia, pesquisamos a fundo, buscando as principais características que serviram ao nosso propósito sem descaracterizá-los.

Vamos lá!

Depois de escolher a personagem e fazer uma boa pesquisa sobre ele (eu vou bater MUITO nessa tecla da pesquisa):

  • primeira coisa a se fazer é se perguntar: por que eu quero fazer essa figura? O que eu quero dançar sobre ela?
  • escolha uma ou duas características principais com as quais você gostaria de trabalhar na dança. Pode até ser mais, mas quanto mais aspectos você tentar inserir, mais chance tem de ficar bagunçado.
  • busque referências à essa personagem em diversos lugares. Além dos livros de mitologia, você pode pesquisar outras fontes históricas e arqueológicas, como imagens, canções e poesias dedicadas à essa figura. Músicas que falam sobre ela, filmes, produções literárias, quadrinhos e o que mais você encontrar.
  • use posturas, movimentos e expressões que tenham a ver com a personalidade da figura a ser trabalhada.
  • escolha símbolos, cores, acessórios coerentes com as características que você quer evidenciar. Mescle isso com os elementos dos quais você gosta e se identifica.
  • cuidado na escolha da música. Independente do estilo, ela precisa conversar com a personagem que você irá interpretar.
  • Não subestime seu público. Não seja literal, isso deixará sua apresentação caricata. Use sua imaginação e siga seus instintos.

 

Lembrando que essas são apenas dicas e sugestões. De forma alguma quero criar um manual de regras.

Abaixo coloquei algumas coreografias nas quais as interpretações de personagens  que considero muito bem executadas:

A maravilhosa Ebony interpretando a queridíssima princesa Shuri, de Wakanda. Figurino no ponto, a música e os movimentos combinando ancestralidade e modernidade, trouxeram a personalidade carismática de Shuri e representaram Wakanda.

 

 

Irina Akulenko, com sua coreografia “The Call of The Amazon Warrior”. O figurino simples foi muito bem composto, pois os tecidos, o corte e as cores evocam a ideia da guerreira amazona. Além disso a expressão corporal e facial, os movimentos e as posturas trazem todo o porte e a força da guerreira representada.

Edenia e sua interpretação matadora de Pennywise, do clássico do terror, IT. O figurino e a maquiagem muito bem construídos, lembrando o personagem, mas sem se tornar uma caricatura. A mudança na atmosfera da música e dos movimentos trazem a quebra de expectativa comum às obras de horror. A bailarina também referenciou movimentos do personagem no filme sem abusar desse elemento. 

 

E para finalizar, o grupo Shaman Tribal Co. com sua icônica coreografia “Carcará”. A harmonia entre movimentos e música é incrível. Sabemos que se trata de um pássaro, e um pássaro brasileiro. O grupo usa movimentos que lembram o bater de asa, o andar e o movimento da cabeça do carcará aliados aos movimentos do Estilo Tribal Brasileiro. Tudo isso junto ao figurino e à maquiagem resultou em uma apresentação impactante e celebrada. 

Vimos então personagens mitológicos, da cultura pop e até mesmo animais, cujas características transbordam na dança, na expressão e na escolha das músicas.

É nítido o trabalho de pesquisa e o cuidado com as referências usadas pelas bailarinas.

A dança nos dá autonomia para fazermos o que quisermos. Mas isso não significa que temos que fazer de qualquer jeito.


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Dançando Narrativas


Keila Fernandes (Curitiba-PR) é escritora, professora de história e  historiadora, especialista na área de Religiões e Religiosidades e História Antiga e Medieval. É aluna da bailarina e professora Aerith Asgard e co-diretora do Asgard Tribal Co. Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 

[Dançando Narrativas] Desenvolvimento de personagens para a dança: Mitologia e pesquisa

 por Keila Fernandes

Gina Lollobrigida como a Rainha de Sabá (1959).

A interpretação de personagens, especialmente as mitológicas, em coreografias é muito comum entre quem dança Tribal Fusion. No entanto, ainda vemos muitas representações equivocadas, rasas e caricatas.

Tais representações acabam ocorrendo por falta de um estudo mais aprofundado sobre o objeto a ser trabalhado, ou até mesmo como resultado do olhar ocidental sobre a cultura e a história de outras civilizações.

Por isso é importante conhecer os bem os aspectos com os quais queremos trabalhar em nossa dança.

E o que é importante saber antes de dançar um personagem?

A primeira coisa que temos de ter em mente é: Mitologia não é fantasia, nem sinônimo de mentira.

Mito é uma palavra grega que significa narrar, contar uma história para alguém que reconhece no contador autoridade sobre o assunto.

Essas histórias são narrativas sagradas usadas para explicar a realidade: a natureza, as instituições, costumes sociais, origem da vida e outras características do mundo humano.

E a mitologia é o conjunto e o estudo desses mitos. 

Os mitos foram e são partes importantes na formação de muitas civilizações, pois eles carregam muito mais que relatos fantásticos, eles carregam a história, a cultura e a identidade de um povo. 

O que chamamos de mito, constituiu (e constitui) a realidade para diversas culturas. Permeando seu cotidiano, e integrando outras esferas da vida.

Para os povos originários brasileiros e os praticantes de religiões de matriz africana, por exemplo, o mito integra suas realidades, não apenas na esfera espiritual, mas também como parte de sua identidade e de sua história.

 

Monni Ferreira como Exu. Coreografia: "O Guardião", apresentada no Underworld Fusion Fest (2018)

Outra coisa importante é ter sempre em mente que deuses e outros personagens mitológicos são representações de forças da natureza e características humanas, por isso são diversos e não devemos generalizá-los ou tentar encaixá-los nas nossas expectativas. É necessário conhecer tais aspectos e escolher quais serão representados na dança a fim de evitar caracterizações rasas e caricatas, pois isso esvazia e desvaloriza a dança.

As características escolhidas não devem ficar apenas na parte visual da apresentação. E quando usadas no figurino e maquiagem, devemos ter cuidado e compreender cada símbolo, e não utilizá-los de maneira aleatória.

Para uma coreografia não se tornar caricata é importante trazer o que se quer mostrar também para os movimentos, afinal, estamos falando de dança. A personagem deve se comunicar por meio da movimentação, da expressividade. E para isso é preciso também escolher uma música coerente com os aspectos da figura a ser interpretada. Então, atenção à letra e aos elementos presentes na música.

Tudo isso é importante para que sua dança seja capaz de contar uma história e interagir com o público. E para isso acontecer,  é necessário pesquisar de verdade. E pesquisar não é só procurar uma palavra chave no Google, ou ver vídeos no YouTube. Estamos falando de uma pesquisa mesmo, na qual se tem contato com materiais diversos, além do audiovisual. É buscar referências em artigos de especialistas no assunto, perguntar para pessoas que conhecem e entendem daquilo, ver documentários e filmes, ler livros, ouvir músicas. Enfim, buscar todo material necessário para te dar bases seguras de onde você pode começar a criar.

 

Ethel Anima interpretando um gárgula. International Tribal Festival "Neverending Story 2.0 - 2018

Trabalhar com mitologia pode não parecer, mas é complexo. E não deve ser diferente, pois estamos falando de outras culturas, outras maneiras de se ver o mundo. Isso nunca deve ser tratado de maneira leviana.

Sendo assim, o respeito, o bom senso e a pesquisa devem  ser as principais ferramentas para a construção de uma coreografia coerente e ética.


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Dançando Narrativas


Keila Fernandes (Curitiba-PR) é escritora, professora de história e  historiadora, especialista na área de Religiões e Religiosidades e História Antiga e Medieval. É aluna da bailarina e professora Aerith Asgard e co-diretora do Asgard Tribal Co. Clique aqui para ler mais post dessa coluna! >> 
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Dançando Narrativas por Keila Fernandes


Dançando Narrativas

 Keila Fernandes, Curitiba-PR, Brasil

Sobre a coluna:

Interpretar um personagem na dança é muito mais que caracterizá-lo por meio de figurino, maquiagem e acessórios.

É necessário um conhecimento aprofundado sobre as características do mesmo, de modo a nos conectarmos melhor com os conceitos que queremos expressar e assim construir nossa apresentação.

Deusas, deuses, criaturas mitológicas, personagens históricas e até mesmo animais, são escolhas muito comuns feitas pelas bailarinas e bailarinos do Tribal Fusion e outras danças. Contudo, por muitas vezes, nos deparamos com representações equivocadas, baseadas apenas em estereótipos e conhecimento superficial do personagem em questão.

Na coluna Dançando Narrativas discutiremos sobre importância da pesquisa para o desenvolvimento de um personagem, com foco na mitologia.

Também trarei algumas análises de personagens mitológicos e as possibilidades de usá-los na dança.

Sobre Keila:

Keila é escritora, professora de história e  historiadora, especialista na área de Religiões e Religiosidades e História Antiga e Medieval. É aluna da bailarina e professora Aerith Asgard e co-diretora do Asgard Tribal Co.









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